Verdadeiramente nunca vivemos no futuro (nem no passado). Por outro lado, o que chamamos presente é apenas o momento de interface entre a memória reconfortante ou inquietante do que fomos e a antecipação, auspiciosa ou sinistra, do que vamos ser. Os finais de ano prestam-se a que esse momento, sempre presente, se manifeste sob a forma de interpelação. Nisso consistem os balanços e os planos. A enigmática dinâmica temporal centrada no que já não vivemos e no que nunca viveremos ocorre tanto no nível individual quanto no nível social. Centro-me no social, mas a análise é válida, com adaptações, em todos os níveis da vida humana.
A memória e a antecipação não são coisas distintas. São modos diferentes de avaliar a condição existencial em razão do medo e da esperança que ela suscita. A memória inquietante e uma antecipação sinistra são o espelho do medo sem esperança, a memória reconfortante e a antecipação auspiciosa são o espelho da esperança sem medo, a memória reconfortante e a antecipação sinistra são o espelho da perda e dos limites impostos por determinações, imposições ou fatalidade, a memória inquietante e a antecipação auspiciosa são o espelho da resistência e das possibilidades, da desestabilização dos limites, das imposições e dos determinismos. No nível individual, este é o tempo em que cada indivíduo, grupo social ou sociedade tenta definir a sua condição existencial. É à luz dela que se afirmam propósitos e se tomam decisões. Nos tempos de globalização fraturada e fraturante em que vivemos, outro nível de avaliação condiciona todos os níveis anteriores. Refiro-me à escala do mundo e do planeta. Qual é a condição existencial do Brasil neste fim de 2022?
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