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Opinião

A educação como alvo histórico dos golpes de Estado

Para Gilson Reis, no enfrentamento ao desmonte da educação é fundamental a participação popular

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Por Gilson Reis, coordenador geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino

A educação é um alvo histórico dos golpes de Estado no Brasil. Logo após nosso primeiro Plano Nacional de Educação (PNE), em 1937, houve o golpe do Estado Novo e o plano foi suspenso; em 1962, o segundo PNE, e o golpe militar de 64 o suspendeu. Agora, três anos após a adoção do novo PNE, o golpe que colocou Temer na Presidência acabou com ele, especialmente com a Emenda Constitucional (EC) 95, que congela os investimentos públicos, especialmente para a educação, por 20 anos, mas também com as medidas adotadas pelo Ministério da Educação (MEC), como a que tirou as entidades populares – Contee inclusive – do Fórum Nacional de Educação, a reforma trabalhista e o projeto de reforma da Previdência, que atingem duramente os profissionais do setor. Nossa resposta só pode ser a luta. A Conferência Nacional Popular de Educação, Conape, em abril próximo, será um momento importante de resposta aos golpistas.

Cortando na carne

Ao tentar vender a falsa ideia de economia nos gastos públicos, o que a EC 95 fez foi tirar recursos da educação, da saúde, da segurança púbica, da assistência e de todas as políticas sociais — que não representam despesas, e sim investimentos — para aumentar os gastos mais nocivos para uma nação e benéficos para o setor financeiro: aqueles com juros e encargos da dívida pública.  Ela inviabilizou o Plano Nacional de Educação (PNE). Uma das metas principais do PNE, que determinava atingir 7% do PIB para o investimento na educação nos primeiros cinco anos, chegando a 10% ao final do período de dez anos, foi, na prática, revogada.

A nova lei trabalhista, que entrou em vigor em 11 de novembro do ano passado, liquidou direitos conquistados e lançou os assalariados e assalariadas à sanha do capital.  Além de precarizar a situação do trabalhador, ela também aumentará o abismo da desigualdade social no Brasil. Dá mais benefícios aos quem têm mais e tira de quem tem menos. A massa salarial não irá crescer, ou seja, não haverá crescimento econômico.

Uma decorrência imediata do fim da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que a reforma representou, foram as demissões em massa, já a partir de dezembro de 2017, nas universidades privadas. Foram mais de 1.200 professores da faculdade Estácio de Sá, 220 da FMU, 150 da Anhembi Morumbi, 60 da Universidade Metodista de São Paulo, 40 da Universidade Católica de Brasília, dentre outras.

Privatização da educação pública

Na Contee desenvolvemos o combate veemente à mercantilização da educação, expresso na campanha “Educação não é mercadoria”, lançada há dez anos. Nesta década de campanha — e antes dela — sempre denunciamos o comércio educativo, focando, primeiramente, na financeirização e oligopolização do ensino superior e, nos últimos anos, nos processos de privatização que têm atingido a educação básica.

No Brasil temos, na grande maioria das vezes, uma educação privada ofertada sem controle de qualidade e sem qualquer política de carreira para os docentes e os técnicos administrativos, precarização e falta de investimentos na estrutura. É um imenso mercado aberto aos interesses econômicos e financeiros. Serve a esse mercado, por exemplo, a reforma do ensino médio, que deixa o caminho livre para a ingerência empresarial na rede pública. Serve também o novo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), que beneficia tanto as grandes editoras de material didático — onde impera o capital estrangeiro —, quanto as apostilas feitas por instituições privadas e, muitas vezes, adotadas por estados e prefeituras sem nenhuma forma de licitação.

Nos últimos anos, diversas fusões provocaram o desaparecimento de um sem número de pequenas editoras, ao passo que há uma concentração cada vez maior nas mãos no capital estrangeiro — no caso, sobretudo, o capital espanhol do grupo Santillana (que já foi, inclusive, oferecido ao grupo Kroton).

A educação, com a conivência e a cumplicidade de Temer, transformou-se em simples mercadoria, de baixíssima qualidade, no seu nível superior. Este, hoje, é dominado por grandes grupos econômicos, sem qualquer compromisso com a construção da cidadania e com o desenvolvimento social. Tais grupos, que se concentram no Kroton/Anhanguera – com cerca de 20% de todas as matrículas -, Estácio de Sá, Ser Educacional, Anima e Unip, somente têm compromisso com o lucro farto e fácil.

Defesa da democracia e da justiça social

A Contee é autora da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) que suspendeu a Lei da Mordaça no Estado de Alagoas, e repudia essa e todas as tentativas de calar e censurar o magistério. Nossa atuação se dá no combate à criminalização de professores e professoras e na defesa de uma educação verdadeiramente crítica, democrática e cidadã. Projetos como essa lei, que se esconde sob o nome de “Escola sem Partido”, ganham espaços em uma sociedade com fortes traços fascistas e em um país que vive em estado de exceção após o golpe político-jurídico-midiático na destituição de um governo eleito pelo povo.

Quando o processo de impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff transitava no Congresso, a Contee participou do Comitê Nacional de Educação Contra o Golpe — Fora Temer, em Defesa da Democracia, Nenhum Direito a Menos. A mobilização da Confederação e entidades filiadas pelo Fora Temer é permanente, desde a posse do golpista. Em visitas às escolas, panfletagens, atos públicos, greve e dias de luta nacionais, denunciamos as ações criminosas dos golpistas, como a desprofissionalização do professor, as privatizações, as reformas trabalhista e da Previdência, a mercantilização do ensino, o desmanche das políticas sociais e das instâncias democráticas e de participação popular e o direito do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva ser candidato nas eleições de 2018. Neste ano, somamos a essas atividades a defesa do voto em candidatos a parlamentares, governadores e presidente comprometidos com os trabalhadores, a soberania, a democracia e o desenvolvimento econômico e social.

Um novo Brasil é possível

A educação tem papel central na construção de uma nação democrática, próspera e solidária. Ensinou Rui Barbosa: “Todas as leis protetoras são ineficazes para gerar a grandeza econômica do país; todos os melhoramentos materiais são incapazes de determinar a riqueza, se não partirem da educação popular, a mais criadora de todas as forças econômicas, a mais fecunda de todas as medidas financeiras”.

Defendemos a educação pública e gratuita, com qualidade e caráter científico, crítico e laico. Defendemos igualmente o controle público sobre o ensino privado, impedindo a sua desnacionalização. A educação superior tem caráter estratégico, acompanhada de investimento significativo e sistemático em pesquisa e inovação. A educação relacionada com o trabalho e o desenvolvimento é fator de superação da desigualdade social e o caminho para um país próspero e feliz. Um Brasil possível que, desejamos, esteja no centro do debate político deste ano e no compromisso dos novos parlamentares, governadores e presidente eleitos.

Gilson Reis, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee)

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