Vitor Marques

Advogado, sócio do escritório Caires, Marques e Mazzaro advogados, mestre e doutorando em Direito pela PUC-SP.

Opinião

Democracia no governo e autoritarismo na oposição

Autoritarismo tem um contingente considerável de pessoas mobilizadas na sociedade, representantes no Congresso Nacional e governadores

Foto: Sergio Lima/AFP
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A Constituição Federal de 1988 no Brasil consagrou valores, princípios, objetivos e horizontes que haviam sido aniquilados pela Ditadura Militar, tendo como pressuposto um consenso amplo, geral e irrestrito: a democracia.

Naquele momento, ao custo de muitas lutas e vidas, era razoável supor que a democracia estaria acima qualquer disputa político-ideológica – sendo, em verdade, a garantidora para que as divergências, de todas as naturezas, tivessem vez e voz na sociedade.

Trinta anos depois, o que parecia absoluto foi relativizado ao extremo. Entre 2019 e 2022, o Brasil sofreu agressões culturais, sociais, ambientais, econômicas e às liberdades individuais que testaram a capacidade de resiliência da nossa democracia e das instituições de Estado.

Considerando a obra Como as Democracias Morrem, de Daniel Ziblatt e Steven Levitsky, pode-se concluir que a maioria da sociedade brasileira, em especial os agentes políticos, falharam em não impedir que um projeto autoritário, liderado por um neófito na política nacional, tivesse condições de disputar e vencer uma eleição Presidencial. Foi necessário ver para crer.

Com a semeação de valores que geram a destruição – das relações sociais, das instituições e de políticas públicas – e com a prática de atos concretos – discursos, atos normativos, cooptação de parcela de órgãos de Estado (Forças de Segurança Pública, GSI, Forças Armadas) a resistência da Carta Cidadã, em sua forma e conteúdo, experimentou o seu limite e suportou um fenômeno novo: valores e atos que desejavam o seu suicídio.

Com a vitória do Presidente Lula em 2022, o mínimo de normalidade se impõe, cessando a existência de um governo odioso à Constituição. Como consequência, o autoritarismo foi deslocado e se faz presente em parte da oposição, além de ainda estar camuflado de patriotas, em alguns órgãos de Estado. Se antes o autoritarismo tinha à disposição todos os instrumentos, endosso e a estrutura da União para agredir a Democracia, nesse momento, possui um contingente considerável de pessoas mobilizadas na sociedade, representantes no Congresso Nacional e Governadores, os quais foram eleitos abraçados com o bolsonarismo, mas sem a estrutura estatal que antes possuía.

Se a democracia suportou toda a força da Presidência da República agredindo-a, nesse novo ciclo histórico que se inicia é vital não desdenhar e não errar na dimensão do problema que a sociedade brasileira viveu nos últimos anos, e, assim, com muito diálogo, paciência, convencimento e amplitude, aglutinar todas as forças democráticas e, ao mesmo tempo, extirpar os valores autoritários, sem margem para conciliação.

Se, por uma questão de boa-fé, houve alguma dúvida sobre as consequências que o governo Bolsonaro representaria para o País, depois de tudo o que ocorreu, não existe esta possibilidade. Se o 8 de janeiro aconteceu com Presidente Lula no governo, imagine-se com Bolsonaro o que poderia ter sido.

O trabalho da sociedade civil organizada, movimentos sociais, partidos políticos, oposição, situação, conjunto dos agentes políticos e públicos é criar as condições para que esta tragédia fique restrita aos quatro anos, como mais um acidente da história brasileira e não se repita.

O bode foi retirado da sala, resta substituir o odor deixado do autoritarismo pelos ares da Democracia, no governo e em toda oposição e, deste modo, reconstruir o consenso.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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