A vitória de domingo foi a vitória do carisma. Esse carisma político que só se obtém depois de uma extraordinária história de vida. Um carisma construído no percurso singular de alguém que sofreu pessoalmente a exclusão e a pobreza e que lutou contra a ditadura militar num período em que se fazia política com risco de vida. Um carisma que vem do indiscutível êxito da sua governança anterior na promoção da igualdade econômica e no que isso significa de efetivo avanço democrático. Um carisma recentemente ampliado pela provação de uma prisão injusta e politicamente motivada. Um carisma baseado numa vida política que sempre buscou o diálogo e o compromisso e que sempre rejeitou o ressentimento ou o ajuste de contas social. Um carisma fundado na superioridade de uma nova plataforma social de igualdade. Foi esse carisma que venceu. Mercê de uma biografia absolutamente extraordinária, Lula é, neste momento, o único personagem da política brasileira que tem autoridade política para transformar velhos inimigos em leais adversários. Quando escolheram Lula para presidente, os brasileiros sabiam exatamente o que estavam a fazer.
A grandeza política dessa vitória parece querer ser obscurecida com a tese da “polarização” como o grande mal brasileiro. Falta paciência para ouvir tal disparate sem reagir. A tese parece desde logo idiota na medida em que é impossível manter um sistema de eleição presidencial em dois turnos exigindo ao mesmo tempo que não haja polarização. É como se o sistema democrático dissesse ao povo que o segundo turno terá os dois candidatos mais votados, que a escolha final será feita entre os dois, mas, ao mesmo tempo, recomendar ao mesmo povo que evite qualquer espécie de polarização porque esta agride a sensibilidade democrática de alguns. Não, não me parece que nada disso seja lógico nem que nada disso seja inteligente. Ao contrário, parece absurdo. A “polarização” não explica nada, mas esconde muito.
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