Juçara Marçal protagoniza a ruptura em várias frentes

Cantora, e agora atriz, solidifica carreira rompendo padrões artísticos

(Foto: José de Holanda)

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Suas iniciativas envolvem show com o repertório da Brigitte Fontaine, trabalho com o grupo Metá Metá, o projeto Sambas do Absurdo e ainda seu álbum solo. Nesse meio, entra seu primeiro papel de atriz, na pele de Joana, na peça Gota D’água {Preta}, que estreou em fevereiro. Em comum entre as atividades está a ruptura na arte. Todos protagonizados pela cantora de timbre e afinação irretocável Juçara Marçal.

Brigitte Fontaine é sinônimo de vanguarda, com um repertório absolutamente inovador. “Resolvi fazer o show para experimentar as liberdades que ela exerceu em suas canções e arranjos e também para me desafiar a cantar em outra língua”, diz sobre as apresentações em torno da cantora e escritora francesa, já em cartaz há alguns meses.

O Metá Metá, grupo que integra ao lado de Kiko Dinucci e Thiago França, é o avesso da música brasileira de rótulo. O primeiro disco do intitulado Sambas do Absurdo, lançado em 2017, de Juçara, Gui Amabis e Rodrigo Campos, é inspirado em O Mito de Sísifo, de Albert Camus, obra inquieta em busca de um sentido à vida em meio a irracionalidade.

Um segundo volume desse projeto, segundo Juçara, pode não ser impulsionado pela obra de Camus, mas por certo terá o escritor humanista e libertário como referência.

Gota D’água {Preta}

A sua estreia como atriz se deu com a releitura de Gota D’água, de Chico Buarque e Paulo Pontes, com um elenco predominantemente negro.


“Esse trabalho tem sido uma experiência nova e muito intensa. O fato de ter sido justamente como a Joana (a narrativa gira em torno da vida sofrida desta mulher abandonada pelo marido) faz toda a diferença”.

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A artista ressalta a excepcional montagem de Jé Oliveira, que também atua na peça, como “potente, artística e política”. A obra que segue em temporada pelo país sublinha a condição do negro na tragédia social brasileira.

“O principal desafio é justamente a atuação. Encarnar uma personagem. Essa personagem: Joana. Quando canto, cada canção traz de certa forma uma personagem a ser incorporada. Mas numa peça teatral, esse encarnar é muito mais denso, muito mais complexo”, analisa.

Ao justificar a escolha de Juçara Marçal para o papel principal – aliás, interpretado com louvor -, o diretor Jé Oliveira chegou a apontá-la como a voz negra feminina mais representativa do país depois de Elza Soares.

Álbum novo

Sobre seu disco solo, ela está ao lado de Kiko Dinucci na empreitada. “Usamos samples (reprodução de sons), riffs (frases musicais), entre outros elementos, para elaborar as bases. Em cima dessas bases, vamos compondo, e chamando amigos músicos para compor algumas parcerias também”.

O processo de gravação desse seu segundo álbum solo – o primeiro foi o elogiado Encarnado (2014) – tem sido mais lento por que, segundo ela, justamente a produção das bases leva tempo.

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“Tenho que lidar com a ansiedade, em relação ao disco novo. Ansiedade que é minha e das pessoas a volta, que sempre perguntam sobre ele. E eu respondo: está vindo, mas vai demorar”.

Procurar por possibilidades

A cantora e compositora explica que em seus trabalhos não existe preocupação de fazer sempre algo novo.

“Mas existe essa vontade natural de mexer nas estruturas de tudo que já está dado e ver se tem outro jeito de fazer, se pode isso, se pode aquilo, se dá certo assim, assado, cozido, cru… E se a gente fizesse assim?”

Diz não se preocupar com possível acerto. “É acima de tudo a busca por algo que me abale as estruturas, independentemente do que as expectativas ditam”.


Ela segue: “Não tem como fazer um trabalho, qualquer que seja, que não tenha sempre algo a ver com o que veio antes. Mas ao mesmo tempo, a coisa que mais curto fazer é procurar outras possibilidades. Quase não sei fazer de outro jeito”.

A artista Juçara Marçal persegue o caminho do rompimento da arte. Um vento forte e talentoso nesses tempos sombrios de sufocamento cultural.

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