Arthur Chioro

Ex-ministro da Saúde

Opinião

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Em defesa da vida

Mantida a lógica bolsonarista, nos restará, no SUS, a reemergência da paralisia infantil e do sarampo, o atraso nos diagnósticos, a dificuldade para tratamento e o agravamento de doenças

SUS. Foto: Agência Brasil
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O SUS é uma das pedras angulares da nossa democracia e um dos principais vetores de combate à desigualdade social. Sua construção, fruto de um contrato social tecido ao longo de vários governos, permitiu que se transformasse em uma política de Estado, partindo da premissa de que a saúde é um direito universal e um dever do Estado.

Entre suas conquistas destacam-se o aumento da expectativa de vida, a redução da mortalidade infantil e uma ampla cobertura vacinal. Programas como os de imunização, HIV/Aids, hepatites, tabagismo e assistência farmacêutica, entre outros, viraram um fator distintivo do Brasil no mundo.

Essas conquistas, todavia, têm sido seriamente ameaçadas pelo governo Bolsonaro. A atuação do presidente no enfrentamento da pandemia é expressão de seu descompromisso com a saúde e com a vida dos brasileiros. Lidou com a pandemia de forma leviana e é o grande responsável por centenas de milhares de mortes evitáveis por Covid-19. Substituiu a gestão técnica e científica por uma linha de comando militar e submissa aos interesses do Centrão, que desestruturou, entre outras, as políticas de atenção básica, imunização, saúde mental, saúde da mulher e assistência farmacêutica.

O SUS perdeu 37 bilhões de reais desde a vigência da emenda do Teto de Gastos. O subfinanciamento da saúde assume agora ares de desfinanciamento. A pandemia mostrou ao País o quanto é importante investir em saúde, mas Bolsonaro, além de não sustentar as necessidades crescentes de recursos para a saúde, destinará, em 2023, 20 bilhões de reais do orçamento do Ministério da Saúde para emendas parlamentares, sendo metade para emendas secretas, uma estratégia escancarada de compra de votos, que desorganiza o SUS e gera cada vez mais corrupção e iniquidades.

Enquanto isso, a maioria dos programas e ações de saúde terá seus recursos cortados, inviabilizando a manutenção do que já existe e impedindo o acesso a novas tecnologias. Tome-se o exemplo do tratamento do câncer, que ocupa o segundo lugar como causa de morte dos brasileiros. Perto de 95% dos medicamentos oncológicos aprovados e registrados nos últimos cinco anos pela Anvisa não foram incorporados ao SUS. Isso é expressão do descaso com que este governo trata dos mais de 172 milhões de brasileiros que dependem exclusivamente do SUS.

Faltam medicamentos e insumos básicos para os nossos pacientes. A cobertura vacinal caiu a índices alarmantes. Outros indicadores de saúde já começam a ser impactados negativamente. E isso não ocorre por causa da guerra da Ucrânia, do dólar ou da pandemia. É fruto da política econômica, da emenda do Teto e do descaso com a vida.

Mantida essa lógica, não há como se falar em acesso às novas tecnologias. Ao contrário, o que restará é a reemergência da paralisia infantil, do sarampo, mais filas, retardamento de diagnósticos, dificuldades para obter tratamento e agravamento dos casos. O SUS ficará cada vez mais empobrecido e marcado por um atraso científico e tecnológico. E, por consequência, pelo aumento da mortalidade infantil e materna e pela diminuição da expectativa de vida de nossa gente.

Cuidar da saúde do povo brasileiro tornou-se, mais do que nunca, um desafio central para o governo que será eleito em 30 de outubro.

Como prega o manifesto assinado por ex-ministros da saúde e por ex-presidentes do Conass, Conasems, ANS e ­Anvisa, a eleição de Lula/Alckmin representa hoje a única possibilidade de fortalecer e promover avanços no SUS e implementar políticas intersetoriais que enfrentem os determinantes sociais que afetam diretamente a saúde da população.

Entre esses determinantes podemos citar o enfrentamento da insegurança alimentar, do desemprego e da queda de renda e da destruição do meio ambiente – situações que, ao lado das consequências prolongadas da pandemia de Covid-19, degradam as condições de vida e têm repercussões profundas no nosso sistema de saúde.

Uma tarefa primordial do próximo governo será reconstruir o pacto interfederativo, solidário e cooperativo, e retomar a implementação do SUS, a partir de seus princípios constitucionais, como um compromisso cívico inadiável em defesa da vida. •

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1232 DE CARTACAPITAL, EM 2 DE NOVEMBRO DE 2022.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “Em defesa da vida”

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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