Frente Ampla

A política de segurança de Cláudio Castro apenas espalha terror e medo nas favelas

O crime deve ser combatido, mas a política do “tiro na cabecinha” já se demonstrou ineficaz. A pergunta que fica é: a quem serve uma política de segurança que mata preto e pobre?

O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro. Foto: Carlos Magno
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No mês de maio, o governo Cláudio Castro entrou para a história como o responsável pelas duas maiores chacinas já ocorridas em favelas no Rio. Não é pouca coisa em um estado no qual entra e sai governador, mas a política da bala permanece a mesma, exterminando negros nas favelas.

A chacina na Vila Cruzeiro, no Complexo da Penha, deixou 23 mortos e se tornou a segunda ação policial mais letal de todos os tempos, ficando atrás apenas da operação do Jacarezinho, em 2021, com 28 mortos. Como governador, Castro foi o comandante-chefe de todas essas ações. Uma barbárie promovida pelo Estado Democrático de Direito. Inadmissível.

Trata-se de uma política espetaculosa e violenta que nem resolve o problema da falta de segurança no Rio nem entrega mais qualidade de vida aos moradores das comunidades invadidas. A pergunta que fica é: a quem serve uma política de segurança que mata preto e pobre? Anunciada como um substituto do falido projeto de Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), o programa Cidades Integradas de Cláudio Castro, na verdade, leva aos moradores das comunidades invadidas mais terror e medo. Desde janeiro, quando o governo começou a implantá-lo, tenho recebido diversas denúncias de abusos policiais, de invasão de casas a agressões verbais e físicas nas comunidades por onde o programa passa.

A política genocida do Cidade Integrada é cega e surda às necessidades das pessoas nas favelas

E o governo tem intensificado as ações ostensivas de confronto, como temos visto pela imprensa. A Vila Cruzeiro, o Morro do Borel e o Complexo de Manguinhos estiveram na mira da polícia recentemente. A cada invasão policial, trabalhadores morrem, escolas, postos de saúde e o comércio local fecham as portas, pais e mães perdem empregos por ausência no trabalho, pessoas adoecem de horror. Uma situação extremamente covarde e injusta.

A política genocida do Cidade Integrada é cega e surda às necessidades das pessoas nas favelas. Depois de 134 anos de abolição inconclusa, nós, negros, continuamos buscando igualdade de direitos básicos. O racismo estrutural nos rouba o acesso à educação, saúde, infraestrutura, moradia e oportunidade de empregos. Até hoje, a democracia não subiu o morro. Nunca ouvimos Cláudio Castro anunciar ações de fomento ao pequeno e microempresário morador de periferias. Quando o Estado vai divulgar um plano de desenvolvimento econômico e social que nos tire da pobreza? Ou mesmo um projeto para acolher os órfãos da Covid-19? Que tal amparar mães solo que perderam suas ocupações por causa da pandemia?

O governo não entrega. Pelo contrário. Protela a resposta para problemas reais que afetam a vida das pessoas que mais precisam do poder público. Até o momento, Cláudio Castro não enviou à Alerj mensagem de lei reajustando o piso salarial dos trabalhadores, defasado desde 2019. A população luta para sobreviver após uma pandemia que tornou os pobres ainda mais pobres, num Rio de Janeiro com custo de vida cada vez mais alto, e o que o governador faz?

Ninguém está dizendo que o crime não deve ser combatido, mas a política do “tiro na cabecinha” praticada há anos já se demonstrou ineficaz

O meu mandato tem se dedicado a dissecar a execução dos recursos previstos no orçamento de 2022 do governo Cláudio Castro. Impressiona verificar que foram direcionados R$ 12 bilhões para a compra de armas e munições, enquanto à construção de habitação popular, por exemplo, uma demanda séria no Estado do Rio, que tem déficit habitacional, o governo destinou apenas R$ 900 milhões. Qual é a prioridade?

Os governos insistem no confronto armado dentro de favelas porque o aparato empregado — tropas fardadas, armas, uso do caveirão e de helicóptero — traz muita visibilidade e gera pontos positivos entre eleitores que, assim como o governador, defendem a falácia do uso da força e da autoridade como solução para problemas de fundo social. Uma política eleitoreira, sem dúvida, mas não apenas isso. Sabemos que as ações ocorrem de forma atrelada ao crescimento das áreas dominadas por milícias num estado onde o poder e o crime organizado caminham lado a lado, em desalinho com o Estado Democrático de Direito.

Veja bem, ninguém está dizendo que o crime não deve ser combatido, mas a política do “tiro na cabecinha” praticada há anos já se demonstrou ineficaz. Como deputada estadual e vice-presidenta da Comissão de Combate às Discriminações e Preconceitos de Raça, Cor, Etnia, Religião e Procedência Nacional da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, vou cobrar do governador explicações sobre a chacina no Complexo da Penha, assim como venho me posicionando contra a política de segurança genocida, que tem alvo, cor e endereço. Não podemos naturalizar assassinatos de quem quer que seja, muito menos quando os tiros partiram dos agentes do Estado Democrático de Direito.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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