Esther Solano

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Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Complutense de Madri e professora de Relações Internacionais da Unifesp

Opinião

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Em 2022, não falemos apenas para os nossos

Todo aquele que tenha a mínima capacidade de escutar deve ser nosso interlocutor

O PRESIDENTE JAIR BOLSONARO, EM SÃO PAULO, NO 7 DE SETEMBRO. FOTO: MIGUEL SCHINCARIOL/AFP
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Este é o ano em que o Brasil recomeça. O ano em que tudo se decide de novo. Só peço que a gente não cometa os mesmos erros. Espero que tenhamos aprendido, com sangue, com lágrimas, com dor, com fogo, com a vida, com a morte. Com 620 mil mortos.

Em 2022, não podemos errar. Não há espaço para os fiascos, para os descuidos. O nosso trabalho para ganhar estas eleições deve ser perfeito. Tropeços, escorregadas, equívocos podem significar que Brasil volte ao terror de novo, que feche a possibilidade de presente e de futuro. E não sei se o Brasil sobreviverá às trevas por mais quatro anos. Por isso, nesta eleição devemos ser impolutos.

Então, não falemos só para os militantes, para os nossos, para os nichos, para as bolhas, falemos para os desesperançados, para os apáticos, para os apolíticos, para os antipolíticos. Para aqueles que querem votar, para os que não querem, para os que não sabem em quem votar. Todo aquele que tenha a mínima capacidade de escutar deve ser nosso interlocutor. Falemos para os ressentidos, para os frustrados, para os cansados, para os desiludidos. Falemos para os desalentados. Falemos para o desempregado, para a mãe periférica sobrecarregada com as crianças em casa há dois anos, com o uberizado que se pensa microempreendedor, com o jovem, com o adulto, com o idoso.

Falemos para eles, mas, antes de mais nada, escutemos. Escutemos as complexidades das vidas concretas, suas nuances, seus sentidos. Escutemos para entender que o que aparenta ser contradição talvez seja só falta de compreensão da realidade do outro. A vida não se escreve em preto e branco, em simplificações. A vida se escreve de forma emaranhada e hermética, com letras às vezes pequeninas que precisam de muita atenção para ser lidas.

Escutemos. As pessoas querem ser ouvidas, enxergadas, querem sair da invisibilidade, querem sair das sombras.

As pessoas querem ser.

Escutemos os medos, as frustrações, as angústias, as solidões. A extrema-direita sempre radiografa os medos, os transforma em ódio e em votos. Nós devemos transformar esses medos em potência coletiva, em esperança, em melhora conjunta, em construção de possibilidades. Não cometamos o mesmo erro de rir do que para nós é folclore, mas para outros faz total sentido. Sempre haverá mamadeiras de piroca e kits gays. Sempre haverá comunistas que comem criancinhas. Mas o que aparentemente é caricatura esconde medos e carências reais. Esconde ausências, desassossegos. Então não gargalhemos da suposta burrice alheia, conectemo-nos com esses medos. Se não o fizermos, os burros seremos nós.

Devemos nos conectar com as dores humanas, mesmo que essas dores não sejam as nossas. Devemos entender as dores humanas, mesmo que essas dores sejam distantes das nossas.

Se a gente não entender, escutar e se conectar com essas dores, sempre haverá atrás da porta um monstro que finge entendê-las, escutá-las e conectar-se com elas.

O Brasil passa fome, então não percamos o tempo com conversas que não interessam. Vamos falar das urgências. Se quisermos ganhar esta eleição, vamos falar menos de fascismo e mais dos boletos não pagos. Vamos falar menos de conceitos que nada ou pouco dizem para a maioria e mais dos sofrimentos que muitos expressam.

Vamos falar e vamos estar juntos. A palavra de nada serve se a distância entre os corpos é gigantesca. A política é palavra, mas também é olho, pele. Se o nosso corpo estiver longe demais, nossa palavra também estará longe demais.

Escutar, falar, estar juntos.

Em 2022 não há espaço para o erro.

Em 2022 cada voto vale ouro.

Lula tem de ganhar em primeiro turno. Esse deve ser o nosso cenário. E para isso, em 2022, o trabalho dele, dos marqueteiros, do PT, o nosso, o de cada um de nós, deve ser magnífico.

Cada brasileiro deve se sentir representado por nós, acolhido, abraçado, escutado, compreendido.

Cada brasileiro deve sentir que estamos juntos com ele, que caminhamos do mesmo lado. Cada brasileiro deve sentir que, em 2022, vamos fechar a porta do horror e vamos abrir a porta para a vida.

Em 2022, não há espaço para erro.

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1191 DE CARTACAPITAL, EM 13 DE JANEIRO DE 2022.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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