

Opinião
Brasil em chamas: a crise que coloca em risco nossas florestas
A crise ambiental que enfrentamos hoje está profundamente enraizada em uma história de exploração e negligência, onde os poderosos continuam a lucrar às custas dos mais vulneráveis


O Brasil enfrenta uma crise ambiental cada vez mais alarmante. As queimadas descontroladas na Amazônia e no Pantanal são sintomas visíveis de um problema mais profundo: o desmonte das políticas ambientais, intensificado durante o governo Bolsonaro. Em São Paulo, 48 municípios estão em alerta máximo devido aos focos de incêndio, e a fumaça das queimadas na Amazônia já se espalhou pelo país, alcançando até os estados do Sul. A proteção de nossas riquezas naturais, que deveria ser uma prioridade nacional, foi relegada a segundo plano, enquanto interesses econômicos avançam desenfreadamente.
A expressão “passar a boiada”, utilizada pelo ex-ministro Ricardo Salles, simboliza o desmantelamento sistemático das políticas ambientais. Durante a pandemia, o governo flexibilizou as regulamentações ambientais para priorizar o lucro em detrimento da conservação. Como resultado, as queimadas se intensificaram, o garimpo avançou e grandes extensões de terras foram devastadas, comprometendo a biodiversidade e a saúde do planeta.
Os ativistas que lutam para manter a floresta em pé enfrentam desafios crescentes. Sem a proteção jurídica e física adequadas, esses defensores da natureza são perseguidos, ameaçados e muitas vezes silenciados. O Brasil, detentor de um dos ecossistemas mais ricos do mundo, está à mercê de grupos que veem a floresta como um obstáculo ao lucro. Enquanto as matas ardem, esses ativistas continuam seu trabalho, mesmo sem o suporte necessário. Simultaneamente, interesses privados minam as políticas de conservação e colocam em risco o futuro de nossas áreas naturais.
O caso de Alter do Chão, na Área de Proteção Ambiental (APA) do Pará, é emblemático dessa luta. Em 2019, brigadistas voluntários arriscaram suas vidas para proteger a floresta e combater incêndios devastadores. Em vez de serem auxiliados, foram presos sob acusações infundadas, exemplificando a criminalização de quem luta para preservar o meio ambiente. Esses eventos reforçam a urgência de proteger nossos ecossistemas e garantir a segurança dos que os defendem. A falta de proteção, aliada à insegurança jurídica e física, intensifica a destruição dos nossos biomas.
A Amazônia e o Pantanal, fundamentais para o equilíbrio ambiental global, estão em risco iminente. A extensão de mais de 500 km de queimadas na Amazônia evidencia o fracasso das políticas atuais em proteger esses territórios. A devastação da biodiversidade no Brasil contribui significativamente para a crise climática que afeta todo o planeta.
Neste contexto, é importante lembrar o legado de Dorothy Stang, cuja luta por justiça climática no Brasil marcou um ponto de virada para muitos. Contudo, mesmo após tantos sacrifícios, o compromisso político com o clima no país ainda está muito aquém do necessário. Tanto gestões de esquerda quanto de direita falharam em agir com a devida seriedade. Comunidades quilombolas, indígenas, ribeirinhas e assentadas são fundamentais para a preservação dos nossos biomas, mas continuam desprotegidas e marginalizadas.
No ano que vem, em novembro de 2025, o Pará sediará a 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, a COP30. Este evento representa uma oportunidade decisiva para o Brasil demonstrar liderança nas discussões. No entanto, esperamos que o debate seja guiado pelas vozes dos que mais entendem do assunto: as populações tradicionais e as lideranças que têm lutado por justiça social e climática. Que os corredores da COP30 sejam tomados pelo clamor daqueles que têm defendido a floresta com suas próprias vidas. É urgente a construção de uma rede de articulação política que una lideranças da pauta climática, organizações do terceiro setor e tomadores de decisão, para que esta conferência seja um marco.
A crise ambiental que enfrentamos hoje está profundamente enraizada em uma história de exploração e negligência, onde os poderosos continuam a lucrar às custas dos mais vulneráveis. Assim como os herdeiros das capitanias hereditárias moldaram o Brasil com base na exclusão e na desigualdade, os atuais defensores do lucro perpetuam um ciclo de destruição que ameaça não apenas nossas florestas, mas todo o nosso futuro.
Diante desse cenário, revisar as políticas ambientais do Brasil e romper com o legado de destruição secular é uma questão de sobrevivência, não apenas de justiça. A Amazônia, frequentemente chamada de pulmão do mundo, é também o pulmão do Brasil, de cada um de nós. O que ocorre nas florestas brasileiras impacta diretamente a saúde do planeta e a nossa própria existência. Essa sobrevivência ameaçada exige uma luta intensa. Não apenas pela Amazônia e o Pantanal, mas por um país onde a vida, a justiça e a dignidade sejam prioridades inegociáveis. A floresta em pé é o nosso grito de resistência, o sopro de um Brasil que ainda pode respirar.
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.
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