Antonia Quintão

Presidente do Geledés – Instituto da Mulher Negra, pós-Doutora pela Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo. Também é pesquisadora no Centro de Estudos Internacionais do Instituto Universitário de Lisboa e consultora de Diversidade e Inclusão nas Organizações.

Opinião

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Migrantes e refugiados

Acolhimento, inclusão e integração exigem esforços de toda a sociedade

Migrantes e refugiados
Migrantes e refugiados
Refugiados não ucranianos tentam, com dificuldades, entrar na Polônia. Foto: Wojtek RADWANSKI / AFP
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O saudoso professor Milton Santos, nos seus estudos sobre globalização, alertava para o fato de que, se o processo tinha a capacidade de aproximar povos e culturas distantes, poderia, por outro lado, fazer reaparecer movimentos de xenofobia e de racismo aparentemente eliminados.

Infelizmente, suas previsões se confirmaram. Refugiados, imigrantes, aqueles em deslocamento colecionam frequentemente relatos e denúncias de violências que se manifestam de diversas maneiras. A violência cotidiana da intolerância, das ofensas gratuitas, do desemprego, da falta de oportunidade, da exclusão, das agressões psicológicas e físicas e até os assassinatos e linchamentos, que envergonham aqueles capazes de reconhecer a humanidade intrínseca em cada ser humano.

A questão dos refugiados no mundo ganha contornos cada vez mais dramáticos. Além dos graves problemas nas suas ­áreas de origem, ainda existem aqueles enfrentados nos locais para onde se deslocam. Entre esses problemas, destacam-se as diferenças culturais, as dificuldades com idiomas, a busca por emprego e, principalmente, a xenofobia praticada pela população residente nas áreas de destino.

O Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) criou um site para os solicitantes de refúgio no Brasil encontrarem informações confiáveis e úteis. Os dados divulgados pelo Acnur revelam que o número de refugiados tem aumentado sistematicamente. “Por 12 anos consecutivos, houve aumentos dos números globais de deslocamento forçado. No ano passado, atingiu níveis históricos em todo o mundo, chegando a 120 milhões de pessoas, de acordo com dados de maio de 2024.”

Cabe destacar o relevante papel desempenhado pelo Programa de Apoio para a Recolocação dos Refugiados – PARR, criado em outubro de 2011 pela Endoc, consultoria especializada em imigração, com o apoio do Acnur e do Centro de Referência para Refugiados da Cáritas Arquidiocesana de São Paulo, com o objetivo de sensibilizar a sociedade e, principalmente, o empresariado para a assimilação da capacidade que refugiados e solicitantes de refúgio têm de contribuir para a economia do Brasil.

O PARR possui um dos maiores bancos de dados eletrônicos do País exclusivamente sobre os refugiados e as informações coletadas contêm dados essenciais para um mapeamento detalhado do perfil pessoal, acadêmico e profissional desse público, com o objetivo de melhor inseri-lo no mercado de trabalho. Os registros do programa incluem ainda dados específicos sobre empresas mais sensibilizadas com a causa e dispostas a receber os candidatos, além de informações sobre as vagas oferecidas.

Muitos são profissionais extremamente qualificados, competentes e talentosos, mas, por serem refugiados, acabam por se tornar invisíveis para a sociedade. Para aqueles que se interessam pelo tema, sugiro uma visita ao ­site ­talentosinvisiveis.com.br, que busca apresentar as qualificações daqueles que pretendem construir uma vida nova no Brasil, ou conforme informação do site:

“Ao representar a diversidade da população refugiada que vive no Brasil e seu potencial em contribuir para o desenvolvimento do País, a campanha Talentos Invisíveis dá destaque às suas capacidades e combate os estereótipos por vezes associados às pessoas em situação de refúgio. A intenção é disseminar a mensagem de que dar oportunidade às pessoas refugiadas fomenta a diversidade e inovação nas empresas, além de ser uma ferramenta importante na integração social e econômica dessa população”. O perfil dos Talentos Invisíveis pode torná-los visíveis para o mercado de trabalho

Outra iniciativa interessante: algumas universidades oferecem vagas para refugiados, a partir de formulário de solicitação na diretoria acadêmica. É obrigatório ter o status de refugiado reconhecido e validado pelo Comitê Nacional Brasileiro para os Refugiados no momento da solicitação, ter o ensino médio completo e apresentar as documentações exigidas. Comissões internas avaliam as referidas solicitações de vaga.

Temos o desafio de formar e educar os estudantes e a sociedade para o respeito às diferenças culturais, a diversidade e para o exercício da cidadania. A Lei 13.445, de 2017, tem como princípios a universalidade dos direitos humanos, o repúdio e a prevenção à xenofobia, ao racismo e a qualquer tipo de discriminação, não criminalizando a migração. Garante a igualdade de tratamento e de oportunidade ao migrante, além de inclusão social, laboral e produtiva por meio de políticas públicas. Temos a lei.  Precisamos agora exigir e garantir que ela seja cumprida. •

Publicado na edição n° 1316 de CartaCapital, em 26 de junho de 2024.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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