Artigo
Participação social, comunicação pública e o exercício da cidadania
Em cenário de polarização política e fragilidade de processos democráticos, retomar os espaços de debate social é atuar no fomento da cidadania e da democracia


A participação social é um importante pilar para a construção de uma comunicação pública que dialogue com a sociedade. Em tempos de infodemia, com o imenso fluxo de informações que chega a todos via internet, a missão de trabalhar com conteúdo de efetivo interesse público se torna ainda mais vital para a comunicação pública, que pretende ser um espaço de exercício da cidadania. Para além do simples ato de informar, ela deve mediar processos de escuta e diálogo com a sociedade e, na promoção do debate público, prestar seus serviços a partir dos interesses dos cidadãos.
Prevista na Constituição de 1988 como participação e controle social, quando se refere às atribuições de sistemas e conselhos em diferentes áreas, atualmente é mais conhecida como participação social. Ela atribui à sociedade civil o direito de acompanhar as realizações do Estado e contribuir para ações mais transparentes, democráticas e diversas.
Especificamente na comunicação pública, a participação ou controle social surge nos anos 1980, na Europa. Já no Brasil, a formalização de uma estrutura participativa, em âmbito nacional, é firmada apenas no segundo governo do presidente Lula, com a criação da Empresa Brasil de Comunicação, a EBC, e seu conselho curador, estrutura colegiada que foi desarticulada em 2016.
A participação social possui relação direta com a maneira como se executam as políticas públicas de um governo progressista. É a partir desse contexto que podemos falar sobre o resgate da participação social na EBC. O mês de novembro de 2023 marca o recomeço desse trajeto, quando foi instituído um grupo de trabalho para discutir essa retomada. O GT, composto por membros da EBC, da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, do antigo conselho curador e por representantes da sociedade civil, produziu uma peça relatorial robusta, ousada e inovadora.
A proposta apresentada pelo grupo sinalizou para a criação de um Sistema Nacional de Participação Social na Comunicação Pública, uma estrutura que contempla a sociedade civil organizada, em duas instâncias, com atribuições complementares. Uma delas é o Comitê Editorial e de Programação, formado por 11 membros representantes de segmentos da sociedade, de acordo com o que preconiza o artigo 3º do Decreto nº 12.005, de 23 de abril de 2024.
A outra instância é o Comitê de Participação Social, Diversidade e Inclusão, formado pelos 11 representantes do Comep mais um corpo de 16 membros, cuja composição abrigará cinco representantes da sociedade civil, cinco representantes de entidades do campo da comunicação pública, cinco representantes da Rede Nacional de Comunicação Pública e um representante de entidade sindical de jornalistas ou radialistas. Portanto, serão 27 representantes da sociedade civil.
A diversidade e a inclusão são fatores preponderantes para a composição de ambos os comitês. Cada um deles deve ser instalado com o mínimo de 40% de mulheres, além de representações negras e indígenas, pessoa com deficiência, LGBTQIA+. O procedimento de eleição está previsto para ocorrer de forma inédita por meio da plataforma Brasil Participativo. As organizações da sociedade civil se habilitarão para a indicação dos candidatos e qualquer pessoa, em qualquer parte do País, poderá votar utilizando seu CPF. Ao estender o direito ao voto para o conjunto de cidadãos brasileiros, amplifica-se o debate público.
Em meio ao atual cenário de polarização política e de fragilidade de processos democráticos em diferentes âmbitos, retomar os espaços de debate social é atuar no fomento da cidadania e da democracia. Com a materialização do Sistema Nacional de Participação Social, Diversidade e Inclusão, associado às ações de expansão da Rede Nacional de Comunicação Pública e ao fortalecimento dos veículos de comunicação da EBC, traça-se um caminho em bases sólidas, arraigadas aos princípios democráticos. Essa trilha visa fornecer uma comunicação pública que contemple as múltiplas necessidades da sociedade brasileira.
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