Frente Ampla

Parecer 50: homologa, Camilo!

Ao homenagear tantas famílias que lutam por respeito e acolhimento a pessoas autistas, me somo ao coro de vozes no pedido ao ministro da Educação

Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados
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Em 18 de junho deste ano será celebrado o Dia Mundial do Orgulho Autista, data criada pela organização Aspies for Freedom para combater preconceitos, promover debates e conscientização sobre a neurodiversidade.

Refletir sobre a questão e buscar entendê-la em toda a sua complexidade é importante não apenas para refutar estigmas como também para formular políticas públicas que proporcionem acolhimento e inclusão efetivos às pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA).

No Brasil, estima-se em pelo menos 2 milhões o número de pessoas diagnosticadas com TEA. Entretanto, o estudo Retratos do Autismo no Brasil em 2023, realizado pelas startups Genial Care e Tismo.me, considera que essa população possa chegar a 6 milhões de pessoas, tomando por base a relação de 1 TEA a cada 36 habitantes, que é a prevalência detectada nos EUA. O Censo populacional de 2022, pela primeira vez, incluiu questões para quantificar esse universo dentre os brasileiros e os dados oficiais devem ser atualizados em breve.

De todo modo, o Censo Escolar de 2023 apurou que são 636 mil alunos autistas matriculados em nossas escolas, um crescimento de 48% em relação ao ano anterior. Trata-se, portanto, de um grande contingente de crianças e adolescentes neurodivergentes, que têm o direito a acolhida e integração educacional plena, dentro de suas necessidades específicas.

Ao longo dos últimos anos, graças à vibrante mobilização de pessoas autistas e seus familiares, a legislação brasileira foi se aprimorando para inclusão de estudantes com TEA, inclusive com previsão de que o poder público disponibilize acompanhantes especializados para atuar no ambiente escolar e auxiliar no suporte necessário às crianças.

ao menos três leis federais que abordam a temática, visando desdobrar e dar concretude ao comando constitucional de garantia da educação inclusiva, previsto no Art. 227, §1º, II, da Carta Magna.  A primeira delas é o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente, que prevê o atendimento educacional especializado aos “portadores de deficiência” – nomenclatura da época – desde 1990.

Em 2012, as pessoas autistas passaram a contar com uma lei específica (Lei 12.764/2012), que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, e, poucos anos depois, foi aprovado o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015), ambos com expressa previsão de que é obrigação do Estado garantir as medidas individualizadas e efetivas na busca da inclusão, como o acompanhante especializado na escola. Há também uma miríade de normas estaduais e locais regulamentando, de acordo com suas competências, essas diretrizes.

Assegurar o direito em lei é, sem dúvida, um passo decisivo para transformar a realidade. Contudo, a formalização do direito não significa sua aplicação plena. A realidade é que mesmo em São Paulo, cidade mais rica do País, não há recursos humanos disponibilizados pela prefeitura para cumprir a norma. Aliás, infelizmente, o comum é que a comunidade escolar se desdobre para atender as crianças com pouco ou nenhum apoio, o que torna a “efetiva inclusão” apenas uma inclusão formal.

Nesse sentido, são necessárias a homologação e a aplicação das diretrizes elencadas no Parecer 50, aprovado em 2023 pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), que é uma espécie de “guia essencial”, com práticas baseadas em evidências para o atendimento adequado aos alunos autistas, passando por medidas como a formulação do Plano Educacional Individualizado (PEI) da criança e o Atendimento Educacional Especializado (AEE), dentre outras para viabilizar o processo educacional inclusivo.

Tive a oportunidade de participar de uma reunião com o ministro da Educação, Camilo Santana, sobre o Parecer 50, acompanhado por outras lideranças políticas, entre elas a deputada estadual paulista Andrea Werner, que é autista e referência no tema, além de diversos especialistas e acadêmicos.

Embora admita que há um debate sobre o Parecer, pois existe quem considere que seria intromissão da saúde na seara educacional, creio que são evidentes os benefícios trazidos pela adoção dessa resolução, tanto para os alunos quanto para os professores. Afinal, dentro da escola a primazia é do professor, o que não se discute, mas também ele necessita de apoio para lidar com salas de aulas com 30 alunos, dentre eles crianças atípicas e suas especificidades.

O Parecer 50, que estava na mesa do ministro à espera da homologação, foi devolvido ao Conselho Nacional de Educação para que alguns pontos sejam mais debatidos. Que isso seja feito de maneira célere e respeitando o que foi acumulado até aqui, pois houve ativa participação da sociedade civil e de especialistas na formulação do documento. Paralisar o processo seria um erro.

Estou convicto de que o Parecer 50 é um avanço para a inclusão educacional efetiva. Ao homenagear tantas famílias que lutam por respeito e acolhimento a pessoas autistas, me somo ao coro de vozes que reivindica: HOMOLOGA, CAMILO!

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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