Opinião

Neste dia dos trabalhadores, como não recordar os três Ts do Papa Francisco?

No reconhecimento da alteridade do outro, nos completamos

Neste dia dos trabalhadores, como não recordar os três Ts do Papa Francisco?
Neste dia dos trabalhadores, como não recordar os três Ts do Papa Francisco?
O papa Francisco. Foto: Filippo MONTEFORTE / AFP
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“Experimentei a sua humanidade extraordinariamente profunda, que não faz concessões acerca da verdade e que atribui um valor infinito a cada ser humano.”
Justin Welby, arcebispo de Canterbury, Primaz da Comunhão Anglicana, a respeito do Papa.

Neste dia das trabalhadoras e dos trabalhadores, como não recordar os três Ts do Papa Francisco para a garantia da mínima dignidade das pessoas que trabalham? Teto, terra e trabalho são de fato imprescindíveis aos direitos humanos de todos.

Vindo do “fim do mundo”, como ele mesmo definiu as origens, Francisco consegue captar o sentimento profundo no sofrer das periferias.

Vai ao encontro dessas dores, verdadeiras cruzes que pesam sobre os ombros de 99% dos habitantes da terra.

Quanto a nós, brasileiros e brasileiras, grande parte de nós, infelizmente, perdemos essa capacidade de ser Cirineu, entender o outro, sentir compaixão e ajudar os que carregam as cruzes mais pesadas.

Não é à toa que tantos confundem até mesmo as expressões “ir ao encontro” e “ir de encontro” sendo ambas antônimos, exatos contrários uma da outra.

Com efeito, na primeira, vamos ao encontro do outro, respeitamos sua posição e alteridade. Na segunda, nos chocamos contra o outro, negamos-lhe a existência, que se afigura um obstáculo em nosso caminho.

Vale notar que esse movimento de retorno do ódio, na política e na vida social, não se restringe ao Brasil.

A guerra na Ucrânia é um sinal trágico da incapacidade de convivência entre vizinhos e irmãos, a qual deixará sequelas que sequer podemos imaginar.

Com efeito, recentemente, a imprensa internacional noticiou a censura feita a relatório dos serviços secretos ingleses, que levantam a possibilidade de que os cidadãos ingleses que participam daquela guerra possa retornar ao Reino Unido ainda mais fanatizados e treinados no manejo de armas e explosivos, combinação das mais explosivas, infeliz e literalmente.

Pior, ao tentar justificar o fracasso da Alemanha como garante dos acordos de paz de Minsk, a ex-chanceler Angela Merkel afirmou que, na União Europeia, só seu país e a França interessaram-se pela paz. Só não disse que foram precisamente essas nações que praticamente anularam a política externa das demais, inclusive da terceira economia do bloco, a Itália, cuja dívida externa, em grande parte graças àqueles mesmos dois países, atingiu 140% do próprio PIB, tornando-se, portanto e evidentemente, impagável.

Nesse sentido, a agência de investimentos Moody’s anunciou que suprimirá o país das análises, uma vez que além da dívida estratosférica acima mencionada a Península cresce a taxas baixíssimas, não apresentando mais qualquer atrativo à inversão externa.

Simples assim: países são desclassificados e suprimidos, como se fossem coisas descartáveis que se usam e jogam fora.

Os que o fazem não se questionam sobre as consequências: em primeiro lugar, o fascismo e o nazismo, crescentes na Europa e em outros continentes, chorume que resulta, atualmente como no passado, da incapacidade daqueles estados em minimamente arbitrarem entre o capital e o trabalho.

Pior, vergonhosamente, a Itália será o único país nessa condição degradante de exclusão da tabela de investimentos da citada agência. O fato de se tratar da terceira maior economia da UE diz muito sobre o êxito daquele modelo de “integração” e quem são os verdadeiros beneficiários dela.

Mas nem tudo são trevas em um mundo em que, apesar das tentativas mortíferas do nazismo, do fascismo e do agronegócio – todos defensores da uniformidade fordista, que não existe sequer entre um fio de cabelo e outro – vemos as diferenças, as identidades, se imporem.

No Brasil, a melhor novidade tem sido o aumento das bancadas negras nas câmaras de vereadores, assembleias legislativas estaduais e no Congresso Nacional.

Nomes como o do deputado Renato Freitas, do PT do Paraná, vão-se tornando nacionalmente conhecidos, extrapolando os limites estaduais e abrindo caminho para que essas lideranças negras possam vir a ocupar os lugares que merecem no Planalto Central.

Isso também vem ocorrendo na Colômbia, nos Estados Unidos e em outros países. Naquelas duas nações, as vice-presidentes já são negras, como se sabe.

Aqui, ainda há muita luta pela frente, mas quando vemos Porto Alegre com cinco vereadores negros, dos quais, quatro mulheres, a esperança renasce, em um mundo mais justo, equilibrado e representativo.

Vale notar que essa é a primeira bancada negra da Câmara de Vereadores de Porto Alegre, que se iniciou com cinco membros, todos progressivos!

Mais ainda, trata-se de colegiado em que a “fina flor” do fascismo está amplamente presente, o que torna ainda mais épica a jornada daquela bancada negra, humanista.

Com efeito, se alguém tinha dúvida de que foram as mulheres; os negros e negras; e os povos originários que nos salvaram do holocausto fascista, as últimas eleições eliminaram qualquer hesitação a respeito.

Por fim, se é verdade que somos todos diversos, mais verdade ainda é que somos todos incompletos, requerendo cuidado, carinho e afeto uns dos outros.

No reconhecimento da alteridade do outro, nos completamos. No amor, pelo semelhante ou por Deus – a mais alta alteridade ara os que creem – nos tornamos verdadeiramente plenos

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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