

Opinião
O que o campo progressista pode esperar das eleições de 2024
Teremos mais prefeituras empenhadas em estruturar políticas públicas de combate às desigualdades, mas ainda em número insuficiente


Hoje, 16 de agosto, começa oficialmente a campanha eleitoral nas 5.568 cidades brasileiras. A partir de agora, as candidatas e os candidatos às prefeituras e Câmaras Municipais poderão solicitar abertamente o voto, tanto nas ruas quanto nas redes sociais. Este processo de mobilização, que ocorre na base da nossa sociedade, é realizado em um sistema pluripartidário desde 1982, consolidando-se no formato atual — a cada quatro anos, de modo alternado com as eleições nacionais e estaduais — em 1988, com a promulgação da Constituição.
Cada eleição municipal tem sua própria dinâmica, tanto do ponto de vista local quanto na dimensão histórica. No entanto, em meio à enorme fragmentação que caracteriza essas eleições, as disputas pelas prefeituras também têm um significado político geral e nacional. As eleições de 2000, por exemplo, foram marcadas por uma “onda vermelha”, com vitórias do PT em capitais importantes, o que consolidou a perspectiva da vitória de Lula em 2002. Já as eleições de 2016 representaram a maior derrota da esquerda, evidenciando a virada conservadora que se confirmaria dois anos depois com a eleição de Bolsonaro para presidente.
O que esperar, então, das eleições de 2024? Este texto apresenta respostas em três dimensões. Primeiro, essas eleições serão marcadas pela continuidade da polarização entre Lula e Bolsonaro como as duas principais figuras políticas nacionais. Paralelamente, há uma disputa entre democracia e autoritarismo, uma vez que cada vitória bolsonarista significará o fortalecimento da extrema-direita em sua tentativa de retomar o poder e desfazer o arranjo democrático em nosso país. Da mesma forma, cada derrota de um candidato bolsonarista contribuirá para o fortalecimento da democracia brasileira.
É crucial, portanto, analisar cada disputa municipal sob esse prisma, compreendendo que o que está em jogo não é apenas o controle do executivo e legislativo locais, mas também como essas posições influenciarão a disputa mais estratégica pelo fortalecimento da democracia brasileira.
Segundo, as eleições são sobre projetos de país e de cidade. No Brasil, isso significa não apenas consolidar a democracia do ponto de vista institucional — o que é de suma importância — mas também estruturar um modelo democrático que avance no combate às múltiplas desigualdades que afetam a vida da população. É fundamental examinar as candidaturas, dentro da diversidade que caracteriza a frente ampla democrática, para identificar quais representam um processo substantivo de garantia e ampliação dos direitos, e quais estão se posicionando para manter o status quo das desigualdades.
Terceiro, há a dimensão mais conjuntural, que impacta os rumos do governo Lula e as perspectivas de reeleição do atual presidente. Nesse contexto, destaca-se a importância do processo eleitoral no debate público do país: as eleições proporcionam igualdade de condições na disseminação de informações políticas para toda a população. Por essa razão, os governos tendem a melhorar sua avaliação durante as eleições, especialmente com a propaganda de rádio e TV, além da mobilização de milhares de “cabos eleitorais” que são as candidatas e os candidatos à vereança e à prefeitura em todo o país. No processo eleitoral, as barreiras impostas por dificuldades financeiras e pelos monopólios de informação — sejam analógicos ou digitais — são quebradas. Nem mesmo o processo de desinformação impulsionado pela extrema-direita é capaz de anular isso.
Diante desses três fatores e da maneira como eles se articulam, arrisco alguns prognósticos: primeiro, Lula deverá melhorar sua avaliação nos próximos meses, impulsionado pela mobilização das candidaturas que levarão as realizações de seu governo a um amplo conjunto do eleitorado. Como consequência, o atual presidente acumulará mais vitórias em capitais e cidades com segundo turno do que seu principal antagonista, o ex-presidente Jair Bolsonaro, saindo do pleito como favorito para conquistar seu quarto mandato.
O bolsonarismo apresentará candidaturas com força em todas as cidades que têm segundo turno, mas ficará limitado a cerca de um terço do eleitorado, sem condições de ampliar seu alcance para vencer na maioria dos municípios. Isso significará que, em 2026, a extrema-direita continuará liderando a polarização contra Lula, sem deixar espaço para uma direita democrática, mas, ao mesmo tempo, permanecerá limitada do ponto de vista majoritário.
Por fim, no combate às desigualdades, o Brasil verá uma ampliação significativa das gestões comprometidas com a garantia e ampliação dos direitos e a melhora na vida da população. No entanto, o desafio será grande, dado que, em 2016 e 2020, houve uma hegemonia de gestões de direita que buscaram manter o status quo das desigualdades. Em outras palavras, teremos mais prefeituras empenhadas em estruturar políticas públicas de combate às desigualdades, mas ainda em número insuficiente para promover uma mudança estrutural a nível nacional. Para isso, será necessário não apenas uma nova vitória eleitoral da democracia em 2026, mas também a organização de um novo processo de mobilização social e cidadã nos próximos anos.
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.
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