

Opinião
Bolsonaro, Tarcísio e a costura impossível das direitas para 2026
Por três razões, deve prevalecer para Bolsonaro a opção ‘puro-sangue’ em uma eventual disputa contra Lula


Dando continuidade à série de análises sobre a política brasileira a um ano das eleições de 2026, este texto discute as estratégias das direitas para as próximas disputas eleitorais no Brasil. A primeira dimensão importante é “dar nome aos bois”. Isso significa identificar corretamente quem é a extrema-direita brasileira no plano político-partidário. Tornou-se comum ver análises na imprensa corporativa, e até de lideranças desse campo que recorrem a rótulos difusos, como “centro-direita”, para se referir à extrema-direita. Nesse escorregão, acabam incluídos, no mesmo saco, desde figuras que apoiam Lula, como o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD), e o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), até notórios apoiadores de Bolsonaro, como o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), e o vice-governador de Minas, Matheus Simões (PSD).
A confusão é proposital: trata-se de um movimento para disfarçar o autoritarismo bolsonarista que tenta retornar ao poder após a derrota nas presidenciais de 2022 e a tentativa de golpe do 8 de Janeiro. O bolsonarismo aparece com alta rejeição nas pesquisas quantitativas amplamente divulgadas e também nas qualitativas, como os grupos focais conduzidos pelo Observatório Político e Eleitoral (OPEL), ligado à UFRJ e à UFRRJ.
Esse esforço de camuflagem se aproveita da fragmentação partidária brasileira. Ao contrário do que ocorre em muitos países, aqui a extrema-direita não tem um único partido para chamar de seu. Metodologicamente, é preciso separar a extrema-direita liderada por Bolsonaro, que reúne lideranças de várias siglas com ele desde 2018, da direita tradicional, que se move conforme as circunstâncias locais.
Na extrema-direita com Bolsonaro estão, além do PL e do Novo, a direção do União Brasil, com seu presidente Antônio Rueda, o ex-prefeito de Salvador ACM Neto e o governador de Goiás, Ronaldo Caiado; a direção do Progressistas, com quadros como o senador Ciro Nogueira e o deputado federal Arthur Lira; e a direção do Republicanos, cuja maior representação é o governador de São Paulo e ex-ministro de Bolsonaro, Tarcísio de Freitas.
Já o MDB e o PSD ilustram a direita tradicional, com variações conforme o contexto regional e as preferências dos caciques. O PSD de Kassab é o partido que mais cresce no país, com os pés em três canoas: tem quadros que apoiam Lula, como o já citado Eduardo Paes, o senador baiano Otto Alencar e o senador mineiro Rodrigo Pacheco; outros que gravitam na extrema-direita, como o vice-governador de Minas e o governador do Paraná, Ratinho Jr.; e ainda lideranças da chamada “terceira via”, como o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, e a governadora de Pernambuco, Raquel Lyra. O MDB, por sua vez, abriga tanto figuras bolsonaristas, como o prefeito paulistano, quanto lulistas, como o governador paraense e a ministra Simone Tebet.
É na estratégia de relação entre esses dois campos que a extrema-direita se divide. Os operadores do sistema partidário defendem a candidatura de Tarcísio como a melhor forma de atrair MDB e PSD — lembrando que Gilberto Kassab é secretário do governador paulista. No roteiro desses articuladores, seria uma candidatura “de centro-direita”: apoiada por Bolsonaro, mas sem carregar a rejeição do ex-presidente. Já o grupo ligado à base militante, como Eduardo Bolsonaro, Michelle Bolsonaro e o deputado Nikolas Ferreira, prega uma candidatura “puro-sangue”, para manter coesa a ala mais radical do bolsonarismo.
Minha aposta é que, para Bolsonaro, prevalecerá a opção “extrema-direita puro-sangue” — e, além dele, surgirão outras candidaturas (Zema, Caiado e talvez Ratinho). Por três razões. Primeiro, porque o ex-presidente e sua família sabem que seu futuro político depende do sobrenome Bolsonaro nas urnas em 2026. Eles têm votos a perder se não forem protagonistas, e conhecem o desejo de líderes partidários de se livrar do peso de sua rejeição. Segundo, porque entenderam, desde 2024, que o eleitorado mais radical não aceita facilmente uma saída pactuada com a elite política tradicional. Essa foi a principal lição do fenômeno Pablo Marçal: Bolsonaro tem os votos, mas não os controla. Se ele (ou alguém de sua família) não organizar esse eleitorado, alguém o fará. Há, portanto, um espaço aberto para um “novo Marçal” em 2026, capaz de liderar esse segmento e, no limite, decretar o fim da centralidade da família Bolsonaro.
Terceiro, e não menos importante, é o cálculo do Tarcísio. É pouco racional, para dizer o mínimo, trocar uma disputa pela reeleição na condição de favorito por uma aventura contra um presidente em exercício e com popularidade ascendente. Tarcísio não precisa, e não vai, queimar a largada. Tem apenas 50 anos e tempo para se consolidar como quadro nacional com condições de disputar a Presidência. E, quem sabe, já livre de Bolsonaro.
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.
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