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Bolsonaro onde sempre esteve

Chegamos ao fim de agosto sem nenhuma mudança substancial das intenções de voto no ex-capitão, apesar do uso desbragado da máquina e da ‘guerra santa’

Bolsonaro onde sempre esteve
Bolsonaro onde sempre esteve
O ex-presidente Lula (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL). Fotos: Ricardo Stuckert e Alan Santos/PR
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Agosto está no fim e, a cada dia, fica maior o obstáculo à frente das ambições do capitão. O motivo é simples: o tempo passa e diminui a chance da improvável reação que o tornaria competitivo. Em razão de alguns resultados de pesquisas estaduais, atravessamos o mês na expectativa, a especular a respeito da possibilidade de Bolsonaro estar em uma curva de crescimento. Os números davam a sensação de que, talvez, algo se movesse na estrutura das intenções de voto.

Mas não era verdade (certamente, não na escala apregoada), como vimos a seguir, com pesquisas mais abrangentes e, ao que parece, mais capazes de caracterizar o cenário em São Paulo, Minas Gerais e no Rio de Janeiro, os principais colégios eleitorais do País. Em retrospecto, vivemos semanas de apreensões desnecessárias, de um lado, e esperanças ilusórias, do outro. De acordo com as pesquisas de dois institutos respeitáveis, Ipec e Datafolha (os únicos agraciados com a classificação “muito confiável” pela Folha de S.Paulo, em uma cômica promoção publicitária de empresa que integra seu grupo econômico), a vantagem de Lula é ampla a esta altura da eleição. Mais relevante, os resultados do Datafolha mostram que, entre a pesquisa anterior, iniciada em 27 de julho, e 18 de agosto, data da última, a distância entre ele e o capitão teria diminuído em somente 3 pontos porcentuais (quanto ao Ipec, como foi a primeira pesquisa nacional publicada pelo instituto, é impossível falar em tendências).

Os resultados de ambos confirmam a probabilidade de Lula vencer a eleição no primeiro turno, apontada pelo conjunto das pesquisas presenciais desde março, na média daquelas publicadas a cada mês. O quadro é estável: Lula sempre acima de 50% dos votos válidos, com ligeiras variações mensais, dentro das margens de erro. A respeito do segundo turno, as pesquisas são quase idênticas e revelam dois números especialmente relevantes: 1. Com 60% dos votos válidos, Lula estaria perto da maior vitória eleitoral de nossa história política, cerca de 25 milhões de votos a mais que Bolsonaro (somos 156 milhões de eleitores e é razoável esperar que haveria 75% de votos válidos em um segundo turno). 2. Do primeiro para o segundo turno, as intenções de voto em Lula aumentam 7 pontos porcentuais, enquanto aquelas do capitão crescem 5 (de acordo com o Datafolha) ou 3 (segundo o Ipec).

Nos institutos “padrão-ouro” da mídia, o quadro, a 40 dias da eleição, era este. Lula com vantagem suficiente para vencer no primeiro turno e ampla liderança no segundo, com crescimento de um turno para outro. Utilizando as expressões usuais: com piso elevado e teto mais alto que o capitão.

E os 3 pontos de crescimento de Bolsonaro que o Datafolha encontrou? São, para ele, uma boa ou má noticia? Passamos agosto a aguardar os efeitos de meia dúzia de fatores que, de acordo com o que apregoavam comentaristas e entendidos em pesquisa (duas das categorias profissionais que mais crescem no Brasil), mudariam o jogo. Imaginaram que a redução do preço dos combustíveis faria de Bolsonaro um “amigo” dos consumidores. Apostaram que os 200 reais adicionais do tal Auxílio Brasil lhe dariam a imagem de político preocupado com as aflições dos mais pobres. Acharam que ganharia votos por meio da distribuição a rodo de auxílios, de caminhoneiros a taxistas, idosos e quem mais passasse na porta do Tesouro Nacional. Supuseram que os velhos ranços contra Lula e o PT nas classes médias e entre os mais ricos seriam reinflamados com a aproximação do pleito, o que levaria muita gente a descer do muro, perder o pudor e se proclamar bolsonarista. Aguardavam um ­tsunami evangélico, com milhões de adesões à candidatura do capitão, provenientes da militância de pastores e bispos, genuína ou comprada.

O resultado final disso tudo foram os 3 pontos, tão perto da margem de erro que é impossível, a rigor, falar em crescimento. Ou seja, tudo, da diminuição do preço da gasolina ao Auxílio melhorado, das benesses para muita gente à redução do voto envergonhado e à mobilização das lideranças religiosas bolsonaristas, moveu 3% do eleitorado. Se é que moveu alguma coisa. •

PUBLICADO NA EDIÇÃO Nº 1223 DE CARTACAPITAL, EM 31 DE AGOSTO DE 2022.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título “Bolsonaro onde sempre esteve”

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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