Quem segura Bolsonaro é o exército de ocupação

As manifestações de 26 de maio provam que o bolsonarismo, em seu espectro de ferocidade demente, existe e tem dimensão nacional

Apoie Siga-nos no

Lula disse algo muito lúcido na sua entrevista à Folha de S.Paulo, mais ou menos o seguinte: enquanto os países europeus padecem ameaças às benesses conquistadas à sombra da democracia, no Brasil agredido pelas consequências do golpe de 2016, democracia na acepção completa e profunda jamais foi alcançada. Não somos por acaso o país da casa-grande e da senzala.

O ex-premier português José Sócrates, refinado político de longo curso e europeísta autêntico, enxerga com comedido otimismo o resultado das eleições europeias de domingo passado e eu digo salve, salve.

Em contrapartida, a situação nas nossas plagas infla os temores ao encarar o futuro. Uma diferença fatal em relação a países onde ainda se mantêm fortes liames com o Iluminismo reside no papel das Forças Armadas. Lá existem para defender as fronteiras e a soberania do Estado, aqui se atribuem, de armas em riste, o poder de mandar quando bem entendem. O Brasil sujeita-se a um exército de ocupação sempre em condições de determinar o nosso destino.

Em busca de uma reflexão o mais possível isenta, pergunto aos meus sombrios botões qual poderia ser o futuro à nossa espera. Nada de bom, murmuram. Inevitável constatar que o capitão não vive dias tranquilos ao cabo de cinco meses de um governo inconsequente e desastrado, vincado pela incompetência e pelo ridículo. Não deixam, no entanto, de anotar os botões que somente uma minoria de brasileiros é capaz de captar o lado cômico da atuação governista: a patetice adubada pela ignorância é congênita, bem como a credulidade malsã de quem se nutre de WhatsApp.

O momento apinha-se de perguntas por ora sem resposta a irrigar a incerteza. O governo bolsonarista chega a 2022? E haverá eleições?


As manifestações promovidas pelo capitão no domingo 26 de maio provam que o bolsonarismo, em todo o seu espectro de ferocidade demente, existe e tem dimensão nacional, mesmo assim tem força e peso bastante inferiores a quanto basta para saltar em segurança da corda bamba. Está claro que quem segura Bolsonaro é o exército de ocupação. Daí a conclusão: apenas os fardados podem apear o ex-subordinado vitorioso em 2018.

A inescapável lembrança de 1964 está longe de ser animadora, mas o Brasil de então era infinitamente melhor do que este dos dias de hoje. Se Bolsonaro cai, sobra para eles dar continuidade a um projeto de desvairado entreguismo que nos garante um lugar de honra no quintal de Tio Sam sem o risco do pleito de 2022. Ficam até quando quiserem.

Leia também

Para proteger e incentivar discussões produtivas, os comentários são exclusivos para assinantes de CartaCapital.

Já é assinante? Faça login
ASSINE CARTACAPITAL Seja assinante! Aproveite conteúdos exclusivos e tenha acesso total ao site.
Os comentários não representam a opinião da revista. A responsabilidade é do autor da mensagem.

0 comentário

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.