Afonsinho

Médico e ex-jogador de futebol brasileiro

Opinião

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Euforia e tristeza

Enquanto o Botafogo comemorava o título, o Athletico Paranaense amargava o rebaixamento para a Série B do Brasileirão

Euforia e tristeza
Euforia e tristeza
Queda. O Athletico Paranaense entra em crise – Imagem: Baptistão e Gilson Lobo/Agif/AFP
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Com a temporada de futebol brasileiro chegando ao fim, o Botafogo destaca-se como o grande campeão. A conquista do título uniu torcedores de diferentes clubes, que demonstraram que a paixão pelo futebol transcende as rivalidades.

A frase de João Nogueira, “Cansei de sair do Méier pra ver o Garrincha jogar”, resume bem esse sentimento de amor pelo esporte. É lamentável, porém, que algumas pessoas tenham tido reações negativas diante da vitória do Botafogo.

A resistência em aceitar o resultado, por parte de muitas pessoas – inclusive, de gente supostamente razoável – mostra a força e a confusão dos sentimentos despertados pelo futebol.

A expressão popular “Tempo de Botafogo” resume bem essa dificuldade de aceitação do novo. A equipe carioca, que vinha de uma temporada de altos e baixos, surpreendeu todos ao garantir o título com antecedência.

A vitória do Botafogo foi um alívio para os torcedores, que se acostumaram, ao longo dos anos, a ver o time oscilar entre a parte de cima e a de baixo da tabela.

Mas, no encerramento da temporada, sobrou de tudo para campeões eufóricos e rebaixados inconformados. Enquanto o Botafogo comemorava o título, o ­Athletico Paranaense enfrentava uma crise.

O time, que vinha de uma boa campanha nos últimos anos, amargou o rebaixamento para a Série B do Brasileirão depois de perder para o Atlético Mineiro.

A queda do Furacão, no ano do centenário do time, foi um choque para os torcedores e para a diretoria do clube, que não esperavam esse desfecho após um período de bons resultados.

A diretoria do clube divulgou uma carta aberta aos torcedores, na qual se desculpou pela queda e explicou os motivos que levaram ao rebaixamento. A carta citou a dificuldade de conciliar as diversas competições, o desequilíbrio financeiro causado pelas SAFs e a necessidade de reavaliar a estratégia do clube.

O rebaixamento voltou a levantar a discussão sobre o calendário do futebol brasileiro, tema que eu tantas vezes discuto neste espaço. O calendário exaustivo, com uma sequência de jogos sem tempo suficiente para recuperação, contribui para o aumento do número de lesões e para a queda no rendimento dos atletas.

Além disso, a concentração de jogos em determinadas épocas do ano sobrecarrega as equipes e dificulta a preparação para as competições internacionais. A situa­ção agrava-se com a crescente ­quantidade de competições, fato que obriga os clubes a dividir seus elencos e a priorizar alguns torneios em detrimento de outros.

Essa realidade leva a um desequilíbrio competitivo e, como temos visto, prejudica a qualidade dos espetáculos. Embora o futebol seja, a despeito dos altos e baixos e das intermináveis crises, um dos esportes mais populares do País, os jogadores enfrentam condições de trabalho precárias.

Como sabemos, a questão do calendário exaustivo no futebol é um problema global. Mas não podemos deixar de mencionar o caso específico do Brasil e, em particular, do Botafogo.

Após as conquistas na Libertadores e no Brasileirão, o Botafogo viajou para o Catar para disputar outro torneio, mesmo com a temporada perto do fim, enquanto outros clubes já estavam de férias.

A viagem do Botafogo ao Catar gerou um grande bafafá, com muita gente comentando o luxuoso avião que transportou a equipe em um voo direto após a última partida do Brasileirão.

O avião, apesar de todo o luxo, precisou fazer escala no Marrocos para reabastecer. As imagens divulgadas pela mídia da equipe se alimentando durante o voo evidenciaram as condições da viagem.

As entidades que representam os jogadores permaneceram em silêncio diante da situa­ção absurda. Assim, caso o Botafogo cumpra todas as partidas do torneio intercontinental, a equipe terá disputado 77 jogos na temporada. •

Publicado na edição n° 1341 de CartaCapital, em 18 de dezembro de 2024.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Euforia e tristeza’

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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