Opinião

O domínio das oligarquias sobre a nação brasileira

Elas propalam a liberdade, mas praticam o cativeiro: sequestram o Estado para seus interesses particulares e manietam os pobres na miséria

Dom Helder Câmara (Foto: Wikimedia)
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“A injustiça é uma só, e indivisível. [É preciso] Atacá-la e obrigá-la a recuar, aqui ou ali, e sempre contribuir para a vitória da justiça entre os homens. E não nos devemos esquecer de que, sendo indiscutivelmente mais insuportáveis a miséria e a exploração no Terceiro Mundo, as raízes profundas do mal se encontram no coração, nos interesses e nas práticas dos países poderosos, com a cumplicidade das classes ricas das nações pobres.”
Dom Hélder Câmara.

O ex-arcebispo de Olinda e Recife conseguiu explicar em poucas palavras como se perpetua a opressão da oligarquia internacional sobre as grandes maiorias oprimidas. Nas últimas décadas, esse mecanismo de geração de injustiça aprofundou-se e acelerou-se, paradoxalmente, como resultado da queda do muro de Berlim, que o capitalismo, habilmente, hegemonizou como vitória da “natural” exploração do homem pelo homem, um destino que seria inexorável, consoante má interpretação do Evolucionismo, de Charles Darwin.

No Brasil, os reflexos dessa paródia não poderiam ser mais nefastos: suas digitais estão por toda parte de nossa tragédia contemporânea, sendo altamente simbólica a manipulação da própria justiça – a Operação Lava Jato – para aprofundar a dominação das oligarquias – internacional e nacional – sobre a nação brasileira.

O desastre socioeconômico e ambiental a que aquela operação nos relegou dificilmente poderia ser mais nefasto: 19 milhões de pessoas em pobreza absoluta; uma centena de milhão em insegurança alimentar; mais de 14 milhões de desempregados e o roubo desbragado, por parte da oligarquia, de bens públicos, sob o apodo singelo de “privatização”.

No campo internacional, o desastre foi ainda maior: passamos de exemplo de inclusão para espectro da própria morte, contando mais de 600 mil de vítimas fatais, por corrupção governamental, de civis e militares, estes convertidos em capitães do mato das oligarquias nacional e internacional. Desse pacto satânico, resultaram 130 mil crianças órfãs, no Brasil.

No campo ambiental, a destruição da Amazônia chegou a tal ponto que a floresta passou de sumidouro de CO2, para emissora de gazes geradores de efeito estufa. Os rios aéreos secaram e o Sudeste vive a pior estiagem da história.

Na Europa, inundações violentas no Norte do continente e secas que levaram aos piores incêndios na Turquia, na Grécia e na África setentrional.

Sim, um golpe de Estado tem consequências, para todos os habitantes do planeta.

Aqui, Bolsonaro continua ameaçando a democracia todos os dias e não são muitos os que acreditam que aceitará os resultados das eleições de 2022. Como dizia São Maximiliano Maria Kolbe, martirizado pelos nazistas aliados nacionais e internacionais de Bolsonaro, “o ódio não cria, só o amor o faz”.

Mas há novidades: no plano simbólico, questiona-se a história oficial, como vimos no episódio da estátua do Borba Gato, e, de certa forma, no patético desfile de tanques/sucata na Esplanada dos Ministérios.

Lembrei-me de um dos poucos museus que havia em Managua na década de 80: nele foram colocados o pedestal da imagem do primeiro Somoza da dinastia de ditadores sangrentos do país (a estátua fora derrubada pelo povo) e uma tanqueta que recebera de presente de Mussolini, a qual mais parecia um FIAT 500, adaptado. Seria ridículo, não fosse o simbolismo de que, entre ditadores, a morte é a linguagem que entendem, sendo nela solidários.

Por isso, os que a ela se opõem chamam-se companheiros, pois, como Dom Hélder nos recorda, “…companheiro, etimologicamente, é quem come o mesmo pão.”

Faz sentido que nos ano dos “companheiros e companheiras” o Brasil tenha tirado 38 milhões de pessoas da pobreza e saído do Mapa da Fome.

Sobre a polêmica ao redor do Borba Gato, o profético Dom Hélder em “Cinco Minutos com Deus”, edição das Paulinas, organizada por Marcos Antônio, já alertava: “A não violência não é de forma alguma uma escolha da fraqueza e da passividade. É crer mais na força da verdade, da justiça e do amor do que nas forças das guerras, das armas e do ódio. A única guerra legítima é aquela que se faz contra o subdesenvolvimento e a miséria. Eu não gosto muito da expressão ‘não violência’. Prefiro mil vezes a expressão de Roger Schutz: ‘A violência dos pacíficos.”

Na vizinha Colômbia – sócia global da OTAN – 60 manifestantes derramaram seu sangue pela liberdade, apenas neste ano, sendo reprimidos pelas forças do aliado da OTAN.

Com efeito, as oligarquias muito propalam a liberdade, mas o que praticam é o cativeiro: sequestram o Estado para seus interesses particulares; manietam os pobres na miséria; literalmente os escravizam e matam os que exploram sem qualquer limite neste estádio do capitalismo, como vemos atualmente no Brasil. Não é à toa que a MP 1045 traz ainda mais entraves à fiscalização do trabalho escravo.

A poeira, no entanto, não há de cegar nossos olhos ou nos causar alucinações pelo medo.

Em Carpe Diem, de Roman Krznaric, encontramos uma boa luz, na citação que o autor traz de Angela Davis, veterana do movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos: “Parece-me que mobilização substituiu organização, de modo que, no momento contemporâneo, quando pensamos em organizar movimentos, pensamos em levar massas de pessoas às ruas…A internet é uma ferramenta incrível, mas ela também nos estimula a pensar que podemos produzir movimentos instantâneos, movimentos que imitam a entrega de fast-food“.

Pessoalmente, pude presenciar isso no Occupy Wall Street, em que, apesar da beleza da manifestação, não houve duração no tempo, pela falta de enraizamento dos participantes em redes mais abrangentes. Lembremos: Cristo pediu aos discípulos que atirassem as redes, não os tanques. As primeiras, recolhem; os segundos, apenas confinam.

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