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Opinião

Brasil e China precisam fortalecer a cooperação de conhecimento e tecnologia

‘Países devem manter a unidade e a cooperação, numa visão de curto, médio e longo prazo’, escreve Marcio Pochmann

O presidente da China, Xi Jinping, ao lado do presidente Jair Bolsonaro. Foto: Alan Santos/PR
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A questão externa constituiu uma das peças centrais do ato de revisitar o passado, tratar o presente e, sobretudo, projetar o futuro do Brasil. A começar pelo seu aparecimento no século 16 enquanto colônia de um dos principais impérios em disputas durante a afirmação do capitalismo comercial.

Na sequência, a sua ascensão pela independência nacional transcorrida no início do século 19, quando as bases da acumulação primitiva do capitalismo europeu consolida a hegemonia inglesa como a oficina do mundo. Quase duas décadas após a Depressão econômica originada em 1873, que atingiu fortemente o Reino Unido, o Brasil se inseriu tardiamente no sistema capitalista mundial na condição periférica, cada vez mais inspirada na experiência estadunidense.

Tanto assim, que após tergiversar entre a Alemanha e os Estados Unidos em guerra pela sucessão hegemônica na prolongada decadência inglesa, o Brasil sustentou o notável ciclo da industrialização e urbanização nacional durante a Guerra Fria (1947-1991) do lado estadunidense. A partir daí, o Brasil passou a se reposicionar no interior da Divisão Internacional do Trabalho.

Outrora situado na sexta maior indústria de transformação do mundo em 1980, o Brasil assumiu a 16a posição na produção manufatureira mundial em 2019, segundo a organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (Unido). Em compensação, a economia brasileira transformou-se no 3º maior exportador de produtos agrícolas do mundo, atrás apenas da União Europeia e dos Estados Unidos, conforme revela o relatório do Estado de Mercados de Commodities Agrícolas da FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations).

Ao longo dos últimos cinco séculos, o Brasil despontou com três grandes interlocutores comerciais condicionados pelo oceano Atlântico e fundamentado pelo Ocidente. Nos primeiros trezentos anos do período colonial, por exemplo, o Brasil esteve submetido ao exclusivismo comercial com a metrópole portuguesa.

Da chegada da família real, em 1808, ao fim da República Velha, em 1930, a Inglaterra sustentou-se na condição de principal parceiro comercial, inabalável mesmo diante da independência nacional (1822), da abolição da escravatura (1888), do fim da monarquia (1889) e da República Velha (1889-1930). Da Revolução de 1930 ao final do governo do F. H. Cardoso (1995-2002) coube aos Estados Unidos exercer o protagonismo comercial externo.

Neste primeiro quarto do século, contudo, a China transformou-se no primeiro parceiro comercial brasileiro. Na composição dos investimentos diretos do exterior no país, a presença asiática tem aumentado consideravelmente, sem ressaltar ainda o quanto a Nova Rota da Seda se reestabelece enquanto a centralidade que a Eurásia passa assumir na dinâmica econômica mundial.

Ao se olhar diante do espelho, o Brasil não deve ter apenas sua própria imagem, mas de seu principal parceiro e do mundo. Deveria desconsiderar o seu papel estratégico no reordenamento da globalização imposto pela pandemia da Covid-19. A instabilidade exposta pelas cadeias globais de valor e pela fragilidade privada das grandes corporações transnacionais requer um Brasil recondicionado por suas potencialidades, não por suas fraquezas.

Essa tarefa apresenta-se a todos os brasileiros que amam o seu país acima de tudo. Sem perder o senso histórico, colocam-se à frente do seu tempo, encarando a terceira década do século 21 como a portadora do novo Brasil presente no mundo cada vez mais dinamizado a partir da Eurásia, das novas tecnologias e do sistema monetário pós-dólar.

O que coloca as relações do Brasil com a China no centro do debate e de ações práticas, pois os dois países precisam fortalecer a cooperação do conhecimento e tecnologia, bem como econômica, financeira, cultural e comercial. Parcerias que favorecem a revitalização conjunta de suas economias complementares, com foco no combate à pobreza e no desenvolvimento sustentável e tecnológico.

Mesmo neste ano de pandemia, comparado a 2019, a China aumentou em 14,05% suas compras do País (janeiro a setembro), o que totalizou 53,39 bilhões de dólares. Numa corrente comercial de 78 bilhões dólares. O que representa 34,11% do total exportado pelo Brasil. A perspectiva até o final deste ano é de crescimento recorde.

Manter a estabilidade e crescimento da corrente de comércio é base da recuperação pós-pandemia. O que abre oportunidades de mais investimentos, principalmente, em setores de saúde, com a vacina; na agricultura, com mais produtos industrializados; na área de energias renováveis e meio ambiente; nas tecnologias, como o 5G; entre outros.

A imagem do Brasil refletida ao mundo nesta conjuntura atual precisa ser dentro da realidade, mostrando quem é realmente seus parceiros. E quem, de fato, traz oportunidades concretas. A China também olha para o Brasil e o mundo.

Brasil e China devem manter a unidade e a cooperação, numa visão de curto, médio e longo prazo. Não abrir mão da defesa do multilateralismo e de seus povos.

Marcio Pochmann é professor de economia da Unicamp

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