Alberto Villas

[email protected]

Jornalista e escritor, edita a newsletter 'O Sol' e está escrevendo o livro 'O ano em que você nasceu'

Opinião

Ele está sumindo

Talco era coisa que não faltava na minha casa – e se os cinco filhos não sufocaram com tanto talco, foi Deus.

Foto: AFP
Apoie Siga-nos no

A gente sabe muito bem que produtos vão e voltam. Muitos vão embora, somem do mercado, nunca mais voltam. O pirulito de chocolate da Kibon, por exemplo, este nunca mais deu as caras. Tem produto que a gente fica em dúvida se foi ou não foi. O Karo, por exemplo, achei que já estava fora do mercado há décadas.

Que nada! Outro dia vi uma meia dúzia de vidros meio escondidinhos num grande supermercado. Escondidinhos, mas estavam lá. Quem compra Karo em 2024, não sei.

Mas o meu personagem aqui hoje é o talco!

Talco era coisa que não faltava na minha casa – e se os cinco filhos não sufocaram com tanto talco, foi Deus. Era produto prioritário para deixar a filharada, não somente perfumada, mas livre de qualquer tipo de assadura.

Mas quem vê assim pode até achar que talco era coisa para criança. Não era. Sim, tinha o talco Johnson para crianças, mas era usado também por adultos. Tinha o Johnson e o York, concorrentes ferozes.

Mas a minha surpresa maior foi saber que o talco ainda existe. Será que só eu desconfiava que o talco tinha encerrado suas atividades?

Fui pesquisar e fiquei sabendo que o talco é um mineral argiloso, composto de silicato de magnésio hidratado com a fórmula química Mg3Si4O10 (OH)2. Tenho certeza de que a minha mãe não sabia disso.

Talco para ela não era nada disso, era simplesmente uma solução para queimaduras e para evitar queimaduras.

Quando eu falo que adulto também usava, é porque eu tinha uma tia que morava na cidade de Cataguases e cheirava talco.

Era uma consumidora voraz, viciada mesmo. Além de passar talco por todo o corpo todo depois do banho, ela costumava dar umas borrifadas nas gavetas do armário dela. Minha tia era uma espécie de garota propaganda ambulante do talco e jurava que era um santo remédio contra o chulé. Seus sapatos viviam pulverizados, brancos por dentro.

Minha tia andava tão contaminada de talco que quando ela entrava no elevador no térreo, já sabíamos que ela estava chegando. E olha que morávamos no décimo.

Já adulto, eu usava talco no rosto, antes de passar o barbeador elétrico. Diziam que era importante secar os poros. Não me lembro o dia em que eu, filho ingrato, abandonei o talco.

Vai ver que é porque não tenho filho pequeno, por isso estou achando que o talco já não está mais entre nós. Vai ver ele está bombando, que toda mãe tem em casa e usa todos os dias.

Se eu ainda estivesse na Folha, juro que ia propor fazer um Indifolha, mostrando a queda da venda do talco. Tenho certeza de que deve ser uma curva assustadora, um mergulho.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

ENTENDA MAIS SOBRE: , , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Um minuto, por favor…

O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.

Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.

Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.

Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.

Assine a edição semanal da revista;

Ou contribua, com o quanto puder.

Leia também

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo