Economia
China: crescer é o que importa
A prudência é, porém, recomendada. Não há capital disponível para uma rápida expansão


Em 2023, a China vai concentrar-se intensamente no crescimento. Dadas as condições gerais, como o impacto das interrupções e bloqueios da Covid, a queda no mercado imobiliário e a incerteza da economia global, entregar crescimento neste ano é o objetivo principal inequívoco e esmagador.
Não se trata de nenhum segredo de Estado. A prioridade dada ao crescimento ficou bem clara na Conferência Central de Trabalho Econômico, reunião realizada em meados de dezembro para considerar as perspectivas econômicas e definir políticas para 2023. Como esperado, seguiu as diretrizes da mais recente reunião do Politburo: mais políticas pró-crescimento e pró-negócios, para colocar a economia chinesa de volta nos trilhos.
Vejo diretrizes para estimular a expansão do PIB por meio de múltiplos fatores. Começa com a estabilização da economia, em sequência vem a expansão da demanda doméstica e a abertura contínua de alta qualidade no comércio e na liberalização do investimento. Requer uma coordenação mais forte entre o crescimento qualitativo e quantitativo, entre a reforma estrutural do lado da oferta e a expansão da demanda interna e entre as medidas e outras políticas.
Estas deveriam ser as diretrizes: (I) manutenção da política monetária prudente e aprimoramento da política fiscal proativa; (II) promoção dos negócios privados, especialmente empresas de plataformas tecnológicas, pequenas e médias, nacionais e estrangeiras; (III) apoiar o mercado imobiliário com políticas pró-propriedade; e (IV) restabelecer a confiança do consumidor e aumentar o consumo. Obviamente há incerteza e risco, e é bom que o governo seja sincero e cauteloso. A economia enfrenta várias pressões: enfraquecimento das expectativas, contração da demanda, choque de oferta, surtos de Covid e ambiente global turbulento.
Segundo o consenso dos economistas globais, a China almeja crescimento do PIB superior a 5% neste ano, talvez até 5,5%, à medida que retornar à sua taxa de crescimento potencial sustentável no médio prazo. Os próprios economistas globais estimam resultado pouco menor, abaixo de 5%, o que ainda seria um aumento saudável em relação a 2022. O PIB chinês aproxima-se de 20% do produto mundial, por isso o resto do planeta acompanha com atenção o desempenho do país.
A estratégia de política monetária prudente e política fiscal proativa foi estabelecida pela Conferência Central de Trabalho Econômico. Embora priorizem o crescimento, eles permanecem vigilantes e aconselham que a política monetária continue a fornecer liquidez suficiente sem atiçar a inflação. Da mesma forma, embora a política fiscal seja proativa, não haverá estímulos maciços, portanto, o crescimento pode ser feito com qualidade e de forma eficiente.
As autoridades da China têm bons motivos para apostar na cautela. A dívida imobiliária é insustentável e, após três anos de rígidos controles da Covid, os recursos do governo, assim como os das famílias e empresas menores, foram esgotados, limitando a quantia de capital disponível para uma rápida expansão. Além disso, as receitas do governo local foram prejudicadas pelo declínio imobiliário e pela queda na arrecadação de impostos, enquanto a queda nos preços das casas reduz o poder de compra do consumidor e a disposição para gastar.
Os líderes da China acertam ao manter o risco financeiro no topo de sua lista de preocupações e, com razão, temem que um grande estímulo possa ser explorado por especuladores, especialmente no setor financeiro (mercado de ações, bancos, fintech) e no setor imobiliário, e, portanto, ser mais prejudicial do que útil. Na verdade, o setor imobiliário precisa de mais desalavancagem, não do contrário.
Ao sinalizar uma política fiscal proativa para 2023, com “gastos fiscais mantendo a intensidade necessária”, o governo tenta garantir a sustentabilidade fiscal por meio do controle dos riscos da dívida dos governos locais, otimizando déficits orçamentários, títulos para fins especiais e subsídios de taxas de juro (de que os governos locais precisam porque precisam contar com financiamento de alto custo) e aumentando os pagamentos de transferências do governo central aos locais.
Tradicionalmente, a China mantém seu déficit fiscal abaixo de 3% do PIB, mas pode ser liberado um leve aumento desse porcentual neste ano. É sensato escolher o menor dos males: absorver um aumento do déficit no curto prazo, para garantir a estabilidade do crescimento no longo prazo. •
PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1246 DE CARTACAPITAL, EM 15 DE FEVEREIRO DE 2023.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “China: crescer é o que importa”
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