Paulo Artaxo

Cientistas e pesquisador do Centro de Estudos Amazônia Sustentável da USP.

Opinião

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Lição de casa

O presidente da COP30 encomendou aos setores mais poluentes do Brasil um plano de redução das emissões de CO2

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Concentração dos três principais gases do efeito estufa atingiu novos recordes.
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O Brasil está empenhado em fazer a lição de casa e iniciou um “mutirão pelo clima”, cujos resultados serão apresentados na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. O diplomata André Corrêa do Lago, presidente da COP30, solicitou aos representantes dos setores mais intensivos em carbono do Brasil um plano de transição, com soluções para acelerar a redução das emissões. Esse tipo de articulação não faz parte da agenda oficial de negociações da conferência. As propostas e compromissos são de adesão voluntária.

A iniciativa é louvável e necessária, uma vez que alguns ministérios e áreas estratégicas do governo não se movem na agenda da COP30. Os setores envolvidos são os de transportes, agricultura, energia, florestas e pecuária, responsáveis pela ampla maioria de emissões brasileiras de CO2 equivalente.

A devastação dos biomas é responsável por 48% das emissões brutas do Brasil. Nesse quesito, temos algo a celebrar. O desmatamento da Amazônia teve uma redução de 31% de agosto de 2023 a julho de 2024, segundo estimativa do sistema Prodes, do Inpe. Ao comparar os índices de 2021 e 2024, identificamos uma queda na devastação na floresta de 52%, valor muito expressivo.

No entanto, os dados do Inpe também revelam aumento do desmatamento no Cerrado, o que certamente preocupa. O Pantanal também tem sofrido com um processo desordenado de ocupação, com fortes secas que levaram a queimadas muito intensas nos últimos anos. Fundamental implementar um plano de recuperação ecológica nas áreas desmatadas ou degradadas. Da mesma forma, é preciso regularizar a situação das florestas públicas não destinadas. Como elas não possuem proteção específica, essas áreas estão muito mais vulneráveis a atividades ilegais, como desmatamento, extração de madeira e grilagem de terras.

Responsável por 16% das emissões brasileiras, o setor de transportes apresentou, na segunda-feira 12, seu plano de descarbonização. O estudo entregue faz um diagnóstico de onde o setor está hoje e quais são as iniciativas prioritárias para reduzir as emissões em 70% até 2050. O documento reconhece que muitas ações dependem do governo, bem como incentivos e do mercado regulado de carbono. O grupo trabalha com seis frentes para acelerar a transição para um sistema de transporte mais limpo: infraestrutura e interseccionalidades; mobilidade urbana; transporte rodoviário, transporte ferroviário; transporte aéreo e transporte aquaviário e cabotagem. Cada um desses setores tem particularidades importantes.

Atividade econômica mais poluidora do País, o agronegócio é responsável por cerca de 30% das emissões brasileiras, mas também busca criar uma estratégia de descarbonização. Foram identificadas três principais lacunas de transição para o setor: financiamento, métricas viáveis e políticas públicas.

Financiamento adequado para pequenos e médios produtores é um dos desafios. As métricas de emissões são outra questão importante, pois as atuais foram desenvolvidas para países de clima temperado, não adequadas à nossa agricultura. A terceira brecha está na falta de políticas públicas de escala para incentivar a adoção de práticas mais sustentáveis de produção, como a integração floresta–lavoura–pecuária. A pecuária, em particular, está trabalhando na melhora da qualidade das pastagens para reduzir suas emissões de metano. Já a Embrapa e várias instituições de pesquisas estão avançando com o plano de agricultura de baixo carbono, inclusive por meio do sequestro de carbono no solo.

No setor de energia, o debate da descarbonização é mais espinhoso. Apesar do nosso gigantesco potencial de geração limpa e sustentável, por meio de fontes eólicas e solares, o lobby da indústria do petróleo tem prevalecido. Na verdade, o Ministério de Minas e Energia defende a exploração das bacias petrolíferas brasileiras até a última gota. Em 20 anos, a produção diária mais que dobrou no País: passou de 1,6 milhão de barris, em 2005, para 3,4 milhões em 2024, segundo a Agência Nacional do Petróleo, a ANP. O crescimento colocou o Brasil entre os dez maiores produtores do mundo. No ano passado, essa commodity mineral liderou as exportações do País pela primeira vez, ultrapassando a soja.

