

Opinião
Biodiversidade: o Brasil não lidera
Na COP-16, em Cali, o País chega de mãos abanando


A ONU promove três tipos de conferência das partes acerca das questões ambientais. Elas são denominadas pela sigla COP. Todos os países são convidados e as decisões são adotadas por consenso. As COPs dividem-se em conferência sobre as mudanças climáticas, a mais conhecida, desertificação e biodiversidade.
A COP-30, das mudanças climáticas, será em Belém do Pará, em novembro de 2025. Mas entre 21 de outubro e 1º de novembro, a ONU realiza em Cali, na Colômbia, a COP-16 da Biodiversidade. É legítimo dizer que, no caso da biodiversidade, a mais importante, até agora, foi a COP-15, no Canadá. A conferência aprovou o Quadro Global de Biodiversidade de Kunming-Montreal. E enfatizou o rápido declínio da natureza, que ameaça a existência de mais de 1 milhão de espécies e impacta a vida de bilhões de seres humanos.
As metas para 2030 visam deter a violenta degradação da natureza, além de salvaguardar a preservação da biodiversidade. Foram definidas 23 metas até 2030 e quatro até 2050. Dentre elas estão:
Conservação de ao menos 30% das terras, oceanos e áreas costeiras do mundo;
Restauração de 30% dos ecossistemas terrestres e marinhos;
Redução a quase zero da perda de áreas de alta importância para a biodiversidade;
Redução pela metade do desperdício global de alimentos;
Redução de ao menos 500 bilhões de dólares por ano em subsídios que prejudicam a biodiversidade;
Aumento de ao menos 200 bilhões de dólares anuais de financiamento à biodiversidade;
Proteção de polinizadores;
Partilha justa e equitativa dos benefícios do uso da biodiversidade;
Proteção dos direitos dos povos indígenas.
Assim como o Acordo de Paris, que prometia limitar o aquecimento global a 1,5 grau Celsius até o fim do século XXI em relação à temperatura medida da era pré-industrial, a COP-15 da Biodiversidade caminha para o fracasso. O mundo não alcançará essas metas. Ao contrário, a degradação e a destruição da biodiversidade planetária tendem a se acelerar.
O compromisso assumido pelos países em Montreal foi o de apresentarem na COP-16, em Cali, um plano nacional de preservação da biodiversidade. Somente 29 dos 191 países signatários do Marco Global da Biodiversidade apresentaram seus planos nacionais e esta é uma evidência do fracasso
Um expoente desse fracasso é o Brasil. A delegação brasileira chegou em Cali de mãos abanando. O Brasil está entre os 167 países que não apresentaram um plano nacional. Quer dizer: o Brasil não lidera a agenda ambiental global e tem colhido uma série de fracassos. A omissão do governo federal em relação às recentes queimadas faz parte desse quadro geral de derrotas que o governo Lula acumula na agenda ambiental.
Se até agora havia uma complacência com o governo por parte dos ambientalistas, especialistas e ativistas, ela deixou de existir. Os poucos avanços na demarcação das terras indígenas é um marco do descaso. A existência de vários territórios protegidos é condição fundamental para a preservação da biodiversidade.
O governo não fez pouco caso apenas nas demarcações. Não conseguiu sequer proteger as terras demarcadas, alvos de todo tipo de investidas criminosas e violentas por garimpeiros, madeireiros, caçadores, fazendeiros e predadores diversos que se associam às grandes organizações criminosas para atacar os territórios e seus povos.
Outra demanda fundamental do Marco da Biodiversidade é a de reduzir o uso de agrotóxicos. O Brasil continua a ser o campeão mundial de utilização de defensivos agrícolas, muitos dos quais proibidos em outros países. O desempenho do governo Lula em outras pautas também é sofrível: falta de metas na redução de combustíveis fósseis, ausência de leis de proteção dos oceanos (Lei do Mar), ausência de política nacional para combater a poluição do plástico, atraso em mais de 80% e retrocessos em algumas metas dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, pouca eficácia na redução do desmatamento total e ausência de um plano nacional de combate a incêndios.
Dessa forma, o Brasil perde a legitimidade de reivindicar a liderança global na agenda do desenvolvimento sustentável. As ações do Estado e do governo para proteger a natureza estão longe de ser satisfatórias. O próprio engajamento do presidente Lula na agenda ambiental no plano internacional tem se mostrado tíbio. O nosso vizinho, Gustavo Petro, presidente da Colômbia, é muito mais assertivo e contundente na defesa das causas ambientais. •
Publicado na edição n° 1334 de CartaCapital, em 30 de outubro de 2024.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Biodiversidade: o Brasil não lidera’
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.
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