Alberto Villas

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Jornalista e escritor, edita a newsletter 'O Sol' e está escrevendo o livro 'O ano em que você nasceu'

Opinião

Domingou

Domingo de eleição para mim é um dia sagrado. Não durmo na véspera

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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Eu me lembro bem, era início de mil novecentos e sessenta e quatro, quando o meu pai arrancou o adesivo plástico JK 65 do vidro traseiro da sua Rural Willys vermelha e branca, ano 1963.

JK 65 não havia mais para nós e seus enormes temores fizeram com que meu pai esfregasse uma flanela com álcool no vidro, para não deixar sombra de dúvida.

Uma tristeza grande tomou conta da família inteira quando ele guardou no cofre aquele adesivo que melava um pouco, culpa do sol de Brasília.

O meu pai estava certo. Não houve mesmo JK 65, nem 66, nem 76, quando ele morreu no meio do caminho. Só tivemos eleição em 1989, quando os brasileiros elegeram um caçador de marajás que, pouco tempo depois, caiu a ficha que era fake.

Nesse meio tempo amargamos tempos sombrios, prefiro chamar de tempos sombrios ao invés de anos de chumbo. Ou amargos.

Veio mil novecentos e sessenta e oito, a juventude colocou o mundo de cabeça para baixo e o Brasil fechou ainda mais. A morte do estudante Edson Luís, na porta do Calabouço, me deixou em alerta e quando foi 1972, fui-me embora do meu país.

Voei nas asas da Varig, com a promessa de só cortar o cabelo quando a ditadura militar acabasse. Promessa comprida até 1980, quando voltei nas asas da abertura e cortei aquela juba de leão, substituindo-a por um corte rente, espetado, quase punk, moda na época.

Desde 1986, passamos a votar regularmente, sem grandes problemas. Veio o Collor, depois o Itamar, o Fernando Henrique, o Fernando Henrique de novo, o Lula, Lula novamente, Dilma, repeteco de Dilma até que veio o golpe e assumiu o Temer.

Depois de Temer, começou o pesadelo, chegamos a esse ponto que chegamos.

Domingo de eleição para mim é um dia sagrado. Não durmo na véspera. Voto no Colégio Rio Branco, em Higienópolis, ninho de tucanos.

Com uma camisa vermelha, as senhoras me olham meio torto e balançam a cabeça negativamente. Eu saio feliz da vida e a democracia continua de pé.

Este ano, mais ou menos.

Com passos firmes desço a Avenida Angélica, rumo à Lapa, onde moro. Venho pensando num velho grito de guerra da Frente de Libertação de Moçambique, a FRELIMO, durante a guerra de independência do país, em 1975.

A luta continua!

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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