É fundamental uma boa integração entre a iniciativa privada e o Poder Público, em todas as esferas: União, estados e municípios. O Plano Clima, do governo federal, é um guia para as ações de combate às mudanças climáticas no País, estabelecendo metas e diretrizes para a mitigação e adaptação. É um importante instrumento para o Brasil enfrentar as emergências climáticas e construir um futuro mais sustentável, com baixas emissões de carbono. •

Publicado na edição n° 1362 de CartaCapital, em 21 de maio de 2025.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Lição de casa’

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

Lição de Casa|

O Brasil está empenhado em fazer a lição de casa e iniciou um “mutirão pelo clima”, cujos resultados serão apresentados na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. O diplomata André Corrêa do Lago, presidente da COP30, solicitou aos representantes dos setores mais intensivos em carbono do Brasil um plano de transição, com soluções para acelerar a redução das emissões. Esse tipo de articulação não faz parte da agenda oficial de negociações da conferência. As propostas e compromissos são de adesão voluntária.

A iniciativa é louvável e necessária, uma vez que alguns ministérios e áreas estratégicas do governo não se movem na agenda da COP30. Os setores envolvidos são os de transportes, agricultura, energia, florestas e pecuária, responsáveis pela ampla maioria de emissões brasileiras de CO2 equivalente.

A devastação dos biomas é responsável por 48% das emissões brutas do Brasil. Nesse quesito, temos algo a celebrar. O desmatamento da Amazônia teve uma redução de 31% de agosto de 2023 a julho de 2024, segundo estimativa do sistema Prodes, do Inpe. Ao comparar os índices de 2021 e 2024, identificamos uma queda na devastação na floresta de 52%, valor muito expressivo.

No entanto, os dados do Inpe também revelam aumento do desmatamento no Cerrado, o que certamente preocupa. O Pantanal também tem sofrido com um processo desordenado de ocupação, com fortes secas que levaram a queimadas muito intensas nos últimos anos. Fundamental implementar um plano de recuperação ecológica nas áreas desmatadas ou degradadas. Da mesma forma, é preciso regularizar a situação das florestas públicas não destinadas. Como elas não possuem proteção específica, essas áreas estão muito mais vulneráveis a atividades ilegais, como desmatamento, extração de madeira e grilagem de terras.

Responsável por 16% das emissões brasileiras, o setor de transportes apresentou, na segunda-feira 12, seu plano de descarbonização. O estudo entregue faz um diagnóstico de onde o setor está hoje e quais são as iniciativas prioritárias para reduzir as emissões em 70% até 2050. O documento reconhece que muitas ações dependem do governo, bem como incentivos e do mercado regulado de carbono. O grupo trabalha com seis frentes para acelerar a transição para um sistema de transporte mais limpo: infraestrutura e interseccionalidades; mobilidade urbana; transporte rodoviário, transporte ferroviário; transporte aéreo e transporte aquaviário e cabotagem. Cada um desses setores tem particularidades importantes.

Atividade econômica mais poluidora do País, o agronegócio é responsável por cerca de 30% das emissões brasileiras, mas também busca criar uma estratégia de descarbonização. Foram identificadas três principais lacunas de transição para o setor: financiamento, métricas viáveis e políticas públicas.

Financiamento adequado para pequenos e médios produtores é um dos desafios. As métricas de emissões são outra questão importante, pois as atuais foram desenvolvidas para países de clima temperado, não adequadas à nossa agricultura. A terceira brecha está na falta de políticas públicas de escala para incentivar a adoção de práticas mais sustentáveis de produção, como a integração floresta–lavoura–pecuária. A pecuária, em particular, está trabalhando na melhora da qualidade das pastagens para reduzir suas emissões de metano. Já a Embrapa e várias instituições de pesquisas estão avançando com o plano de agricultura de baixo carbono, inclusive por meio do sequestro de carbono no solo.

No setor de energia, o debate da descarbonização é mais espinhoso. Apesar do nosso gigantesco potencial de geração limpa e sustentável, por meio de fontes eólicas e solares, o lobby da indústria do petróleo tem prevalecido. Na verdade, o Ministério de Minas e Energia defende a exploração das bacias petrolíferas brasileiras até a última gota. Em 20 anos, a produção diária mais que dobrou no País: passou de 1,6 milhão de barris, em 2005, para 3,4 milhões em 2024, segundo a Agência Nacional do Petróleo, a ANP. O crescimento colocou o Brasil entre os dez maiores produtores do mundo. No ano passado, essa commodity mineral liderou as exportações do País pela primeira vez, ultrapassando a soja.

É fundamental uma boa integração entre a iniciativa privada e o Poder Público, em todas as esferas: União, estados e municípios. O Plano Clima, do governo federal, é um guia para as ações de combate às mudanças climáticas no País, estabelecendo metas e diretrizes para a mitigação e adaptação. É um importante instrumento para o Brasil enfrentar as emergências climáticas e construir um futuro mais sustentável, com baixas emissões de carbono. •

Publicado na edição n° 1362 de CartaCapital, em 21 de maio de 2025.

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