Luana Tolentino

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Mestra em Educação pela UFOP. Atuou como professora de História em escolas públicas da periferia de Belo Horizonte e da região metropolitana. É autora dos livros 'Outra educação é possível: feminismo, antirracismo e inclusão em sala de aula' (Mazza Edições) e 'Sobrevivendo ao racismo: memórias, cartas e o cotidiano da discriminação no Brasil' (Papirus 7 Mares).

Opinião

Cotas da esperança

Apesar de todo horror que nos cerca, de toda ameaça de destruição, é tempo de ter esperança

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Escrevo com alguns dias de atraso. As duas últimas semanas foram muito intensas: viagens, finalização do meu primeiro livro, além da elaboração de provas e trabalhos. Mais um ano letivo se aproxima do fim.

De todo modo, compartilho a mensagem que recebi na noite do dia 28 de outubro, que sempre será lembrada como mais uma “página infeliz da nossa história”.

É difícil descrever o que senti quando li. Posso dizer que a tela do meu celular ficou completamente embaçada. Sem sombra de dúvidas, é uma das coisas mais bonitas que já recebi em toda a minha vida.

Lucas* foi meu aluno em 2012 (!). Jamais me esqueceria dele. Jamais! Inteligente, generoso, extremamente organizado, participativo. Ele era tudo isso e muito mais.

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Não há o que perdoar. Não há. Naquela época, ele estava envenenado pelo mito da democracia racial e pelo discurso da meritocracia, que culpabilizam negros e pobres pela condição de exclusão em que se encontram.

As palavras do Lucas* dizem muito do que tenho tentado ser e fazer nos últimos anos. Às vezes, acerto. Às vezes, tropeço. Mas não desisto de tentar.

E não é só. Penso que a mensagem do meu ex-aluno diz muito sobre o momento que estamos vivendo. É tempo de semear. É tempo de acreditar que a semeadura dará bons frutos.

Apesar de todo horror que nos cerca, de toda ameaça de destruição, é tempo de ter esperança.

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Olá, Luana! tudo bem?

Não sei se vai lembrar de mim, mas fui seu aluno no terceiro ano do Ensino Médio na Escola Alizon Themóter Costa.

Lembro que na época você nos deu uma atividade na qual deveríamos fazer uma redação sobre as cotas para negros. Não me lembro exatamente das palavras escritas, mas me lembro que, por ignorância e preconceitos enraizados, escrevi contra as cotas.

Hoje vejo o quão errado foi aquele texto! Hoje enxergo o quão necessária é a existência de cotas raciais em universidades e o que isso representa!

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Diante disso, queria te pedir perdão por aquele texto e por todas as outras atitudes escrotas que eu tive com você, que no fundo representavam um preconceito velado!

Hoje tenho me desconstruído e tentado reconstruir muitos valores… o caminho ainda vai ser longo, pois ainda há muito o que mudar em mim mesmo. E por mais difícil que seja, sei que vou conseguir!

Além de te pedir perdão, quero te agradecer por, enquanto pessoa e enquanto mestre, fazer parte da minha desconstrução.

Obrigado por ser essa mulher negra, empoderada, de resistência, que acredita e luta por um país melhor!

Hoje estou cursando o último período de Engenharia Química, sou bolsista do ProUni, cotista e homossexual.

Além disso, pretendo me especializar cada vez mais e me tornar professor, pois é onde eu me vejo daqui a alguns anos e a única coisa que acho que tenho talento para ser.

Durante essa semana me lembrei de você e achei necessário me retratar!

Obrigado!

Lucas

Ps: A mensagem foi publicada mediante autorização do Lucas*

Luana Tolentino é mestra em Educação pela UFOP. Há 10 anos é professora de História em escolas públicas da periferia de Belo Horizonte e da região metropolitana da cidade. Suas práticas pedagógicas partem do princípio de que é preciso construir uma educação antirracista, feminista e inclusiva, comprometida com o respeito, com a justiça e com a igualdade.

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