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Opinião

Como combater o autoritarismo em tempos de Bolsonaro?

Notas de repúdio, por mais importantes que sejam, não vão deter governos autoritários

Foto: Paulo Pinto/Fotos Publicas Foto: Paulo Pinto/Fotos Publicas
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Por Tulio Malaspina*


Uma pergunta volta e meia surge nos grupos e movimentos da sociedade civil: como combater o autoritarismo em tempos de governo Bolsonaro? Já escutei mais de uma centena de respostas para essa pergunta. “É preciso fortalecer o advocacy”, “ir às ruas”, “escalar o ativismo”, “criar uma lei de combate às fake news”, “disputar a narrativa em grupos de Whatsapp e Facebook”. Todas estas ações precisam ser mantidas, pois sustentam os pilares democráticos, mas é preciso adicionar novas estratégias para disputar a batalha que vivemos hoje. Muito além das ações de resistência é preciso ter estratégias sólidas de construção de estabilidade de longo prazo.

Ações recentes como o Movimento Estamos #JUNTOS, #somos70porcento ou o Manifesto Basta! demonstram uma importante resistência popular ao autoritarismo de Bolsonaro, mas surtem pouco efeito quando não há representantes políticos capazes levar essas manifestações adiante. Vamos esperar a boa vontade de Rodrigo Maia para conter os autoritarismos? Não. É preciso rever as estratégias de atuação e encontrar caminhos legítimos de construção do legislativo e executivo que queremos.

A sociedade civil organizada precisa sair do lugar de ator externo à política institucional e mostrar que também é parte integrante da política, não só em posicionamentos, cartas abertas e manifestos de defesa, mas também na construção do legislativo e do executivo que serão capazes de representar as nossas agendas. O agronegócio tem o apoio de uma bancada com mais de 200 deputados federais. Um setor organizado da igreja evangélica trabalhou na última década para montar sua bancada e já ultrapassam de 200 deputados federais comprometidos com suas ideias. E as bancadas dos direitos humanos, da educação, da saúde, do meio ambiente ou de representantes de movimentos negros, indígenas e quilombolas? Nem juntas formam a força política desses outros grupos.

Como, num cenário onde o poder executivo é a principal ameaça à democracia, vamos conseguir avançar em algo? Como, numa casa legislativa em grande parte capturada pelo lobby de grupos e empresas, vamos conseguir avançar em pautas de justiça social? Como, num contexto em que a propaganda política está acima da verdade e no qual o negacionismo científico e de dados está presente em todas as esferas do poder, vamos construir uma política baseada em evidências, ciência e bem-estar?

Notas de repúdio, por mais importantes que sejam, não vão deter governos autoritários. E história mostra que não há diálogo com esses governos. Ou disputamos a institucionalidade e ocupamos o poder pelas vias democráticas sem aderir às mesmas práticas que reforçam a lógica de polarização e políticas de mudança limitada, ou continuaremos batendo à porta sem respostas.

A sociedade civil organizada precisa compreender esse novo contexto antes que seja tarde para reverter o retrocesso em curso. É preciso que as ideias de justiça e democracia ganhem espaço na política institucional e na sociedade e que as organizações se envolvam na disputa eleitoral em todos os níveis. A ideia de que a sociedade civil deve manter-se isenta ou distante da política precisa ser revista urgentemente. O cenário atual pede que façamos política!

O melindre do envolvimento político não pode deixar que a política se torne instrumento de destruição da democracia. É preciso que as organizações, movimentos, grupos e todo o campo democrático construam estratégias para garantir representantes que sejam incansáveis defensores da democracia e do bem-estar social.


*Tulio Malaspina é diretor executivo do Instituto Update, organização da sociedade civil que pesquisa e fomenta a inovação política na América Latina com o objetivo de fortalecer a democracia na região.

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