Jaques Wagner

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Senador (PT-BA). Foi governador da Bahia (2007-2015) e ministro do Trabalho (2003-2004), Defesa (2015) e Casa Civil (2015-2016).

Opinião

Não há mais como adiar a adoção de políticas para evitar a catástrofe climática

A natureza está respondendo com pandemia e resistência das bactérias aos antibióticos

Parte da floresta amazônica desmatada. Foto: Carlos Fabal/AFP
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Diante de uma emergência climática, é fundamental termos a ciência como base ao elaborar leis no Congresso Nacional ou ao estruturar políticas públicas nos governos. Sobram evidências para agirmos diante do desafio das próximas gerações. Na última semana de fevereiro, o IPCC (Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas da ONU), que conta com cientistas do mundo todo, publicou seu mais novo relatório sobre o nível de alerta diante do aquecimento global.

A má notícia: a janela de ação para evitarmos mais catástrofes ambientais, como as que vimos na Bahia, Minas Gerais e Petrópolis neste ano, está cada vez menor. Se não agirmos rapidamente, dificilmente impediremos os desastres provocados pela crise climática. A boa notícia: sabemos cientificamente como agir, a questão agora é tomar a decisão política para construir os caminhos capazes de transformar este desafio num plano para a prosperidade.

O relatório do IPCC indica que há ao menos mais de 50% de probabilidade de o aquecimento global atingir ou exceder 1,5°C no curto prazo, mesmo num cenário de emissões de gases de efeito estufa muito baixas. É um grande alerta, pois significa que o mundo praticamente extrapolou sua meta inicial do Acordo de Paris, em 2015.

O documento aponta não apenas para estragos cada vez maiores, mas também para efeitos negativos à saúde física e mental das pessoas em todo o mundo. Além disso, danos econômicos são observados em setores como agricultura, silvicultura, pesca, energia e turismo. O relatório mostra que mais de 3 bilhões de seres humanos vivem em áreas com riscos climáticos, contribuindo para crises humanitárias, em regiões como África e América do Sul. Na América do Sul, especificamente, são esperados riscos de segurança hídrica, riscos severos à saúde em razão do aumento de epidemias, degradação dos recifes de corais, risco de insegurança alimentar devido às secas extremas, além de enchentes, deslizamentos, subida do nível do mar e tempestades repentinas. Com isso, os custos de manutenção e reconstrução da infraestrutura urbana, incluindo obras, transporte e energia, aumentarão com o avanço do aquecimento global.

O IPCC aponta para riscos graves depois de 2040, como cerca de 39% das espécies do planeta enfrentando a extinção caso o aquecimento global passe de 4°C. A natureza está respondendo com pandemia e resistência das bactérias aos antibióticos. Uma corrida do mal. Vão inventando, a praga vai resistindo e fica claro que essa metodologia não funciona.

Diante de um aquecimento de 2°C, a disponibilidade de água para agricultura cairia 13%, e os danos com inundações seriam praticamente quatro vezes maiores do que vemos hoje. No Nordeste, há desertificação em várias áreas e redução da produtividade do agronegócio por conta do processo ensandecido de violência contra o equilíbrio ambiental.

A conclusão do relatório segue a mesma direção do que temos trabalhado na Comissão de Meio Ambiente do Senado e conversado nesta coluna há meses: é preciso estabelecer um robusto Plano de Transição Ecológica Nacional para transformar o Brasil numa Potência Verde, que irá gerar empregos com bons salários, ao passo que protegerá nossos biomas e nossa biodiversidade. Insisto que não é contraditório produzir e preservar. Temos inteligência suficiente para isso. Infelizmente, os imediatistas querem produzir sem olhar para nada mais a não ser para a conta bancária.

A Transição Ecológica, necessária e urgente, consolidará um novo modelo de ­desenvolvimento resiliente ao clima. E faremos isso por meio da cooperação internacional e de governos capazes de dialogar com a sociedade, instituições científicas, organizações ambientais, comunidades indígenas, mídia, investidores e empresas.

São extremamente bem-vindas iniciativas como o “Ato Pela Terra”, que reuniu, em Brasília, artistas e organizações para sensibilizar toda a classe política e a sociedade sobre a importância de defendermos o nosso planeta. O evento se manifestou contra um conjunto de propostas legislativas, em tramitação no Congresso, que abrem caminho para o aumento do desmatamento, invasão de terras indígenas, farra de agrotóxicos, entre outros crimes. Essas mobilizações organizadas pela classe artística e por movimentos sociais concretizam um caráter suprapartidário que só fortalece essa causa e desperta a atenção para um problema que é de todos nós.

Por fim, um último aviso do IPCC: a evidência científica é certeira em apontar que as mudanças climáticas representam uma ameaça ao bem-estar humano e à saúde do planeta. Qualquer atraso adicional diante desse desafio nos fará perder uma breve janela de oportunidade para garantir um futuro habitável e sustentável para todos. O fato é que sabemos qual caminho devemos traçar. Agora é hora de agir. •

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1199 DE CARTACAPITAL, EM 16 DE MARÇO DE 2022.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “Hora de agir”

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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