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Médico e ex-jogador de futebol brasileiro

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Que time teremos?

Tite, daqui para a frente, vai ser obrigado a mostrar as cartas do baralho. Afinal de contas, logo estaremos às portas da Copa do Catar

Que time teremos?
Que time teremos?
Créditos: Lucas Figueiredo/CBF
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Minha expectativa era a de que ele já tivesse mostrado o jogo nesta janela.

Com a Copa do Catar se aproximando, todo mundo anda preocupado com a Seleção Brasileira, que ainda não tem um time-base titular.

Nos dois primeiros de quatro amistosos previstos antes da estreia no Mundial, em jogos realizados na Coreia e no Japão, a distância não se mostrou um grande problema para nós, aqui no Brasil, salvo pelo horário das transmissões. A dificuldade poderia ser, sobretudo, o estado físico e emocional dos jogadores – quase todos em final de temporada na Europa.

Os resultados foram lógicos diante das circunstâncias. E tratou-se também de testes importantes. Os coreanos poderiam dificultar a vitória brasileira com a correria característica, mas a construção do placar iniciada com pouco tempo de jogo facilitou o desfecho elástico, com o Brasil goleando os anfitriões por 5 a 1, no Estádio Copa do Mundo, em Seul, a capital.

No jogo contra os japoneses, a história foi diferente. A Seleção venceu por um placar magro, 1 a 0, em Tóquio, com uma atuação aquém do esperado. A vitória foi conseguida com um gol de pênalti de Neymar. Foi um teste importante. O Japão também vai à Copa e já faz parte do Primeiro Mundo do futebol.

Comentou-se que o tempo que ainda existe até a realização da Copa permitiria a organização de outros jogos, principalmente em razão da preocupação diante do tal time-base. A própria comissão técnica revela sentir falta de adversários mais fortes, principalmente africanos, que costumam exigir muito da nossa Seleção, pelas características de seus jogadores.

Tite, certamente, tem o time titular na cabeça. Como se sabe, ele aproveita a vantagem da conquista, com folga, da classificação para testar as boas revelações que, felizmente, têm brotado.

Acredito que, daqui para a frente, ele vai ser obrigado a mostrar as cartas do baralho. Afinal de contas, só resta mais uma data Fifa, em setembro. E aí já estaremos às portas da Copa. Minha expectativa era a de que ele já tivesse mostrado o jogo nesta janela.

Aqui, nos nossos quintais, o Campeonato Brasileiro segue em sua fase inicial primando pela irregularidade, com um sobe e desce estonteante para os torcedores que, um dia, se esgoelam protestando pela má posição do time na tabela, pedindo a cabeça dos técnicos e pressionando os jogadores, e, no outro, berrando de euforia dentro do grupo dos quatro primeiros – às vezes, em primeiro lugar.

Esse ponto, no nosso futebol, mostra coerência com a situação aflitiva do nosso dia a dia, com desespero e violência correndo lado a lado. Corinthians e Flamengo, os times com as torcidas mais populosas, vivenciam isso claramente.

Em São Paulo, jogadores pedem para sair diante de ameaças até a seus familiares – algumas delas feitas por pessoas transtornadas por problemas mentais. No Rio, o caso do Flamengo é bastante complicado. Premido pela necessidade de reformulação depois de um período vitorioso, com jogadores naturalmente desgastados, o time está no meio do caminho e nos faz lembrar daquela velha imagem de trocar o pneu com o carro andando.

Sendo ele um clube de massa, seus jogadores devem, dentro da atual situação, estar vivendo um ambiente infernal. Temos os declaradamente descartados da equipe convivendo com os novos contratados e com os jovens cotados ao grupo pretendido a se estabelecer. Vivem todos sob desconfiança, e em choque com o técnico, que tenta cumprir seu projeto de testar todos até definir o elenco.

O comportamento dos jogadores na partida em que o time perdeu para o Fortaleza, por 2 a 1, no domingo 5, é um exemplo das contradições em curso. Bem colocado em campeonato internacional, o time vai mal no Brasileiro e, nesse jogo, mostrou falhas incompreensíveis de jogadores que, embora tendo boas credenciais, estavam visivelmente desestabilizados.

As imagens, em detalhes, mostravam semblantes carregados, tensos ao extremo. Eles estão encarando, de fato, uma missão complicada, em meio a pressões dos torcedores, multas contratuais e interesses financeiros.

Toda essa confusão se espalha pelas séries B, C e D. Enquanto persistirem as mudanças nos formatos jurídicos dos clubes, parece que não há como ser diferente. Neste momento, estão todos atordoados. •

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1212 DE CARTACAPITAL, EM 15 DE JUNHO DE 2022.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “Que time teremos? “

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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