Brenno Tardelli

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Editor de Justiça e Pluralidade no site de CartaCapital. Mestrando em Direito pela USP-Ribeirão Preto. Advogado.

Opinião

Indenizações por abusos policiais são uma vergonha

‘Basta lembrar do julgamento do Carandiru’, escreve Brenno Tardelli

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Gostaria de começar esse artigo contando de um caso no qual advoguei. Era início de 2014, em São Paulo, em meio aos protestos contra a realização da Copa do Mundo, quando um episódio filmado envergonhou a Polícia do Estado de São Paulo.

J. B. C. foi parada pela polícia. Estava voltando para casa, mas o máximo que conseguiu foi levar as mãos à cabeça e apanhar da polícia. Depois de uma longa sessão de agressões variadas, ela se levanta, pensava que seria enfim “dispensada”.

À distância, pelas suas costas, vinha uma moto de patrulha da Polícia. A moto saiu da rua, subiu pela calçada, passou por cima de Juliana, desavisada e pega de surpresa, que foi ao chão e machucou-se. Imagens da câmeras de segurança recolhidas posteriormente pelas autoridades jamais foram disponibilizadas a público.

Aquele seria mais um episódio oculto de má conduta policial, não fosse alguém da sacada de um prédio a filmar a cenae postar nas redes sociais. O caso saiu em sites de notícia, televisão, repercutiu em rádio e em jornais. Um exemplo gravado de sadismo, despreparo e impunidade do braço armado do Estado.

 

Mais de cinco anos se passaram. Entramos com ação contra o Estado. Juntamos o vídeo que provava, além de qualquer debate, a responsabilidade e a conduta imprópria. Os resultados do processo foram anos de morosidade, idas e vindas ao Fórum e uma condenação do Fazenda Pública de São Paulo em R$ 10.000,00. Dez mil reais a serem pagos (se é que serão) sabe-se Deus quando, para alguém agredido sem qualquer lógica. Nunca houve um pedido de desculpas, ou qualquer forma de tentativa de restauração por parte das forças policiais.

Um caso que se perde entre tantos que contam de pessoas executadas, torturadas e presas sem justificativa diariamente no País, mas penso que contá-lo é um importante ponto de partida. Quando entramos com a ação, já sabíamos que o Judiciário brasileiro era leniente com abuso policial e o desresponsabilizava, o fazendo por meio de irrisórias indenizações em processos que duram uma eternidade. Estabelecer indenizações a pessoas brutalizadas pelas polícia de forma irrisória é o mesmo que autorizar que a continuação da desumanidade que assola esse país.

Frisamos: um advogado que vai buscar justiça contra uma condenação injusta, ou então uma abordagem criminosa policial, encontrará resposta em vários setores Justiça brasileira. Bem ou mal, existem corregedorias policiais.

Mas sequer existe de forma organizada um setor em Ministério Público voltado à reparação à sociedade pelas más condutas policiais, processando o Estado sempre que um agente público, por uma conduta desprezível, submete um civil à degradação. Parecem os nobres agentes mais preocupados em processar em massa civis sem rigor probatório, do que em ser, de fato, o fiscalizador do funcionamento democrático do Estado.

Provocado por advogados e advogadas, membros do Judiciário tiram a venda que cobre os olhos da Justiça e atuam como atenuadores dos abusos.

Basta lembrar do julgamento do Carandiru, vergonha para a história desse País, cujo massacre resultou em julgamentos de absolvição para os policiais e comandante da ação, o qual inclusive foi eleito sob o número 111, infame referência ao número de mortos naquele dia macabro.

A Câmara que absolveu e enterrou o caso é a mais rigorosa do Estado, porém absolutamente branda com oficiais acusados de matar, refletindo uma máxima que traduz com evidência o que acontece nas sombras dos tribunais desse país.

Essa brandura com erros policiais e judiciais escarnecem quem vê como dever do Estado proteger seus cidadãos e de conferí-los um julgamento justo. E pior que isso: incentivam ainda mais as práticas ilegais, omissas e descuidadas do sistema de justiça. Desde a viatura até a toga de Brasília.

Nenhuma democracia que se pensa séria pode construir um sistema de condenação em massa em cima da mais baixa exigência probatória, ou da irresponsabilidade diante de má conduta policial.

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