Frente Ampla

O melhor caminho para a esquerda brasileira é buscar a unidade

Para alcançar esse objetivo, é preciso um debate programático que assegure pontos decisivos para a agenda de combate à desigualdade

Guilherme Boulos (PSOL), líder do MTST. Foto: Reprodução/Twitter
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A retomada dos direitos políticos de Lula acendeu o debate sobre os rumos da esquerda e da oposição ao bolsonarismo nas eleições de 2022. Precocemente, é verdade. Mas o fato é que o tema tem sido tratado pela militância progressista, movimentos sociais e dirigentes partidários de forma cada vez mais aberta. Bom que se debata, desde que não se transforme no foco principal das energias da esquerda. Falta um ano e meio para as eleições, o Brasil está afundado na pandemia e no caos econômico, Bolsonaro está no pior momento do seu mandato e enfrenta uma CPI que abre uma janela de oportunidade para o impeachment.

O bom desempenho de Lula nas pesquisas após a decisão do STF faz com que ele se apresente como o principal adversário de Bolsonaro nas projeções para o próximo ano. E, por razões óbvias, o sentimento de que a esquerda precisa se unir para acabar com o pesadelo bolsonarista é amplamente majoritário no campo progressista. Esses fatores têm levado a militância e os partidos do nosso campo a abrir a discussão.

O Brasil de 2023 não é o Brasil de 2003

O PSOL deverá tomar decisão a partir de seu congresso nacional, instância partidária mais representativa, previsto para o segundo semestre, mas as posições começam a se apresentar. De um lado, o Diretório Nacional apontou para que se busquem diálogos para a unidade das forças progressistas contra Bolsonaro. De outro, um grupo de militantes e parlamentares lançou uma proposta de candidatura própria, representada?feature=oembed" frameborder="0" allowfullscreen> pelo deputado Glauber Braga. Glauber é um grande quadro, um dos parlamentares mais combativos do País e o debate sobre sua pré-candidatura é legítimo. Não vejo problema de um partido debater abertamente suas definições, desde que o debate público não seja feito de forma desrespeitosa e que todos sigam a decisão que a maioria vier a tomar. É, inclusive, sinal de vida orgânica ativa.

De minha parte, defendo que o melhor caminho para a esquerda brasileira é a busca incansável da unidade para derrotar Bolsonaro. O Brasil não vive um momento de normalidade democrática e as eleições de 2022, se não houver impeachment até lá, serão marcadas por tensões e ameaças do bolsonarismo. A cortina de fumaça do voto impresso esconde os mesmos anseios da mobilização dos partidários de Donald Trump na invasão do Capitólio. Aqui é ainda mais grave, considerando as milícias bolsonaristas armadas e sua influência nas forças militares. O principal foco de nossa atuação nas eleições nacionais deve ser derrotar Bolsonaro e a unidade das forças progressistas é fundamental para isso. Além do peso eleitoral, isso tem um importante peso simbólico.

Ao mesmo tempo, numa eleição não se luta apenas contra um adversário. É um momento decisivo para apresentar um projeto para o povo brasileiro. Nesse sentido, a construção da unidade precisa passar por um debate programático, que assegure pontos decisivos para a agenda de combate às desigualdades e de defesa dos direitos sociais.

O Brasil de 2023 não é o Brasil de 2003. Será, lamentavelmente, se nada mudar de forma decisiva, um país destroçado pela crise econômica mais duradoura da história recente, por uma condução desastrosa da pandemia e por anos de devastação neoliberal. Vai ser urgente para qualquer governo progressista um plano de reconstrução nacional, baseado na geração de empregos, na retomada do investimento público e dos direitos sociais e trabalhistas. Isso significa, de partida, o compromisso com a revogação do Teto de Gastos aprovado por Michel Temer, que funciona como um bloqueio para o Estado fazer políticas sociais mais ousadas e como forma de desmonte do serviço público, incluindo o SUS.

Para financiar uma política expansiva, o Brasil terá de seguir vários dos nossos vizinhos latino-americanos e pautar uma reforma tributária progressiva, com taxação de grandes fortunas, lucros e dividendos, grandes heranças, enfim, garantindo que a conta seja paga pelo andar de cima. Além do tema distributivo, o País terá de encarar o debate, feito no mundo todo no cenário de pandemia, de ampliação da base monetária para financiar de imediato um amplo programa de investimento público.

Acredito que essas são algumas das diversas pautas que terão de ser debatidas entre as forças políticas de uma aliança progressista para derrotar Bolsonaro. Mas, reitero, embora as eleições estejam no radar de quem atua na militância política de esquerda, elas não podem ser o nosso principal foco neste momento. Inclusive, a possibilidade de uma unidade eleitoral se fortalece muito se formos capazes de construir uma unidade social nas lutas de 2021, por vacinação, contra a fome e pelo impeachment de Bolsonaro, que não pode ser retirado da agenda. Acredito que, muito em breve, estaremos nas ruas para defender essas agendas. E a rua é sempre um importante teste para qualquer unidade.

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1157 DE CARTACAPITAL, EM 13 DE MAIO DE 2021.

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