Isa Penna

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Advogada especializada em casos de violência contra a mulher, ex-assessora parlamentar na Camara Municipal, deputada estadual e ex-vereadora de São Paulo.

Opinião

O lugar de Doria no ranking da pandemia

Apesar de discurso, na prática gestão Doria não possui melhores resultados que gestão Bolsonaro

Foto: Governo de SP Doria visita o Senado com a vacina Coronavac (Foto: Governo de SP)
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Escrevo exatamente no dia do primeiro aniversário da identificação do primeiro caso de Covid-19 no Brasil. Passado um ano desse marco o cenário é mais trágico do que se imaginava. Chegamos a quase 10,4 milhões de casos da doença e 251.500 mortes – o que significa pelo menos um milhão de pessoas enlutadas pela perda de um familiar.

O Brasil é o sexto país mais populoso do mundo, mas é o terceiro em casos e o segundo em mortes no ranking global. Nosso posto é lamentável e contribuem para isso o negacionismo, a irresponsabilidade, a negligência e a incompetência de nossos governantes. Não fosse essa tamanha irresponsabilidade política e humana não teríamos visto o genocídio de amazonenses e o surgimento de uma nova variante do vírus, a “variante de Manaus”– que já se espalha pelo país e mata em São Paulo também.

Além disso, a insistência de pessoas em realizar aglomerações e o número expressivo de pessoas que não querem se vacinar também cai na conta dos governantes, especialmente do governo federal. Bolsonaro, em sua conduta negacionista, não negociou com antecedência a compra dos imunizantes e não planejou uma campanha de vacinação que poderia correr na frente do ritmo dos contágios.

O governador de São Paulo, de olho nas eleições de 2022, faz todos os esforços para se diferenciar do governo federal e aparecer como o “grande gestor” diante da pandemia. É verdade que Doria acertou ao levar o Instituto Butantan a adiantar o contrato com a chinesa BioNTech para a importação e fabricação da Coronavac, e com isso fazer com que o Ministério da Saúde tomasse providências. Mas será que o resultado para a população do estado de São Paulo foi tão diferente?

Se o estado de São Paulo fosse um país, seria o 31º país mais populoso do mundo, mas o 14º em casos e o 13º em mortes. Em números absolutos, o estado tem, aproximadamente, 46 milhões de habitantes (22% da população brasileira), enquanto os casos aqui representam 19% do total nacional e 23% do número de mortos.

Na ponta do lápis, as ações de Doria não apontam um resultado melhor que o do governo federal frente à pandemia.

O estado tem uma média de 5519 casos diários de Covid. Em fevereiro essa média dobrou com 9392 casos/dia. A média estadual diária de mortes em toda a pandemia era, até fevereiro, de 161 mortes, mas desde o início do mês chegou a 231 mortes – número 70% maior. Ou seja, São Paulo não está conseguindo se descolar da tendência geral de agravamento do quadro sanitário-social.

 

Quais seriam as razões? Em primeiro lugar, nenhum ente federativo do país pode ser uma ilha num país tão doente, em todos os sentidos. Em segundo lugar, porque o governo Doria se negou a enfrentar interesses políticos e econômicos e tomar medidas mais drásticas de isolamento social, o que significaria, no mínimo, ter decretado um isolamento mais rígido, generalizado e com fiscalização rígida nos feriados de Ano Novo e Carnaval.

Além disso, o governo pouco se preocupou com a recessão (4% de PIB negativo em 2020), o desemprego e a fome que assolam os mais vulneráveis – ainda mais agora, sem o auxílio-emergencial federal. Poderia ter implementado um auxílio paulista com um valor adequado, adquirido computadores e tablets para estudantes de baixa renda, realizado testagem em massa da população, realizado a ampliação do número de vagas de enfermaria e UTI, bem como a vacinação prioritária de todos os profissionais da educação, mas não o fez.

Miguel Nicolelis, um dos cientistas de maior prestígio do país, defende um lockdown nacional por 21 dias para evitar que o país chegue ao fim do ano com meio milhão de mortos. Segundo afirmou ao Globo no dia 26 de fevereiro, “a consequência da perda de meio milhão de pessoas não dá nem para imaginar. Sem gente não tem economia, ninguém produz, ninguém consome. É inconcebível. (…) [Proponho] um lockdown imediato, nacional, de 21 dias, com barreiras sanitárias nas estradas, aeroportos fechados. E depois ampliar a cobertura, usando múltiplas vacinas. (…) Estamos falando da vida de 1.500 pessoas por dia, são cinco boeings caindo. Vacinação, vacinação, vacinação, testagem e isolamento social. Não tem jeitinho numa guerra. Estamos diante de um prejuízo épico, incalculável, bíblico”.

O recado da Ciência está dado. Diferenciar-se de Bolsonaro é enfrentar a pandemia de fato. Entre os grandes interesses políticos e econômicos e a vida da população, Doria deve escolher a vida. Do contrário, seu governo entrará para a História como a “variante paulista” do vírus bolsonarista.

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