

Opinião
Antes da Copa de 2026
O trabalho de Ancelotti está em processo e, quem sabe, a derrota para a Bolívia nos ajude a botar os pés no chão


A pausa da Data Fifa veio em boa hora, dando um respiro para a Seleção se garantir na Copa de 2026. Agora, é voltar à maratona de torneios e campeonatos, entrando na fase das decisões.
Primeiro, veio o jogo contra o Chile. Foi a estreia de Carlo Ancelotti em solo brasileiro – e o treinador, diga-se de passagem, deve estar cansado de tantas entrevistas.
O lado bom de ele se manifestar é o fato de diminuir assim o espaço para os comentários da imprensa que, antes da partida, chegaram a dar vergonha, tamanho o desrespeito com a seleção chilena.
Repetir à exaustão a expressão de mau gosto “tá ruim, chama o Chile” ignora a história de um adversário que, apesar da má fase, tem sua dignidade.
No futebol, não existe jogo ganho de véspera. A própria Seleção Brasileira não vinha de uma campanha exemplar.
Por isso, a vitória contra o Chile deixou uma impressão de redenção e reforçou a boa imagem de Ancelotti, que tem se mostrado um ótimo formador de grupo.
O treinador também contou com a sorte, aquela “sorte” que, como diria Nelson Rodrigues, é essencial para não ser atropelado por uma carrocinha de sorvete Kibon.
A sorte esteve presente no golaço de Estevão, que foi corajosamente escalado como atacante principal. Essa confiança só amplia o status de craque em evolução do garoto.
E, para completar, Lucas Paquetá marcou um gol antes dos cinco minutos de jogo, o que foi o melhor que podia acontecer para o jovem, atormentado pela situação que enfrentou na Europa.
O alívio foi evidente nas suas demonstrações de emoção, e o gol pode ser o começo de uma nova fase para ele – mais madura e sólida – na Seleção e na carreira.
Depois, veio o jogo contra a Bolívia, que trouxe o desafio da altitude. Ancelotti, com sinceridade, admitiu que buscaria conselhos de sua comissão técnica, mais experiente nesse tipo de situação.
A altitude é um tema polêmico, pois exige um sacrifício enorme e implica riscos para a saúde dos jogadores. Ele se justifica pelo simples argumento de que um time pode jogar em qualquer lugar do seu território.
O jogo contra a Bolívia, com a derrota brasileira, foi o resultado de uma conjunção de fatores: o desespero do time boliviano e a nossa situação de já estarmos classificados.
A estratégia-chave na altitude é não correr. É ditar o ritmo do jogo. Nesse ponto, Casemiro fez muita falta. A presença de um volante típico, já sentida contra o Chile, é um fator importante para que se alcance a intensidade que o técnico tanto busca.
Essa questão do volante fixo, que um dia foi chamado de “cabeça de área”, agora é contestada por causa da almejada intensidade e da pressão na saída de bola.
Mas, enfim, as eliminatórias acabaram. E a Copa de 2026 está logo ali. O trabalho de Ancelotti está em processo e, quem sabe, essa derrota nos ajude a botar os pés no chão ou, como diria Nelson Rodrigues, a calçar as “sandálias da humildade”.
Ancelotti pegou o bonde andando e, talvez, seja de fato a melhor solução, já que, faltando menos de um ano para a Copa, não se tem muito tempo para treinamentos, como acontecia em outras épocas. •
Publicado na edição n° 1379 de CartaCapital, em 17 de setembro de 2025.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Antes da Copa de 2026’
Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.
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