Alberto Villas

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Jornalista e escritor, edita a newsletter 'O Sol' e está escrevendo o livro 'O ano em que você nasceu'

Opinião

Como vai minha aldeia?

Estava ali, em pleno Peloponeso, pisando nele, sentindo o calor do sol grego, o cheiro de frutas, alfazema e lavanda

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Há um ano, chegávamos de mala e cuia na aldeia de Vryses, no Peloponeso, dispostos a passar uma temporada. Conhecia o Peloponeso dos livros de Geografia, do Atlas Mundial Melhoramentos e das arguições que os Irmãos Maristas nos submetiam nos finais de mês.

Agora estava ali, em pleno Peloponeso, pisando nele, sentindo o calor do sol grego, o cheiro de frutas, alfazema e lavanda.

Subimos de carro, bem devagarinho, durante quinze minutos, uma montanha cheia de curvas até chegarmos a casinha onde moraríamos.

Fomos recebidos com champanhe e flores. Uma salada de tomates maduros, azeitonas pretas e queijo feta, tudo regado ao melhor azeite do mundo. Flores secas espalhadas pelos cômodos, muitas frutas na fruteira, iogurte natural e ovos caipira no balaio.

Aquilo era a mais perfeita tradução da Grécia, sem tirar nem por.

Na primeira manhã, saímos para conhecer a aldeia e alguns moradores. Colhemos flores amarelas e nos deparamos com árvores frutíferas carregadas de damascos, limões sicilianos, maçãs, peras, uvas, figos quase maduros e as primeira cerejas.

O dia terminou com um por do sol vermelho e deslumbrante, lá embaixo mergulhando no mar Egeu.

Vryses tem pouco mais de setenta habitantes, todos gregos, quase todos idosos e que falam uma única língua, aquela que costumamos brincar.

– Você acha que estou falando grego?

Aos poucos, fomos conhecendo seus moradores. Tia Margaritae, no auge dos seus 90 anos, de olho em toda a aldeia, na vida que cada um leva. Dimitre, o professor de física que passa bom tempo do dia em seu escritório transbordando de livros de filosofia, um olho em Kant, outro no computador com as imagens de oito câmeras espalhadas por seu latifúndio. Nunca entrou um ladrão ali. Mas na tela dá pra ver formigas levando folhas para dentro do formigueiro.

Vick, mulher do professor, que nos serviu um café grego autêntico, acompanhado de biscoitinhos que ela mesmo amassa a massa e coloca no forno.

Tio Fux, que não me lembro o nome, mas que ganhou esse apelido devido a aparência com o juiz do STF, com aquele topete suntuoso e um charme de Zé Bonitinho. Conhecemos tio Fux montado numa motocicleta Jawa empoeirada, com cara dos anos 1960.

Conhecemos os donos do Café do Moinho com sua horta orgânica, seus petiscos deslumbrantes e um chá dos deuses.

Conhecemos Heleni, a dona do restaurante onde os velhos amigos passam a tarde tomando café gelado e contando as novidades de Vryses. Ela nos serviu tzazik e um cabrito que estava desfiando no prato, com temperos locais, de comer de joelhos.

Conhecemos pessoas que não ficamos sabendo o nome, pessoas que nos ofereciam pepinos, cebolas e verduras no meio do caminho, enquanto caminhávamos para conhecer a plantação de oliveiras.

Em um mês em Vryses, peguei várias vezes na enxada para tirar o mato que cresce sem parar na redondeza da casa, pintei a calçada com cal branco, em desenhos à moda grega, colhi figos agora maduros e derretendo das mãos, escrevi algumas páginas do meu novo livro, roubei internet do vizinho e fiz uma salada de celeri, como os franceses.

Colhi limões pra temperar a salada, damascos com uma cestinha de pescar, fotografei o que via de bonito e pequei tomando uma Fanta Goiaba, mesmo sabendo do teor de açúcar. Andei quilômetros a pé, tomei banho no Mar Egeu, comi muito souvlaki, muito gyros, tomei muita cerveja Mythos, muita cerveja Alfa e sonhei muito.

Um dia voltei pra São Paulo e hoje estou aqui em meio a automóveis, engarrafamentos, fumaça e motocicletas. Mas o sonho ainda não acabou.

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