América do Sul está em colapso e o Brasil não é uma ilha isolada

O que acontece na América do Sul repercute significativamente no Brasil, do ponto de vista econômico, político e social

Manifestante corre em meio ao cenário de caos que tomou o Chile durante atos contra o aumento do preço (Foto: Martin Bernetti/AFP)

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É comum encaramos o Brasil como país desvinculado dos demais países da América do Sul. Agimos como se estivéssemos de costas para o continente. Nossas histórias, de fato, apresentam diferenças: falamos português; mantivemos a unidade territorial enquanto a América Espanhola se fragmentava; após a independência adotamos a monarquia, enquanto nossos vizinhos optaram pela solução republicana.

Por outro lado, as semelhanças dos processos históricos são notáveis: o passado colonial; a espoliação dos recursos naturais; a submissão e o genocídio de povos originais e a escravidão deixaram marcas em todo o continente.

Nos tempos da Guerra Fria, a América Latina vivenciou o processo de instauração de ditaduras militares apoiadas por elites civis e inspiradas na Doutrina de Segurança Nacional arquitetada em Washington. Dentro dessa lógica, era importante evitar que novas revoluções cubanas se espalhassem.

No período dos regimes autoritários, articulou-se a Operação Condor, uma espécie de empresa do terror arquitetada entre as ditaduras do Cone Sul sob a chancela norte-americana, especializada em sequestros, assassinato seletivo, elaboração de dossiês, etc.

Na atual conjuntura, observamos com preocupação uma América Latina convulsionada: Colômbia vive grave instabilidade em virtude do enfraquecimento do acordo de paz entre o governo e as Farc; Equador está mergulhado em profunda crise econômica e protestos das comunidades indígenas espoliadas; Peru acompanha crise entre Congresso e presidente Martin Vizcarra; Argentina está afundada em crise econômica e social; o drama de uma crise migratória sem precedentes abala a Venezuela, e o colapso social e econômico chileno se manifesta na onda de protestos e na brutal repressão por parte do governo, etc.

No Brasil, sem qualquer pudor, Bolsonaro flerta com o autoritarismo; as chicanas jurídicas da Lava a Jato vêm à tona; as reformas econômicas anunciam o desmonte de uma rede de proteção social que o país começou a estruturar nas últimas décadas; a irresponsabilidade com o meio ambiente choca o mundo, atônito diante de uma Amazônia em chamas e da destruição de praias da costa do Nordeste, em consequência do derramamento de óleo, que o governo não explica e insiste em politizar, para se isentar da sua irresponsabilidade.


Nessas circunstâncias, precisamos articular frentes em defesa da democracia não só no Brasil, mas em toda a América do Sul. Lutar pela democracia é defender as instituições. É ainda articular ações contra a brutal desigualdade social e a concentração de renda e propriedade; defender a pluralidade das manifestações artísticas e a livre circulação de ideias; garantir a laicidade do estado contra o fundamentalismo religioso; defender um desenvolvimento sustentável, e o acesso universal à saúde e à educação de qualidade.

É ilusão pensarmos que estamos sós e que somos uma ilha isolada. O que acontece na América do Sul repercute significativamente no Brasil, do ponto de vista econômico, político e social, e vice-versa. Num momento em que o continente parece derreter, urge refletir e agir para combater os autoritarismos, defender a democracia e promover a justiça social. As futuras gerações sul- americanas cobram de cada um de nós esse compromisso que é histórico e inadiável.

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