Opinião

Em meio à guerra de dados, versões e invenções, o melhor ainda é debater e verificar

Atualmente, presenciamos uma verdadeira guerra de informações sobre a Rússia, a Ucrânia e a OTAN

O presidente da Rússia, Vladimir Putin. Foto: Sergei Guneyev/Sputnik/AFP
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“O homem sábio busca a sabedoria, o louco pensa que a encontrou.”
Provérbio persa.

O mundo virtual está cada vez mais sofisticado. Realidade e virtualidade confundem-se. As fake news prosperaram graças a isso, são a demonstração cabal dessa assimilação entre realidade e fantasia (mentira ou inverdade, como queiramos chamar).

Entretanto, a presença, o contato pessoal se impõe, quando buscamos a verdade, a sapiência e a alteridade.

Atualmente, presenciamos uma verdadeira guerra de informações sobre a Rússia, a Ucrânia e a OTAN.

Em muitos meios de informação, a Rússia tornou-se o vilão do dia.

O fato de que milhões de russos e russas tenham sido assassinados na invasão nazista ao país na Segunda Guerra Mundial foi totalmente apagado das narrativas hegemônicas.

No entanto, sem considerar aquele dado, dificilmente se poderá entender a invasão russa da Ucrânia.

Porém, basta visita a São Petersburgo para entender a dramaticidade do sítio nazista de mais de um ano à antiga capital russa. Durante o cerco, a população teve de se alimentar unicamente de uma ração que se assemelhava a um meio tijolinho de palha, o que resultou em milhares de mortos por inanição, além dos atingidos pela artilharia nazista. Como esse povo não teria a segurança externa como sua maior preocupação?

De fato, a gesta heroica dos homens e mulheres russos é ainda reconhecida pelos habitantes da cidade – e não apenas – que os nubentes, invariavelmente, no dia das bodas, dirigem-se ao cemitério para render homenagem às vítimas do nazismo.

Na atual capital, Moscou, as barreiras antitanques estão a aproximadamente 20 km do centro da capital, demonstrando quão perto chegaram os nazis. O próprio aeroporto internacional está para além dessa barreira.

Como nosso Paulo Freire dissera, o melhor método de aprendizagem é o dialógico.

Crescemos e aprendemos com as trocas, com a participação nos raciocínios comuns.

Uma vez, conversando com o embaixador da Coreia do Norte em Brasília, ele me disse algo para mim definitivo a respeito: “A invasão japonesa na Segunda Guerra foi tão brutal que tomamos a decisão, como nação, de que nunca mais seríamos invadidos, custasse o que custasse.”

Acho que isso se aplica também ao consenso nacional russo quanto à segurança externa.

Mutatis mutandis, como seria importante que tomássemos a decisão nacional, neste triste aniversário de 200 anos da independência, de nunca mais aceitarmos um golpe de estado, como os que interromperam nosso desenvolvimento nacional, em 1954, 64 e 2016.

Com efeito, aos vassalos, atualmente, sequer as migalhas das mesas dos suseranos são concedidas. O mundo em que 1% tem mais renda do que os demais 99% é brutal, genocida, desapiedado.

Um exemplo: no início do mês, de forma não noticiada pela imprensa local, por razões óbvias, os Estados Unidos da América (EUA) confiscaram 7 bilhões de dólares do Afeganistão, que apresenta um dos maiores índices de desnutrição aguda da população, principalmente infantil.

Segundo os EUA, metade dos recursos irá para um “fundo humanitário” (administrado pelos próprios EUA), a outra metade pagará indenizações aos familiares das vítimas da queda das Torres Gêmeas.

Ora, da queda das Torres, o Afeganistão foi a principal vítima, pois o país foi invadido em seguida, gerando milhares de mortos, feridos e traumatizados, além de bilionários prejuízos materiais.

Nada disso importa ao ex-colonizador: 7 bilhões de dólares, que poderiam servir ao Afeganistão para o fomento à agricultura local e à importação de alimentos irão para os bolsos dos senhores da guerra, aqueles que dos mais de 260 conflitos externos após a Segunda Guerra Mundial foram responsáveis por precisos 201, os EUA.

Em meio à guerra de dados, versões e invenções o melhor ainda é debater, verificar com os próprios olhos e tentar chegar a conclusões próprias.

Por exemplo, quando a Rússia pede neutralidade para a Ucrânia isso é inusitado? Não. Esse é o status da Áustria, que nunca aderiu à Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).

Parece exótico? Nem tanto. Se olharmos no mapa, veremos que a capital da Áustria, Viena, está a oeste da principal das capitais europeias, Berlim. Portanto, já existe um país com status de neutralidade, que é mais “ocidental” do que o mais “ocidental” dos países europeus da OTAN. Por que não aceitar essa mesma condição para um país fronteiriço da Rússia, que dela recebera graciosamente territórios em passado recente, como foi o caso da Crimeia, nos anos 50, cedida à Ucrânia por Nikita Khrushchov?

A casa grande mundial, a casa branca, literalmente, deslegitima os dominados todo o tempo. Por que a legitimarmos, então? De onde vem essa “legitimidade”? Da moral? Da ética? Certamente, não.

Mais bem da pilhagem, do roubo, do botim com que compra os que se vendem.

Por fim, não esqueçamos as palavras de um grande latino-americano, o peruano José Carlos Mariátegui, que nesse ponto coincidia com o russo Vladimir Ilyich Ulianov, vulgo Lenin, conforme “Mariátegui – Vida e Obra”, de Leila Escorsim (editora Expressão Popular): “O capitalismo encontra-se em seu estágio imperialista. É o capitalismo dos monopólios, do capital financeiro, das guerras imperialistas pelo açambarcamento dos mercados e das fontes de matérias-primas.”

E a Rússia tem a maior reserva de diamantes, uma das maiores de ouro etc. Faz sentido. Mas também tem um povo que tomou uma decisão. Conta mais. A nós, de tomarmos a nossa, mais modesta, mas igualmente efetiva.

 

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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