

Opinião
Fogo: visto assim do alto e com a lupa
Tudo coordenado para ferrar a quem? A eles mesmos? China, esquerda, comunistas?


Há cerca de 15 anos – por aí, não sou mais exato com datas – convidado pelo amigo Sergio Lirio, comecei minhas colaborações para o site de CartaCapital. Na inauguração, em pequeno mas sofisticado boteco dos Jardins, zona nobre de São Paulo (como usa a mídia convencional para reforçar status, por que não citar o nome do bairro?), amizades virtuais ainda mantidas: Lino, Matheus, Manuela, Clara Averbuck, Pilar Velloso (que acabou fazendo da capa do meu livro Dominó de Botequim uma obra-prima). Propuseram-me escrever sobre o agronegócio. Contrapus. Que pudessem ser em forma de crônica e trouxessem experiências pessoais de minha paixão cabocla.
O agronegócio parecia ter-se tornado único apanágio brasileiro a ser exalado por folhas e telas cotidianas como sucesso. De outro jeito, seria monótono falar dele sem se chocar contra os milhares que o estariam fazendo. E como não entrar nas galhofas da economia e da política nacionais? Solicitei a concessão e cumpri. Vale até hoje em dia.
Um acidente, em 2021, quando lutava na Avenida Paulista para acabar com o domínio do Regente Insano Primeiro, prestes a destruir o País, ignorante da ciência, amante da disseminação de armas de fogo e da destruição do meio ambiente, RIP levou a manifestar-me não apenas pelas letras, mas por uma “força estranha” que me move desde a adolescência.
Sim, cheguei em casa e caí. Frontal direito direto no chão. Nada para me proteger e amenizar a queda. Uma neuropatia periférica diabética, que me acompanhava há mais de 40 anos, foi a causa primeira. A segunda foi a alegria das lembranças dos anos 1980. Mais uma vez estava eu chamando pra briga os cães do fascismo e da insensibilidade social incrustrada em um país rico, mas infenso à miséria de seu povo.
Em casa, noite pedindo permissão à madrugada para o descanso diário, apelei para um forró e algumas salineiras para comemorar como no Nordeste se faz na “Feira de Mangaio”, e na beira-mar peguei um “Táxi pra Estação Lunar”. Dancei em todos os sentidos. Vitorioso até o hospital. Olhos médicos arregalados. É sério. Uma estenose de medula havia me levado a uma cirurgia importante e a vida, daí em diante, de imobilidade parcial.
Volto da lua e das fisioterapeutas lunares, por estrita falta de dinheiro (Elon Musk só topou me trazer de volta, moedas para o tratamento que fosse pedir ao Xandão). Encontro um território diferente. O Brasil transformado e transtornado. Depois de um período de temporais e chuvas incessantes numa ponta do País, em sequência, abrangendo, praticamente, todo o território nacional, vem um período sem fim de seca, incêndios, fogareiros fatais exterminando vidas humanas e animais, produções agrícolas, infraestruturas, matas e florestas. ‘Sustei”. O insano voltara. Não. Apenas um simulacro Pablo, candidato a prefeito de São Paulo, que de cadeirada em cadeirada não irá longe.
O vídeo acima é exclusivo. Foi realizado numa fazenda de grãos no oeste do Paraná, região tradicional produtora de soja e milho. Agricultor sério, experiente e aparelhado tecnologicamente na batalha para, talvez, conseguir compensar o prejuízo que já tivera com a seca e as queimadas.
Pergunto: que babaquice essa de falar, muito comum nas folhas e telas cotidianas, para leigos ou imbecis das teorias conspiratórias, se tratar de ações criminosas, sem atores definidos. PCC, Comando Vermelho (CV), um caboclo distraído que deixou cair a bituca de seu pito num mato rasteiro? Tudo coordenado para ferrar a quem? A eles mesmos? China, esquerda, comunistas?
Ora, vão pentear macacos. Estão todos loucos ao martelarem secas, queimadas, incêndios, fumaças, de forma indiscriminada, autores supostos, esquecem a barra das mudanças climáticas que prejudicam ruralistas e ambientalistas, em todo o planeta.
Lido com vocês, e quase sempre têm meu apoio contra os sectaristas agropecuários que poluem os rios com mineração predatória, corte indiscriminado de florestas nativas para exportação, destruição de biomas mais valiosos que os recursos vendidos de forma primária, ou abrem novas áreas de plantio com fogo. Estes são ilegais, foras-das-leis, bandoleiros. Mas também, ambientalistas, da mesma forma, conheço o terceiro testamento de sua bíblia: conquistar divisas para a balança comercial do Brasil através da agropecuária é crime.
Pois bem, desde os primórdios, citados propositadamente no início do texto, abordaria agronegócios para CartaCapital, desde que, havendo oportunidade, os veria como Paulinho da Viola via a Mangueira, “assim do alto mais parece um céu no chão” ou com a lupa, o chão parecerá um inferno.
Leitores e leitoras, pensem: até as duas últimas décadas do século passado, muitos agricultores ainda acreditavam que o fogo os ajudava.
Não mais. A maioria foi elucidada de que o solo não constitui um recurso renovável na escala de vida humana. A formação de 2,5 centímetros de espessura pode levar entre quinhentos e mil anos, facilmente perdida em horas de um processo erosivo por enxurrada.
Incêndios, ao contrário, poderão prejudicar desempenhos vitais na formação de ecossistemas, bases climáticas, minas de água, mais tarde rios, biodiversidade, qualidade do ar, preservação de fauna e flora regionais.
A biota do solo, quando equilibrada, traz vegetação com sanidade e maior produção de alimentos. Queimadas agrícolas voluntárias? Pra quê? Tomar multa, proibidas desde a Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998? Para limpeza e manejo do solo só se for por burrice ou estarmos tratando com um Nature Killer. Cadeia!
Hoje em dia, há vários tratamentos e produtos capazes de preservarem ou até enriquecerem a biota (elementos vivos benéficos do solo), permitindo estabilidade e produtividade das culturas. Usem a Embrapa ou empresas de pequenas empresas nacionais que desenvolvem o mercado para tais tecnologias e depois são roubadas por multinacionais do setor de insumos (não os nomino para não usar a CartaCapital em benefício próprio). Estou documentado, tenho os nomes de quem me traiu depois de mais de 20 anos de contrato de exclusividade e consolidação do mercado pela nossa “empresinha” realizada.
Quanto às queimadas, releguem-nas nesta safra. Podem vir de um ano atípico ou, mais provável, das mudanças climáticas que vieram para ficar. Não sabemos, muito menos as folhas e telas convencionais de teorias conspiratórias.
Vamos aguardar, mas com juízo ambiental. As alternativas corretas são muitas. Inté!
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.
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