Política
A agropecuária na eleição
Sem Campos e com Marina, grande parte do setor agropecuarista se dirá dilmista desde criancinha


As folhas e telas cotidianas nos fizeram saber que os três principais candidatos à Presidência da República usaram seus meios de mobilidade, o que inclui velhas amizades e ombros fortes, para chegarem aos corredores do Agronegócio Político, a ‘sabatina’ da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil).
Federados, confederados e associados os receberam com pauta pronta. Temas sérios se transformarem, mais tarde, em platitudes e perenes chororôs.
Despida da roupagem linguística dessas ocasiões, posso resumir: sugere-se o nirvana. Confiem no meu resumo.
Garantidos por investimentos em infraestrutura, logística, inovação tecnológica e segurança jurídica para a iniciativa privada, os agropecuaristas se manterão competitivos e rentáveis, porém, sem comprometer o meio ambiente, a inclusão social, num processo comandado por um ministério da Agricultura forte, desburocratizado e interlocutor decisivo nas diversas etapas da economia.
Lembremos, como conta a lenda, o genial ponta-direita Garrincha (1933-1983) acrescentaria às orientações táticas do simpático treinador Vicente Feola (1909-1975): “agora só falta combinar com os russos”.
Vista assim do alto, a agropecuária sabe o que faz nessas horas. Ao contrário de empreiteiras, bancos, conglomerados industriais, cadeias prestadoras de serviços, amebas contumazes nos intestinos do Planalto, o setor finge que ouve, dá uma ajudazinha nas campanhas de todos, mas as promessas entram por um ouvido e saem pelo outro.
Aproximando-se a lupa, percebe-se que a única coisa que pediriam é a não intromissão do governo. Inclusive, para pedir-lhes dinheiro.
Seus fantasmas são de cepa intervencionista. Leis trabalhistas genéricas levadas ao campo como trabalho escravo, demarcação de terras indígenas e quilombolas, exigências ambientais severas e de alto custo.
Afrouxar a legislação nesses itens e aumentar a liberação de recursos do Tesouro Nacional, isto sim, faria um candidato ser carregado nos ombros ovacionado por berrantes.
Mas o que se ouvia dos líderes presentes nessas ‘sabatinas’?
“Eduardo parece ter ideias novas, pode ser um bom gestor, mas está com Marina Silva, o que nos traz certo incômodo”.
“A grande maioria está com Aécio Neves. Ele veio acompanhado dos ex-ministros Roberto Rodrigues (governo Lula) e Alysson Paulinelli (governo Geisel). É quem parece mais conectado com os interesses do agronegócio”.
Dilma Rousseff, sabedora das críticas que o setor tem a seu governo, na esteira das maldades que praticou contra o setor sucroenergético, “preferiu centrar-se nos recursos de financiamento que tem despejado no setor e no trabalho para criar uma classe média rural”.
Nada que emocionasse mais do que o fato de ser apoiada pela senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), presidente licenciada da CNA.
Bem, foi isso o que li e acredito os leitores também. Mas e o que ouvi?
Quase unanimidade pensada esperta: forte apoio a Aécio Neves, eventual segundo turno contra Dilma Rousseff, os votos de Eduardo Campos transferidos ao mineiro.
Nesta semana, porém, uma fatalidade fez tudo se transformar.
Se, por um lado, o Brasil perdeu uma das poucas lideranças políticas com qualidade para no futuro comandar um projeto robusto de desenvolvimento, por outro lado, trará para a disputa Marina Silva, com alta possibilidade de ir para o segundo turno, no lugar de Aécio Neves.
Seu ticket vem garantido pela votação de 2010, o desejo de mudanças entre a população mais jovem, suas bandeiras ambientais e sociais de extração da época em que o PT era o Partido dos Trabalhadores, o voto evangélico, um histórico de vida similar ao de Lula, e a emoção que carregará como parceira de Eduardo Campos.
Penso que diante disso, e da quase certeza de Kátia Abreu vir a ser ministra da Agricultura num eventual governo de Dilma Rousseff, grande parte do setor agropecuarista se dirá dilmista desde criancinha.
Este escrevinhador, que se lembra do desenrolar histórico entre governos e atividade agropecuária, sugere pouco a quem vier: correção anual dos planos de safra, forte apoio à Embrapa, e grana e tecnologia para a agricultura familiar.
Infraestrutura não é obra específica para o setor e depende da macroeconomia. Subsidiar o setor primário rural nas quedas de preços dos produtos agropecuários ninguém terá coragem de fazer.
Fiquemos, então, no feijão com arroz que tá bom demais.
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