Ana Graça Correia Wittkowski

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Nascida e criada em Salvador da Bahia. Quinta de oito crianças, formada em Letras Vernáculas pela UFBa. Pós-Graduada em Literatura Contemporânea pela UEFS-Bahia. Formada em Etinologia e Lusitanística pela Johannes-Gutenberg-Universität-Mainz. Fundadora da ONG-BrasilNilê. Embaixadora da Década Internacional dos Afrodescentes na Alemanha.

Opinião

Uma carta de aplauso a Eleonore Wiedenroth-Coulibaly, referência para afro-imigrantes na Alemanha

Pela primeira vez, a cidade de Frankfurt na Alemanha homenageou uma mulher negra com uma de suas maiores distinções.

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Vozes da diáspora reúne mulheres negras brasileiras que escrevem a partir da vivência em Frankfurt, Alemanha.

Pra aqueles que leem meus textos, peço desculpas por há tanto tempo não ter produzido um texto para esta coluna. Mas justifico que foi uma fase de muitas emoções e atividades que exigiram de mim toda atenção e concentração. Foi uma fase de muitos encontros e trocas calorosas para o fortalecimento de nossas existências aqui neste país, e em muitas cidades.

Hoje vejo a hora de compartilhar uma experiência boa. Minha amiga Eleonore Wiedenroth-Coulibaly foi a primeira mulher afrodescendente em receber um prêmio Tony Sender pela sua contribuição na educação antirracista na Alemanha. O Tony Sender-Preis foi criado no ano de 1992 e é concedido a mulheres que se engajam no trabalho pela igualdade de direitos entre homens e mulheres e contra os sistemas discriminatórios.

Esse prêmio pode ser dedicado a todo tipo de trabalho de natureza artística, social, crítica e de cunho político, para mulheres que se engajam no trabalho com mulheres que estão em prisões, trabalhos educativos com e para imigrantes, ou ajuda para famílias monoparentais. O prêmio é dado a cada dois anos.

Nesta foto de capa que fizemos já no fim das festividades, ela está no meio, juntamente com minha companheira irmã e também colunista nessa coluna Vozes da Diáspora, Betânia Ramos Schroder.

Eleonore sabe compartilhar e abrir portas para outras mulheres negras, independente de origens e opções religiosas. Sendo uma das fundadoras da ISD – “Initiativ Schwarze Deutsch” (Iniciativa de Afro-alemães), ela esteve entre as que foram influenciadas pela grande Audre Lorde, nos anos em que ela lecionou em Berlin, impulsionando ativamente estas mulheres negras a lutarem pelos seus direitos de existirem e de serem felizes, fortalecendo a necessidade de criarem redes de apoio e recontarem as histórias como o fez May Ayim (1960-1996 – Poeta afro-alemã).

A primeira vez que a encontrei em Frankfurt foi na conferência “Afrika neu Denken – Repensando a África” no ano de 2016. Pra mim foi a primeira vez aqui neste país, depois de muitos anos, onde estive no meio de intelectuais negros de todo o mundo para discutirmos quem deve o que a quem, entre outras coisas. Lembro que fiquei emocionada com o discurso de Eleonore, sobretudo em sua análise social e histórica de histórias não contadas nos livros escolares e sua fala emocionada com a sobriedade e resiliência na decisão de ser feliz.

Ativista pelos direitos humanos com um quê de feminismo negro, minha amiga Eleonore respeita e valoriza nossas heranças espirituais. O seu trabalho consiste em levar fortalecimentos e aprendizados e, como ela mesmo disse no seu discurso ao receber o prêmio no Kaiser-Saal: Decidi levar a vida e não abrir mão de ser feliz. Trago sempre um sorriso, quero ter sempre um sorriso pra dar e me alegro pelos que recebo. Assim sei que haverá um amanhã.

Essa premiação foi histórica e importante. O salão nobre da prefeitura de Frankfurt estava lotado, corpos negros que confraternizavam, sorrisos e tudo isso em meio a paredes antigas, repletas de quadros de homens brancos, reis, senhores feudais, rostos e vestes dos chamados heróis do velho mundo, os que deram o dinheiro para as explorações e escravizações de seres como nós. A menina em mim deu língua pra cada um deles.

Frankfurt é uma cidade internacional onde as comunidades pretas ainda precisam conquistar espaços de acolhimentos, mas nós estávamos lá, sentamos nas cadeiras, nos abraçamos e sorrimos alto naquele espaço, comemos da comida e bebemos, como convidados da cidade, como convidados de Eleonore que, como ela mesmo disse, esse prêmio ela não recebeu sozinha, ela sabe das muitas mãos negras que a carregaram e socorreram e ajudaram a levantar nas vezes que ela caiu. Ela sabe do valor da empatia e do respeito, ela sabe da responsabilidade e assim disse também no seu discurso de posse que este prêmio em suas mãos é carregado por todas nós.

Pra minha amiga, companheira e mentora Eleonore desejo, nesse nosso novembro negro, que ela continue com muitos motivos para sorrir. Quero continuar compartilhando com ela felicidades e abraços negros.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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