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Opinião

“Escola sem partido” em Campinas: a marcha do obscurantismo

Para Bebel, presidenta da APEOESP, o projeto Escola sem Partido prevê uma escola onde prevaleçam apenas ideias e padrões de comportamento conservadores

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Declarado inconstitucional pelo Ministério Público Federal, o programa Escola em Partido continua sendo apresentado por meio de projetos de lei em Assembleias Legislativas, Câmaras de Vereadores e tramita na Câmara dos Deputados, em Brasília.

Na segunda, 4/9, a Câmara Municipal de Campinas aprovou, em primeira votação no plenário da Câmara, este projeto que não passa de uma farsa, na medida em que caracteriza como “partidários” conteúdos, debates e troca de experiências e informações que fazem parte da tarefa de ensinar, fomentar a circulação e a produção do conhecimento.

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Da mesma forma, querem impedir que as escolas formem jovens conscientes sexualmente e preparados para conviver com a diversidade, exercendo a cidadania em sua plenitude.

Apenas quatro vereadores de Campinas votaram contra o projeto: Gustavo Petta (PCdoB), Mariana Conti (PSOL), Pedro Tourinho (PT) e Carlão do PT.

Autoritarismo e delação

O que este movimento chama de “escola sem partido” é, na verdade, a implantação de uma “escola de um só partido”, ou seja, uma escola onde prevaleçam apenas ideias e padrões de comportamento conservadores, destinados à manutenção do status quo e à formatação de pessoas que não questionem a realidade em que vivem e não se disponham a transformá-la.

É inaceitável a aprovação de um projeto que incentiva estudantes e pais a delatarem professores que, a seu juízo, estejam realizando “doutrinação” em sala de aula. Por meio de medidas autoritárias, como a afixação de quadros onde as escolas devem determinar o que “pode” e o que “não pode” ser abordado em sala de aula, querem cassar a liberdade de cátedra e reduzir a relação professor-estudante a um ato formal de transmissão de conteúdos restritos a uma única concepção de mundo e de sociedade.

Desta forma, uma aula de história, sem a contextualização social e política dos eventos abordados, esvazia-se de seu conteúdo formativo e não prepara verdadeiramente o estudante para compreender a trajetória da humanidade e da sociedade em que vive. O mesmo se aplica à literatura, à geografia e até mesmo, em muitos aspectos, às ciências, à matemática, química, física, artes e, sobretudo, à filosofia e sociologia, disciplinas que essas forças conservadoras há muito querem eliminar do currículo escolar, agora com apoio do governo golpista de Michel Temer.

O poder público contra a sociedade

É muito preocupante o atual divórcio entre as casas legislativas e os interesses populares. Totalmente impermeáveis às manifestações de especialistas, entidades, movimentos, sindicatos, Ministério Público, cidadãos e cidadãs, os parlamentos brasileiros aprovam o que querem, sem nenhum respaldo social.

No caso do projeto do “escola sem partido” aprovado em Campinas, a Câmara dos Vereadores simplesmente ignorou parecer da Faculdade de Educação da Unicamp, que o considerou “deseducativo e autoritário”.

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O parecer da Faculdade de Educação diz que “há que se destacar ainda que é a liberdade de pensamento e as diferenças entre posições de diferentes sujeitos que permitem que, ao longo de sua trajetória escolar, cada estudante possa interagir com um conjunto heterogêneo de outros estudantes e de docentes, cada qual com suas posições e perspectivas, tornando o processo educativo ainda mais rico e democrático. Sem essa troca, qualquer atividade pedagógica se inviabiliza, pois seria necessário supô-la sem elementos a serem trocados. Sequer o conhecimento é possível se não se pressupõe sujeitos em situação social de intercâmbio, vinculados a contextos reais e também a interesses concretos e distintos”.

O que quer o movimento “escola sem partido” não é e nunca foi combater a suposta “doutrinação” nas escolas brasileiras. Como farsa que é, busca esvaziar completamente o processo educativo de seu caráter formativo, para criar gerações de pessoas conformistas e conformadas com a sociedade em que vivemos, como se a exploração, o preconceito e ausência de direitos fossem naturais.

Não podemos aceitar. Vamos intensificar a denúncia contra esse projeto autoritário. Não podemos nos omitir diante deste crime contra a nossa juventude.

Maria Izabel Azevedo Noronha – Bebel
Presidenta da APEOESP

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