Alberto Villas

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Jornalista e escritor, edita a newsletter 'O Sol' e está escrevendo o livro 'O ano em que você nasceu'

Opinião

Será que os astros não mentem jamais?

Horóscopo, leio desde sempre. Mesmo sabendo dos tiros n’água

Foto: Fala Simões Filho
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Eu tinha vinte e poucos anos quando uma cigana iugoslava me disse, no restaurante Les Hauts de Belleville, Rue du Borrégo, no vigésimo quarteirão de Paris, que eu teria quatro filhos. Baseada num pêndulo de cobre dependurado numa linha grossa diante dos meus olhos fixos, ela cravou: quatro! E eu não tinha nenhum.

Anotei no meu caderno Clairefontaine com capa cor de laranja pra nunca mais esquecer. Ela usava uma roupa de tecido grosso, muito colorido, um cachecol no pescoço, uma espécie de turbante na cabeça e nos pés, tamancos suecos. O cheiro de patchouli era forte.

Como criar quatro filhos lavando pratos na cidade, sim, maravilhosa?

Não demorou muito, poucos anos depois, veio o Julião, um meninão que nasceu na maternidade do Doutor Frédérick Leboyer, em Lilas. Um ano depois, veio a Sara, loirinha do cabelo espetado, lembro-me bem do dia em que nasceu. Paris ficou para trás, os meninos foram crescendo, o casamento acabou e eu, com duas crianças maravilhosas, não pensava mais em ter filhos.

Comecei a achar que era lorota daquela cigana vinda da Iugoslávia, um país que nem existe mais.

De repente, quando menos esperava, a Paulinha. E dois anos depois, veio a Maria Clara, moreninha, paulistana. E, por fim, a Marilia, outra loirinha, raspa do tacho. Quatro filhos!

Aquela cigana que nunca saiu da minha cabeça, voltou a mil no dia 14 de junho, quando vi Marilia, a Lili, procurando o peito. Videntes sempre me despertaram curiosidade. Guardei um medo durante toda a juventude quando, ainda criança, ouvi minha mãe dizer que uma cigana falou que uma tia ia morrer assassinada à tiros, o que nunca aconteceu.

Horóscopo, leio desde sempre. Mesmo sabendo dos tiros n’água.

Todo último Fantástico do ano, eu anotava as previsões dos videntes jogando seus búzios, convocados pelo programa pra dizer o que nos esperava nos 365 dias que tínhamos pela frente. Todo 31 de dezembro eu checava.

No ano em que um disse que o Brasil ganharia a copa, perdeu. No ano em que outro disse que o Brasil seria eliminado, ganhou.

No ano em que um disse que a Lady Di teria gêmeos, ela morreu. Nada dava certo e o programa deixou pra trás os videntes e seus búzios. Se dependesse de um deles, Pelé já teria morrido há mais de dez anos, Fidel não teria passado dos 70 e já estaríamos no Papa João Paulo XII.

Acreditava piamente no Quiroga quando ele foi trabalhar no Caderno 2 do Estadão. Ela enviava toda tarde, escrito em espanhol, o que os astros estavam prevendo para o dia seguinte. Era preciso traduzir. Às vezes ele acertava em espanhol, outras errava em português.

Abandonei o Quiroga quando ele cravou na revista Veja que Aécio Neves seria o próximo presidente da República. Pensando bem, ainda bem que errou.

Quando trabalhava nos fins de semana no Rio, ainda no quarto do hotel, me divertia lendo o horóscopo de domingo no Globo. “Dia propício para relaxar, descansar, ler um bom livro”. E eu tinha doze horas de trabalho pela frente.

Ouço diariamente aqui em casa que “Bárbara Abramo é foda”. Vou começar a ler.

“Junho abre com astral ainda contraditório – Lua em Libra faz os corações baterem na aspiração pela paz, justiça e igualdade, em ótima sintonia com o engenhoso Sol em Gêmeos”

Então está combinado.

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