Randolfe Rodrigues
[email protected]É senador pela Rede/AP, professor, graduado em História, bacharel em Direito e mestre em Políticas Públicas.
Participação do governo brasileiro foi vergonhosa: ministro Ricardo Salles tentou, em vão, extorquir os países ricos
O futuro do nosso planeta e das milhares de espécies que aqui coexistem foi o tema central da Conferência da ONU sobre Mudança do Clima, a COP 25, que aconteceu nas duas primeiras semanas de dezembro. O objetivo era garantir compromissos dos países para deter o aquecimento do planeta para além dos 1,5ºC. O fracasso produzirá graves danos à economia, deslocamentos de milhões de refugiados climáticos e a extinção de milhares de espécies, desequilibrando a vida na Terra em um cenário apocalíptico difícil de compreendermos em sua plenitude.
Foi a primeira conferência após o surgimento das greves de jovens pelo clima, inspirados pela ativista sueca Greta Thunberg. A palavra de ordem era de um compromisso intergeracional e de solidariedade com os povos indígenas e com os mais pobres, que serão mais afetados pelas mudanças climáticas. Não faltaram propostas para enfrentarmos a crise e promovermos uma economia de baixo carbono. Entretanto, poucos foram os países que se sensibilizaram com as vozes das ruas e da ciência. O que presenciei foi uma teimosia em manter o modelo de desenvolvimento que criou a crise climática e os inaceitáveis padrões de desigualdade social.
A participação do governo brasileiro na COP foi vergonhosa. O Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles tentou, em vão, extorquir os países ricos. Sem oferecer nenhuma explicação para justificar o aumento de 30% no desmatamento da Amazônia em seu primeiro ano de gestão, o governo Bolsonaro transformou a COP num balcão de chantagem. Não existe outro adjetivo possível. Condicionar a redução das emissões e o combate à destruição da Amazônia ao recebimento de dinheiro é inadmissível. Agiram como fazem os sequestradores. Sem pagamento, morte da Amazônia!
A postura irresponsável e imoral do governo brasileiro, somada à criminosa saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris anunciada pelo governo Trump, foram decisivas para o fracasso das negociações sobre a regulamentação do mercado de carbono e outros mecanismos de cooperação entre países. Perdemos mais um ano para gerar um mecanismo financeiro de estímulo à redução de emissões de CO2.
A participação brasileira só não foi uma tragédia completa devido ao empenho dos parlamentares e da sociedade civil. Conquistamos o compromisso do presidente do Senado em não permitir retrocessos na legislação ambiental. Articulamos agendas paralelas entre os parlamentares e governadores dos estados da Amazônia com as delegações da França, Noruega e Alemanha, apresentando uma alternativa ao Fundo Amazônia, paralisado pelos desmandos do Governo Bolsonaro. Assim, esperamos garantir a continuidade de programas de preservação, manutenção e exploração sustentável das nossas riquezas naturais.
O quadro internacional é dramático e, no Brasil, é desesperador. O mundo caminha para uma economia cada vez menos dependente do petróleo e mais ligada às tecnologias limpas. O Brasil está na contramão. Nossa agropecuária corre o risco de sofrer sanções comerciais internacionais por conta do desmatamento da Amazônia, que ironicamente é a principal responsável pelas chuvas que irrigam as safras no Sudeste do Brasil. Sem a preservação ambiental, não há desenvolvimento econômico que se sustente. É preciso união e ação contra a emergência climática. Não temos mais tempo a perder.
Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.
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