Opinião

Envergo, mas não quebro

Não vamos desgastar o texto mencionando o período funesto de Jair ‘Chopard’ Bolsonaro. Foram episódios de segurança pública e manicômio

Poster do documentário
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(…) É que eu sou tal qual a vara/Bamba de bambu-taquara/Eu envergo, mas não quebro (…)Não é só felicidade/Que tem fim na realidade/A tristeza também tem/Tudo acaba, se inicia/Temporal e calmaria/Noite e dia, vai e vem (…) Eu envergo, mas não quebro. (Música e letra de Lenine)

Não é de hoje, mas sim um clássico, o Brasil maltratar a Amazônia e demais biomas-tesouros incorporados ao nosso território. Procura-se culpados. De tantos já descobertos, mesmo quando óbvios, as autoridades e cuidadores de plantão dizem ser difícil puni-los. 

Têm nossos patrimônios e deles se aproveitam em uso próprio. Que se defendam sozinhos. Ganhamos dinheiro. Afinal, há séculos, envergam, mas não quebram.

Ingênuos, bananões (apud o jornalista e escritor Ivan Lessa – 1935/2012), imediatistas, malfeitores, longe de entenderem geopolítica ou aritmética, com raríssimas exceções, políticos e agências ruralistas vivem se defendendo com imperícia e mentiras ser o Brasil, o país que “mais preserva o meio ambiente”. 

Enquanto isso, instituições sérias do próprio poder incumbente desfilam amiúde, uma atrás da outra, estatísticas que revelam queimadas, desmatamentos, poluição química fatal de rios a impedir potabilidade para humanos e a fauna. Em compensação, devolvem-nos com emissão de gases que defloram os apetitosos orifícios da camada de ozônio.

A babaquice, no entanto, vai além. Acham que assim o fazem na miúda. O planeta não percebe. Calma. Não vou falar das expressivas mudanças climáticas que tanto nos vêm atormentando. Cada vez mais óbvias nos aproximam de um final catastrófico. Vide chuvas, secas, nevascas, incêndios inauditos.

Mas não é somente isso que desejo expressar. Há, também, os olhares cupidos que o capitalismo hegemônico põe sobre nossos tesouros e como mal defendemo-nos, razoável razão lhes damos.

Não vamos desgastar o texto mencionando o período funesto de Jair “Chopard” Bolsonaro. Foram episódios de segurança pública e manicômio. 

Ultrapassados mimimis: “são governos, departamentos de Estado, organizações não-governamentais, grandes complexos privados, querendo tirar proveito de nossos recursos naturais. Está tudo preservado”.

E, infantilmente, usam a nossa produtividade, como poupadora de área agrícola, pecuária e indústria exportadora de carnes. É claro que é, mas não por consciência ambiental, e sim por redução de custos nos gastos com insumos agrícolas químicos excessivos, pois praticamente 85% importados, submetidos a carteis do exterior e vulneráveis diante da política cambial. Reduzir tais custos com opções orgânicas e nacionais, nem pensar, né predadores de inteligência?

É quando vem a enxurrada de críticas e reprimendas do exterior, ficamos no canto do corner sendo esmurrados. Vagabundas nossas luvas protetoras. 

Em 2020, o diretor polonês Michal Siewierski lançou o documentário (74 min) “Amazônia em Chamas” (Takeout), que estreou no Brasil em abril de 2021. Entre os produtores (EUA) está o músico e cantor Moby. Hoje em dia, tem sido apresentado nos canais Telecine ou em streaming

Infalíveis imagens dos crimes cometidos contra a Floresta Amazônica, os biomas que a cercam de rica biodiversidade, os povos indígenas em pobreza e massacres, acompanhados de inúmeras entrevistas de ativistas e cientistas estrangeiros e nacionais.

Não gastarei muitos caracteres pra dizer que a peça é um dó. Não algo como fosse um samba de uma nota só. Mas, assistir imagens, mais do que reproduzidas aqui na Federação de Corporações, em folhas e telas cotidianas, sem que nada se faça há décadas, desculpem-me, não passa de um mais do mesmo, principalmente, para este colunista que a isso se dedica há mais de 20 anos. 

Fosse apenas isso, poderíamos parar aos 20 minutos do filme (?), mas não o senhor Michal, a certa altura, entre em exacerbado ataque de veganismo, e cria um samba do polonês louco, ao misturar agronegócios, pecuária e gordurosas picanhas servidas em churrascarias brasileiras, com apoio de doutores que atestam, continuarmos assim, morreremos na primeira fatia sanguinolenta de boi devastador de florestas mundo afora.

Aliás, leitores amigos, se entrarem de sola, numa carne bovina, desviem seus olhares das grelhas. Lá haverá fogo crepitando com madeira trazida da Amazônia, especificamente para seu churrasco, ainda que seja na laje de sua casa.

Inté. Vou envergar, mas não quebrar.    

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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