

Opinião
O efeito John Textor
O investidor norte-americano do Botafogo traz novas perspectivas e movimenta as peças do futebol brasileiro neste período conturbado


O burburinho causado com a chegada do investidor norte-americano ao Botafogo indica que podemos ter boas novidades não só no time carioca, mas também no futebol brasileiro como um todo.
Sócio majoritário da Sociedade Anônima de Futebol (SAF), John Textor foi ovacionado após a vitória do Botafogo por 3 a 1 diante do Fortaleza, no domingo 15. À parte a euforia dos torcedores da Estrela Solitária, a disposição de Textor de se integrar ao conjunto dos dirigentes que tratam da discussão da Liga Brasileira de Clubes (Libra), em plena efervescência, pode trazer bons ventos neste momento de transformação.
Temos insistido em dizer que as mudanças não são apenas necessárias, mas também inadiáveis. Os torcedores andam em desespero com a baixa qualidade do futebol jogado entre nós. Passamos a viver da exportação de “pés de obra” e da repatriação de antigos ídolos. A distância entre a (des)organização do nosso esporte – o futebol, neste caso – e a maneira como as coisas funcionam mundo afora tornou-se inaceitável.
As tabelas de classificação dos nossos campeonatos deixam claro que alguma coisa anda muito fora dos trilhos. Clubes de grande tradição, com conquistas históricas e grandes contingentes de torcedores, encontram-se perdidos nas divisões inferiores.
O rebaixamento faz parte do futebol e, obviamente, pode ser considerado aceitável em diversas situações. O que vemos, porém, são disparates tão grandes que não tenho como não deixar de considerá-los distorções graves, reflexos do desequilíbrio insustentável nas distintas formas de administração dos clubes. Vêm de longe as tentativas de remendar esse tecido esgarçado. A mais recente delas foi, justamente, a oficialização das SAF.
As declarações de Textor têm sido muito proveitosas e bastante diretas. Ele mostrou-se surpreso com a maneira como foi acolhido pelos dirigentes dos clubes da Libra, ou seja, sem o preconceito que era de se esperar. E tem batido na tecla do desejo de internacionalizar a “marca” Botafogo.
Textor também observou, de forma acertada – e mesmo reconhecendo as qualidades dos nossos jogadores – que, no momento, ninguém pelo mundo está assistindo aos jogos disputados aqui no Brasil. E isso, com as variadas formas de transmissão dos jogos, seria perfeitamente possível.
Outro ponto abordado por ele foi o da necessidade de se aumentar o intercâmbio com a Europa, os Estados Unidos e outros centros. Sua sugestão é que procurem financiadores, uma vez que há, sim, muita gente querendo investir. Mas, ao falar disso, ele não deixou passar aquilo que todos sabemos. “O calendário é maluco”, disse, acrescentando ser necessário cuidar da saúde dos jogadores e da economia dos clubes.
O novo sócio do Botafogo lembrou ainda que, para que a estrutura melhore e as rendas aumentem, é preciso, primeiro, fazer crescer o bolo para só depois repartir. Ou seja, as definições de novas porcentagens devem ocorrer apenas quando houver estabilidade nos ganhos. Por ora, as negociações devem acontecer em conjunto, não no estilo cada um por si.
Falando sobre os times locais, ele reconhece, sem pruridos, a superioridade momentânea de Palmeiras, Corinthians, Flamengo e Atlético Mineiro. E não nega que, pessoalmente, achou “chocante” investir, inicialmente, “apenas” entre 65 milhões e 70 milhões de reais, dando prioridade à base, que implica menores valores de transferências.
E já que o assunto é o Botafogo, vale dizer aqui que, em termos de tensão, a partida pouco deixou a desejar em relação ao tão comentado Real Madrid vs. Manchester City, pelas Champions League.
Quem só viu no dia seguinte o resultado da partida, 3 a 1, não pôde imaginar o andamento da partida. O bom time do Fortaleza jogou de igual para igual e tomou a iniciativa na maior parte do jogo, mesmo com um jogador a menos desde o primeiro tempo.
O próprio técnico do time carioca, Luís Castro, reconheceu, honestamente, os erros do Botafogo – que eu, diante do resultado final, cheguei a pensar serem falhas minhas de observação.
As mudanças feitas por Castro ao longo da partida surtiram efeito e fomos bafejados pela sorte depois do gol de falta, que virou o jogo. •
PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1209 DE CARTACAPITAL, EM 25 DE MAIO DE 2022.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “O efeito John Textor”
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.
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