Rafael Rodrigues da Costa

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É mestrando em Ciências Sociais pela Unifesp, pesquisador visitante do NEC/UFBA e pesquisador do Ineep.

Opinião

Preços de combustíveis e market share garantem lucro da Petrobras

O resultado só não foi melhor em virtude das maiores despesas contábeis (sem desembolso) com variações cambiais

Foto: André Motta de Souza/Agência Petrobras
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A Petrobras divulgou na quinta-feira 13 os resultados operacionais e financeiros do primeiro trimestre de 2021 (1T21). Segundo a companhia, o lucro líquido foi de 1,2 bilhão de reais, resultado do aumento das receitas de vendas para o mercado interno, principalmente por conta da elevação dos preços dos derivados; e da ampliação do market share e das margens do mercado de derivados nacional, sobretudo diesel e gasolina.

O resultado só não foi melhor em virtude das maiores despesas contábeis (sem desembolso) com variações cambiais, que no mesmo período registraram uma alta de 123,4% e tiveram impacto negativo de 18,7 bilhões.

O lucro foi explicado, em boa parte, pela elevação de 14,2% na receita total de vendas, que ao longo do trimestre alcançou 86,2 bilhões de reais. As vendas de diesel e gasolina para o mercado interno – que registraram altas no trimestre de, respectivamente, 32,9% e 39,6% em relação ao primeiro trimestre de 2020 (1T20) – foram os principais componentes que puxaram a elevação das receitas.

Isso foi possível em virtude do deslocamento, no 1T20, das importações de diesel e gasolina por parte da Petrobras. Em outras palavras, a empresa elevou seu market share em ambos mercados. Estimativas do Ineep, a partir de dados da ANP e da própria Petrobras, apontam que a participação do volume de vendas de gasolina e diesel da estatal no país subiram de 65,6% 1T20 para 73,0% no 1T21.

Além do aumento do market share, a receita de vendas da Petrobras também foi impulsionada pelo aumentou o preço dos seus derivados no mercado interno em 22,1%. Reflexo da política de preços de paridade de importação (PPI) adotada pela estatal, que reajusta os seus preços de derivados a partir de mudanças nas cotações internacionais dos derivados, na taxa de câmbio e custos logísticos.

A combinação entre o aumento da participação da Petrobras no mercado brasileiro de derivados e altas nos preços dos derivados fizeram com que a receita de vendas da companhia para o mercado interno saltasse 26,7% no 1T21 em relação ao mesmo período do ano anterior, ficando em 62,2 bilhões.

Já no mercado externo as receitas da Petrobras tiveram um movimento oposto, sofrendo uma retração de 9,3% em comparação ao 1T20. Isso se deu sobretudo pela forte queda no volume de exportações de petróleo cru, que despencaram 36,6%. O impacto da redução das exportações de petróleo, no entanto, foi parcialmente compensado pelas exportações de óleo combustível, produzidos também nas duas maiores refinarias do nordeste (RLAM e RNEST que continuam fazendo do programa de desinvestimento da estatal), que registraram no mesmo período um crescimento de 14,4%.

A diminuição nas receitas de vendas para o mercado externo sinaliza que a Petrobras poderá ter dificuldades para continuar elevando suas exportações no longo prazo. Tendo em vista a retomada da produção dos grandes ofertantes de petróleo aos níveis pré-pandemia e o aumento do estoque de petróleo cru da estatal, é provável que essa recente queda nas exportações seja reflexo de dificuldades da estratégia da companhia de vender sua matéria-prima para o mercado externo.

Cabe observar ainda a relação comercial da Petrobras com a China, principal destino das exportações da Petrobras, uma vez que ocorreu uma expressiva diminuição no volume de exportações (de 45,7%) entre o 1T20 e o 1T21, num momento em que a economia chinesa registrava um extraordinário crescimento. Isso pode ser explicado por uma possível deterioração das relações diplomáticas entre os dois países e/ou de ajustes de estoque de petróleo e derivados na China.

A elevação da receita total de vendas foi o item que mais afetou positivamente o lucro antes do resultado financeiro e impostos (cerca de 33 bilhões), no 1º trimestre de 2021, uma vez que os custos dos produtos vendidos e os operacionais (descontando os impairments) foram próximos dos valores do mesmo período do ano passado. Esse lucro foi fortemente reduzido em virtude do resultado negativo financeiro de 30,7 bilhões de reais, afetado particularmente pelas maiores despesas (contábeis) com variações cambiais e monetárias. Com isso, o lucro antes dos impostos foi de 3,2 bilhões.

Ainda sobre as finanças, a Petrobras no último trimestre reduziu consideravelmente o seu nível de endividamento, alcançando uma relação dívida líquida/EBITDA de 2,03 – valor mais baixo do que a meta de 2,5 que a empresa havia sinalizado em 2017 como principal motivo para a venda de seus ativos.

Essa redução do endividamento foi possível com a ampliação de 15% na geração de recursos operacionais no 1T21 frente ao 1T20. Isso permitiu a Petrobras, ao mesmo tempo, pagar suas despesas financeiras (com juros, arrendamentos e amortização de dívida, em cerca de 25,4 bilhões), sem grande necessidade de capitação de novos financiamentos, e ainda obter um saldo monetário de cerca de 7 bilhões de reais já descontando os recursos utilizados em atividades de investimento que caíram a um dos patamares mais baixos da história recente.

Os investimentos no trimestre atingiram a cifra de 1,9 bilhão de dólares, menor patamar em dólares dos últimos 20 anos, mesmo com a necessidade de explorar as áreas do pré-sal que estão nas mãos da estatal. A estratégia de ampliação da liquidez hoje, em detrimento da ampliação do investimento em imobilizados, tende a reduzir no médio e longo prazo os fluxos de caixa futuro, principalmente no segmento de exploração e produção (E&P).

Os dados em tela, portanto, reiteram a importância do mercado interno para a Petrobras, principalmente em períodos que não for vantajoso alocar sua produção de petróleo no mercado externo. Mostram, também, que a Petrobras no último trimestre obteve um ganho significativo com as vendas de combustíveis no mercado interno. Esse ganho é resultado da agressiva política de preços nos derivados, fruto da escolha da Petrobras de repassar a variação internacional do petróleo aos consumidores brasileiros. Além disso, coloca em xeque a estratégia de exportar petróleo cru, uma vez que a companhia dependerá de variáveis externas para ter sucesso. Apesar da mudança de gestão, nada indica que o compromisso em privilegiar acionistas e diretores e manter a estratégia de transformar a Petrobras numa empresa produtora de petróleo com olhos para o mercado externo tenham sido modificados.

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