Alberto Villas

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Jornalista e escritor, edita a newsletter 'O Sol' e está escrevendo o livro 'O ano em que você nasceu'

Opinião

Obituário

Não gosto de economia, mas a agonia da Americanas me tocou, escreve Alberto Villas

Foto: Nelson Almeida/AFP
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Tirando todo o imbróglio econômico e as falcatruas, assisto aqui à agonia das Lojas Americanas com dor no coração. Não gosto de economia, acompanho o noticiário porque são os ossos do ofício. Mas confesso que o fim das Lojas Americanas me tocou.

Já vi a morte da Varig, por exemplo. Foi nas asas da Varig que fiz a minha primeira viagem de avião, de Belo Horizonte até Brasília, numa época em que a capital era puro pó, tratores, projetos, candangos e sonhos. Da janelinha oval com cortininha, vi lá embaixo aquela poeira vermelha subindo em redemoinhos, o que me assustou muito.

Não sei quantas horas de voo fiz na Varig. Muitas, com certeza. Até pra Abidjan, na África, voei nas asas da Varig. Lembro-me bem do tucano na televisão e do refrão: Varig! Varig! Varig!

Já vi também a morte da Mesbla. Lembro-me daquele elevador com porta de sanfona e o ascensorista anunciando a cada andar: Primeiro andar, roupas femininas, sapatos, acessórios. Segundo andar, roupas masculinas, roupas esportivas. Terceiro andar: Eletrodomésticos, utensílios para o lar. No último andar ficavam os brinquedos e foi lá que escolhi a minha primeira Caloi.

Já vi a morte do drops Dulcora, do Crush, do AeroWillys, do Vigilante Rodoviário, da revista Realidade, da camisa Volta ao Mundo, do elefantinho da Shell, dos pratos Colorex, do catálogo telefônico, do Canal 100, já vi a morte de muita coisa.

Mas a agonia das Lojas Americanas me tocou.

A inauguração da primeira Lojas Americanas em Belo Horizonte foi uma festa. Todo mundo foi. Teve balões vermelhos com o nome da loja, discursos e distribuição de balas para as crianças.

Ali, eu me sentia no futuro, na América do Norte que ainda não conhecia, num mundo que se anunciava moderno, onde as pessoas escolhiam a mercadoria e pagavam no caixa. Enxerguei ali o fim do Mercadinho Santa Rita, das Lojas Irmãos Reis, do Bar e Lanches.

Toda vez que ia ao centro de Belo Horizonte com a minha mãe, para ela fazer compras, nosso passeio terminava nas Lojas Americanas. Mais precisamente na lanchonete que servia a melhor banana split do mundo.

Eu me sentava num banco muito alto, com assento redondo e estofado em amarelo e quando a mocinha vinha com a banana Split num barquinho de vidro, duas bolas de sorvete de creme, fatias e banana, biscoitinhos enfiados no sorvete e um creme por cima, meus olhos brilhavam.

Não tinha nada melhor nesse mundo do que a banana split das Lojas Americanas.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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