Alberto Villas

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Jornalista e escritor, edita a newsletter 'O Sol' e está escrevendo o livro 'O ano em que você nasceu'

Opinião

Minha retrospectiva

Algumas coisas que aconteceram em 2018, mas que acabaram caindo no esquecimento

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Não, a minha retrospectiva não é aquela que vai lembrar que Lula foi preso, que Bolsonaro ganhou as eleições, que Suplicy não foi eleito, que Aécio não foi pra cadeia, que o Fora Temer não colou, que o Superior Tribunal de Justiça virou a Casa da Mãe Joana e que um ator pornô virou Deputado Federal.

Não é aquela retrospectiva que vai lembrar que os tucanos continuaram em cima do muro, que Suzane von Richthofen pôde sair da cadeia no dia dos pais, que um cabo sonhou ser presidente da República com a glória de Deux, nem mesmo que Jesus Cristo foi visto em cima de uma goiabeira.

Não quero lembrar de tristezas, que perdemos Mort Walker, Marielle, Dona Ivone Lara, Nelson Pereira dos Santos, Philip Roth, Cláudio Weber Abramo, Aretha Franklin, Ângela Maria, Charles Aznavour, Kofi Annan e tantos outros.

Não vou lembrar do apuro dos doze meninos do Javalis Selvagens Futebol Clube presos dentro da gruta Tham Luang Nang Non, na Tailândia, do teatro de Neymar em campo, da seleção brasileira voltando de Moscou, da multidão no Largo da Batata gritando Ele Não, porque ele sim, venceu. 

Vou lembrar aqui apenas algumas notinhas que passaram às vezes desapercebidas nos cantos das páginas dos jornais ou nem mesmo apareceram por lá. Vejamos.  

Leia também: 2018, o ano em que os negros entraram em pauta nas artes

Nos primeiros dias do ano, a revista científica PNAS revelou ao mundo que especialistas canadenses descobriram, por acaso, que as aves Leplidothrix vilasboasi, que foram avistadas pela primeira vez em 1957, são as primeiras aves híbridas do mundo.

O Papa Francisco foi ao Chile e se encontrou com os índios Mapuche, que vivem na região de Temuco, terra de embates entre silvícolas e multinacionais. No final do encontro, Francisco pediu paz na terra aos homens de boa vontade.

O turco Sultan Kosen, com 2 metros e 46 centímetros de altura, considerado o maior homem do mundo, teve um encontro com a indiana, Jyoti Amge, que mede 62, 8 centímetros, a mulher mais baixa do planeta. O encontro foi a lado da pirâmide de Gizé, no Egito, que tem 20,22 metros de altura.

Um funcionário da loja Choix, nos Jardins, em São Paulo, abordou três jovens negros que estavam na calçada, dizendo que havia sumido um sabonete no banheiro da loja. Três dias depois, o funcionário foi demitido. 

Leia também: O mundo em 2018: o enfraquecimento do Ocidente

O americano Randall Margraves, pai de três meninas que foram abusadas sexualmente pelo ex-médico Larry Nassar, deu um soco na cara do ex-doutor durante uma audiência no Tribunal de Justiça de Michigan. 

Preocupado com a obesidade infantil no país, o governo do Chile proibiu a imagem do famoso tigre nas embalagens do Kellogg’s.

Uma cachorra chamada Lima foi inscrita pelo jornal alemão Bild, como eleitora para votar, pelo correio, em uma consulta entre os militantes do Partido Social Democrata, o SPD.

O falcão Rufus the Harris, treinado para espantar os pombos das quadras de tênis do Aberto de Wimbledon, virou uma atração em Londres e ganhou uma borrifação diária de água fresca para amenizar o calor britânico durante os jogos. 

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O cartunista argentino Quino, vetou o uso de sua personagem mais famosa – a Mafalda – uma menina porreta, numa campanha contra o aborto.

Agricultores de São Paulo se irritaram com o governo do Estado que proibiu a caça do javali e do híbrido, o javaporco. Os bichos continuaram se disseminando pelo estado e destruindo a plantação.

O botânico Ricardo Cardim encontrou, na reserva Legados das Águas, a 90 quilômetros de São Paulo, uma figueira, considerada uma das maiores árvores da Mata Atlântica. 

O marinheiro Popeye, famoso por seu cachimbo no canto da boca, cedeu ao politicamente correto e substituiu o cachimbo por um apito. 

Já pro finalzinho do ano, foi desfeito um dos maiores mistérios da pintura. Foi Constance Quénioux, uma bailarina da Ópera de Paris, quem posou para o francês Gustav Courbet pintar o quadro A origem do mundo. 

O jornal Folha de S.Paulo publicou, no início de dezembro, um Erramos que mudou o rumo da história: 

Diferentemente do publicado na reportagem “A novidade veio dar à praia”, de Luís Antônio Giron, a recém-lançada tradução de Christian Werner dos poemas “Ilíada” e “Odisseia”, pela editora Ubu, é um verso livro, não em decassílabos. Homero tampouco escreveu em pentâmetro jâmbico, como informou a reportagem, mas em hexâmetro dactílico. Por fim, Haroldo de Campos lançou em 2002 sua tradução de “Ilíada”, e não de “Odisséia”. 

Não, eu não quero lembrar que em 2018 fez cinquenta anos que o Ato Institucional número 5 foi assinado, que o estudante Edson Luís levou dois tiros no peito na porta do Restaurante Calabouço, no Rio, e que Caetano e Gil foram presos e mandados pro exílio em Londres.

Não, eu não quero lembrar que naquele ano que está fazendo cinquenta anos, o Comando de Caça aos Comunistas invadiu o Teatro Ruth Escobar, em São Paulo, e espancou os atores de Roda Viva, que o líder negro Martin Luther King foi assassinado na varanda de um hotel em Memphis, que a primavera de 1968 foi em Praga e que a de 2018, aqui no Brasil, não teve flores.  

[O cronista sai de férias, retornando no dia 11 de janeiro]

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