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Vaias e lugares vazios

A partida Brasil vs. Uruguai volta a decepcionar a torcida, enquanto Dorival Jr. segue pedindo calma até que a Seleção se reorganize

Vaias e lugares vazios
Vaias e lugares vazios
Fonte Nova. O jogo da Seleção terminou 1 a 1 – Imagem: Nelson Almeida/AFP
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Esta foi uma semana preenchida por acontecimentos de grande impacto. Tivemos o G-20 acontecendo no Brasil; a despedida do campeão Rafael Nadal, aos 38 anos, das quadras competitivas do tênis; as ameaças de terror em Brasília; e, fechando o ano da Seleção Brasileira de futebol, a partida entre Brasil e Uruguai, em Salvador.

Tivemos, nesta terça-feira 19, na Fonte Nova, mais um jogo que provocou reclamações dos torcedores. As vaias no fim do jogo, que terminou 1 a 1, deixam claro que o Brasil fecha a temporada deixando os torcedores ainda inconformados com o momento atravessado pela Seleção.

Outra coisa a lamentar é que era difícil imaginar um jogo da nossa Seleção em Salvador com o estádio cheio de lugares vagos. A explicação para isso seriam os preços abusivos. Ao todo, 41 mil torcedores estiveram no estádio, que tem capacidade para 48.900 pessoas, deixando um setor bastante vazio.

A justificativa é que a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) não tem o poder de escolher os preços para as partidas da Seleção. O acerto é feito sempre com o estádio que vai receber a partida.

Depois do que aconteceu, de acordo com notícias do Globo Esporte e da ESPN, a CBF, irritada, decidiu que, a partir de agora, os jogos da Seleção só serão realizados em arena onde seja possível ela mesma definir os valores dos ingressos.

Mas, retornando ao que se viu em campo, podemos dizer que, ao longo da partida, a alternância entre aplausos e vaias refletia a irregularidade do time em construção. Isso ficou evidente até mesmo na apreciação variada dos comentaristas esportivos.

A Seleção Brasileira de futebol ser vaiada e, ainda por cima, com estádio sem lotação esgotada, é algo duro de ver. E era difícil imaginar que chegaríamos a esse ponto. Uma coisa que fica bastante evidente é a instabilidade do conjunto defesa, meio-campo e ataque.

Parece ser difícil, hoje em dia, escolher entre um meio-campo “tradicional”, com uma cabeça pensante, e o modelo moderno, mais “intenso” – para usar a palavra da moda.

Dorival Júnior procura ser atual, sem perder as características próprias do nosso futebol. Ele sabe ser esse um processo difícil e sabe também que, para isso, não conta com a paciência dos torcedores e de boa parte da crítica imediatista.

No entanto, com a tranquilidade de quem tem consciência do processo, ele lembra que “muitas coisas já mudaram”, demonstrando confiar na evolução do time. E, nessa percepção, ele é acompanhado pelos jogadores, que se mostram afinados com o treinador.

A situação faz lembrar os comentários característicos do João Saldanha quando, diante de um momento semelhante de um selecionado brasileiro, usou a imagem de uma cama com “cobertor curto”: cobre a cabeça, deixando os pés de fora, ou cobre os pés, deixando a cabeça de fora.

Para piorar, como hoje em dia o tempo para os treinamentos em conjunto é pouco, fica-se muito na dependência de atuações individuais. No jogo anterior, Vinícius Jr., o melhor jogador do momento, não estava num bom momento de sua jornada, e parecia intranquilo.

Desta vez, foi o excelente Bruno Guimarães, no setor responsável pelo equilíbrio da equipe, que não esteve bem. O papel do tal jogador “mais criativo” que se espera que os times tenham coube a ­Gerson, que vem se firmando jogo a jogo e teve a felicidade de fazer o gol de empate ao acertar um chute dificílimo, que lhe vai dar ainda mais confiança na sequência dos jogos.

Esse problema de encontrar o equilíbrio das linhas de uma equipe de futebol é o que os europeus chamam de “câmbio de ritmo”: o grande enigma de se construir um time que fique na memória ao conseguir uma harmonia entre os setores.

Para a Seleção, o ano acabou. Resta aguardar os jogos de 2025. •

Publicado na edição n° 1338 de CartaCapital, em 27 de novembro de 2024.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Vaias e lugares vazios’

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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