Paulo Nogueira Batista Jr.

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Economista. Foi vice-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento, estabelecido pelos BRICS em Xangai, e diretor-executivo no FMI pelo Brasil e mais dez países

Opinião

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Metas fiscais? E as sociais?

O governo deveria mobilizar especialistas para selecionar indicadores que balizariam metas sociais anuais

O presidente Lula em café com jornalistas em 6 de abril. Foto: Evaristo Sá/AFP
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O Brasil tem metas para a inflação desde 1999. Acabamos de lançar metas para o resultado primário das contas públicas. Por que não teríamos, também, metas sociais? Por que só metas monetárias e fiscais? Eis a pergunta que não quer calar.

Se dependesse do mercado financeiro e dos economistas da mídia corporativa, os objetivos sociais, aceitos retoricamente como “importantes”, “relevantes”, “essenciais”, seriam estabelecidos de forma bem genérica, flexível e vaga. Em contraste com os monetários e fiscais, especificados com cuidado, detalhes e rigor, especialmente os fiscais. Na ausência dessas especificações não haverá confiança na política econômica, asseguram os economistas ortodoxos, com ampla ressonância midiática. Já os objetivos sociais, vistos na prática como menos relevantes, podem ficar na esfera do meramente vago.

Desde janeiro de 2023, o Brasil tem um governo declaradamente reformista, comprometido, tudo indica, com a distribuição da renda e o combate à fome e à miséria. Rosnando volta e meia, a Faria Lima observa com inquietação os movimentos de mudança esboçados por Brasília. Opera na mídia, por um lado, e nos bastidores do Executivo e do Congresso, por outro, para obstruir tentativas de fazer um pouco de justiça social.

Percebe-se, porém, que Lula não desistiu. Quer porque quer colocar o pobre no orçamento e, além disso, o rico no Imposto de Renda. Naturalíssima essa insistência. O Brasil, como sabemos, é um dos países com renda e riqueza mais concentradas no mundo. Uma grande parte da população vive na pobreza, passa fome, não tem acesso adequado a serviços básicos como educação, saúde e saneamento. Enquanto isso, os bilionários embolsam juros pornográficos e escapam da tributação.

Se Lula não lutar até a morte para superar esse quadro de pobreza e injustiça, terá patrocinado um dos maiores estelionatos da história. Mas digo com toda tranquilidade, leitor ou leitora: é visível que o presidente da República está determinado a honrar seus compromissos de campanha. Não só as promessas de 2022, mas a história de uma vida inteira.

E ele tem pressa, pois sabe, como político experimentado, que o tempo corre contra o governo e a favor das forças da inércia e do status quo. Metas sociais seriam, a meu ver, úteis para dar foco à ação do governo. Não faltam dados da área social no Brasil. É viável, acredito, usar estatísticas conhecidas e confiáveis para construir metas quantitativas específicas, a serem alcançadas em prazos predeterminados.

A busca da responsabilidade social já começou. O governo, desde janeiro, tem tomado medidas pontuais para distribuir renda: a volta da política de valorização do salário mínimo, o aumento do limite de isenção para Imposto de Renda na fonte, a retomada do Bolsa Família, entre outras.

Será que esse esforço não se beneficiaria da definição e do anúncio de metas sociais quantitativas? Metas que o governo se proporia a cumprir ao longo do seu mandato, ano a ano, de 2023 a 2026? Não haveria maior dificuldade de mobilizar especialistas para selecionar criteriosamente um conjunto de indicadores que balizariam as metas sociais anuais do governo. Por exemplo, a quantidade de pessoas ou famílias com renda inferior à das linhas de pobreza e miséria, o número de domicílios sofrendo de insuficiência alimentar, índices de escolaridade ou alfabetização, indicadores de acesso à saúde e saneamento básico, indicadores de distribuição de renda etc.

Essas metas não seriam de um ministério, mas do governo no seu conjunto. O seu anúncio, após cuidadosa discussão, pública e aberta, deveria ser feito pelo próprio presidente da República, com a pompa e circunstância que o assunto merece.

O anúncio, no mais alto nível, de um conjunto de metas previamente discutido e elaborado com o auxílio dos melhores especialistas ajudará a que todos os setores relevantes do governo, em colaboração com entidades da sociedade, se engajem nesta guerra contra a fome, a pobreza e a injustiça.

Como tem repetido o presidente Lula, esta é a única guerra de que nos interessa participar. É preciso lutá-la com garra, determinação incansável, sangue nos olhos. Metas sociais ajudarão a vencê-la. •

Publicado na edição n° 1262 de CartaCapital, em 07 de junho de 2023.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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