O poder do carisma

Lula é o único capaz, neste momento, de tornar velhos inimigos em leais adversários

Imagem: Mauro Horita/Getty Images/AFP

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A vitória de domingo foi a vitória do carisma. Esse carisma político que só se obtém depois de uma extraordinária história de vida. Um carisma construído no percurso singular de alguém que sofreu pessoalmente a exclusão e a pobreza e que lutou contra a ditadura militar num período em que se fazia política com risco de vida. Um carisma que vem do indiscutível êxito da sua governança anterior na promoção da igualdade econômica e no que isso significa de efetivo avanço democrático. Um carisma recentemente ampliado pela provação de uma prisão injusta e politicamente motivada. Um carisma baseado numa vida política que sempre buscou o diálogo e o compromisso e que sempre rejeitou o ressentimento ou o ajuste de contas social. Um carisma fundado na superioridade de uma nova plataforma social de igualdade. Foi esse carisma que venceu. Mercê de uma biografia absolutamente extraordinária, Lula é, neste momento, o único personagem da política brasileira que tem autoridade política para transformar velhos inimigos em ­leais adversários. Quando escolheram Lula para presidente, os brasileiros sabiam exatamente o que estavam a fazer.

A grandeza política dessa vitória parece querer ser obscurecida com a tese da “polarização” como o grande mal brasileiro. Falta paciência para ouvir tal disparate sem reagir. A tese parece desde logo idiota na medida em que é impossível manter um sistema de eleição presidencial em dois turnos exigindo ao mesmo tempo que não haja polarização. É como se o sistema democrático dissesse ao povo que o segundo turno terá os dois candidatos mais votados, que a escolha final será feita entre os dois, mas, ao mesmo tempo, recomendar ao mesmo povo que evite qualquer espécie de polarização porque esta agride a sensibilidade democrática de alguns. Não, não me parece que nada disso seja lógico nem que nada disso seja inteligente. Ao contrário, parece absurdo. A “polarização” não explica nada, mas esconde muito.

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2 comentários

PAULO SERGIO CORDEIRO SANTOS 10 de novembro de 2022 16h32
Lula sempre foi um líder carismático no sentido weberiano, mas agora, ele venceu outro líder carismático, Bolsonaro. O fato é que Bolsonaro tem o seu carisma voltado para o extremismo dos ressentidos, dos que abominam a educação, as minorias , os diferentes e não desejam viver num país democrático em que todos podem viver em paz. A questão da polarização posta por setores midiáticos não tem o aspecto clássico sociologicamente falando. A polarização entre Lula e Bolsonaro se dá em que o primeiro deseja viver em democracia plena, com eleições periódicas, em erradicar a pobreza e diminuir a desigualdade e estabelecer o afeto e o amor como ideal de governança enquanto o outro deseja exatamente o contrário. Não respeita os diferentes, quer hostilizar e humilhar pessoas vulneráveis, privilegiar quem detém o capital de maneira predatória. Essa é a essência da chamada polarização que devemos entender. Não se trata de ideias contrárias ou pontos de vistas diferentes, mas de se viver em um mundo civilizado e de respeito entre as pessoas ou num mundo caótico em que a lei da sobrevivência é ditada pelo mais forte. Essa é a principal diferença. Lula, de fato, já cedeu ao máximo para os liberais, os que interpretam o mundo democraticamente, mas não pode ceder mais, porque o seu projeto de país e de diminuição das desigualdades seria em vão. O carisma de Lula se explica mesmo pela sua trajetória de vida, sempre em luta e na luta, enquanto o de seu adversário, que felizmente perdeu, nada fez a não ser destruir tudo o que estivesse ao seu alcance.
José Carlos Gama 9 de novembro de 2022 22h05
Sempre achei esse termo num estado democrático de direito meio sem pé nem cabeça ou melhor, gastava-se muito tempo criticando os efeitos nocivo da psdopolarização entre PT e PL, mas não sabia expressar essa questão da polarização porque me parecia normal. Agora, lendo esse texto esclarecedor, fico mais confortável em saber que não estava tão fora da cursa assim nesse assunto. Todavia, considero que, embora exista sim polarização, ela se dá mesmo entre os sistema norte americano como diz José Sócrates por aqui, creio que não poderia existir nesse sentido, afinal temos partidos saindo pelo ladrão....

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