Henry Bugalho

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Henry Bugalho é curitibano, formado em Filosofia pela UFPR e especialista em Literatura e História. Com um estilo de vida nômade, já morou em Nova York, Buenos Aires, Perúgia, Madri, Lisboa, Manchester e Alicante. Por dois anos, viajou com sua família e cachorrinha pela Europa, morando cada mês numa cidade diferente. Autor de romances, contos, novelas, guias de viagem e um livro de fotografia. Foi editor da Revista SAMIZDAT, que, ao longo de seus 10 anos, revelou grandes talentos literários brasileiros. Desde 2015 apresenta um canal no Youtube, no qual fala de Filosofia, Literatura, Política e assuntos contemporâneos.

Opinião

Vem aí a segunda onda

Estamos mais calejados, já sabemos o que esperar, mas também já estamos todos exauridos e receosos

Fonte: Andréa Rêgo Barros/PCR
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Algumas ideias parecem ser péssimas logo assim que são anunciadas.

A Espanha foi um dos países mais afetados pela pandemia de coronavírus na Europa continental, logo atrás da Itália e da França, e, após meses de rigorosa quarentena, vimos como lentamente tudo parecia voltar ao normal, ou, como batizaram aqui, a tal “nova normalidade”.

Isto se deu em fases de desescalada. Durante o auge da quarentena, em meados de março, praticamente todos os cidadãos permaneceram confinados em suas casas, com exceção de trabalhadores em setores essenciais.

Neste período, o país se tornou um verdadeiro cenário de filme pós-apocalíptico. Ruas totalmente vazias, todo o comércio fechado e a angustiante sensação de não sabermos o que viria depois.

Nas poucas vezes que saí de casa nesta fase, para ir ao mercado, à farmácia ou ao banco, podia-se respirar o medo e a tensão. As pessoas, quando se cruzavam, mantinham uma distância muito maior do que os dois metros recomendados. Era como se todo ser humano houvesse se tornado uma arma biológica. Todo mundo era um transmissor em potencial.

As divisas entre cidades foram fechadas e a polícia verificava cada um que ousava pegar a estrada.

Em junho, o governo decretou o relaxamento do estado de alarme e, em julho, reabriu as fronteiras para o turismo.

A Espanha é um dos países mais visitados do mundo e o turismo representa em torno de 12% do PIB. Em julho e agosto, meses de férias escolares no verão do hemisfério norte, os europeus arrumam suas malas e, em massa, vão viajar. E a Espanha é um destes destinos favoritos, principalmente para os britânicos, que se deslumbram com o sempre ensolarado sul da Península Ibérica.

A simples ideia de reabertura das fronteiras para visitantes de outras nações que também haviam sido impactadas enormemente pela pandemia já era por si só bastante assustadora — irresponsável até.

O equilíbrio entre a preservação da economia e a contenção da curva de contágio certamente foi o maior desafio para muitos países. Cada governo lidou de um modo diferente: alguns adotaram, em combinação com diferentes tipos de medidas de isolamento social, agressivos pacotes econômicos para salvar os negócios, outros optaram para uma renda básica emergencial, enquanto alguns decidiram cavalgar a tempestade e ver que no que dá.

Na Espanha, vimos um misto de algumas destas medidas, mas não poderiam manter tudo fechado para sempre. Mesmo entendendo o risco, seguiram adiante na desescalada, não apenas recebendo os turistas, mas também reabrindo bares e casas noturnas.

Sendo assim, fatalmente agora nos preparamos para a segunda onda da pandemia e, nas últimas semanas, os novos casos de contágio têm aumentado de modo dramático, mas desta vez afetando regiões que haviam sido poupadas do pior na primeira onda.

O mapa de contágios é totalmente desigual e ainda será possível, neste estágio, elaborar estratégias regionalizadas, mas, dada a circulação dos turistas e, principalmente dos jovens que, subestimando a letalidade do coronavírus em certas faixas etárias, se tornaram vetores desta nova onda, ignorando as recomendações de distanciamento social, desprezando o uso de máscaras e frequentando aglomerações.

A Espanha já entrou nas listas de países a serem evitados e, aqueles que passaram por aqui podem ser submetidos a uma quarentena obrigatória ao retornarem a seus países de origem.

Depois de meses fechados em casa, e algumas poucas semanas sentindo o gostinho agridoce desta “nova normalidade”, já estamos nos preparando psicologicamente para mais um duro período de isolamento social.

No fundo, esta é a real nova normalidade: a expectativa da cura, de uma vacina, de uma solução milagrosa que libertará o mundo deste pesadelo que jamais imaginamos que vivenciaríamos um dia.

Diferentemente do Brasil, que mergulhou de cabeça no precipício e resolveu encarar de peito aberto o massacre, não importando o altíssimo e doloroso custo em vidas humanas, os países europeus ainda estão tentando driblar o vírus, equilibrando-se nesta corda-bamba imprevisível: de um lado a saúde e a vida, do outro a economia e os trabalhos. Isolamento e reabertura. Isolamento e reabertura.

Parece que a segunda onda vem aí. Estamos mais calejados, já sabemos o que esperar, mas também já estamos todos exauridos e receosos. Um dia, isto chegará ao fim e talvez até nos esqueçamos de quão difícil foi para muitos de nós. Talvez se torne mais um daqueles estranhos capítulos dos livros de História, um capítulo que, desta vez, foi escrito com o nosso sofrimento.

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